Esperado como o grande dia das primárias democratas, a Super Terça vai ser o teste para Bernie Sanders consolidar sua liderança rumo à nomeação à Casa Branca sob forte pressão do campo moderado do partido.
Um bom desempenho nesta terça-feira (3), quando 14 estados e um território entram em jogo nas eleições, aumentará as possibilidades de o senador por Vermont se tornar o adversário de Donald Trump.
Mas atrás de sua trincheira candidatos moderados tentam mostrar que ainda têm fôlego para chegar à convenção nacional da sigla, em julho, e disputar voto a voto a indicação com o progressista.
Depois das prévias em Iowa, New Hampshire, Nevada e Carolina do Sul, Sanders se tornou líder no número de delegados e na média das pesquisas nacionais, mas viu o centro se reorganizar de forma significativa neste fim de semana.
O principal desencadeador das mudanças foi a vitória esmagadora de Joe Biden neste sábado (28), na Carolina do Sul. Ancorado no voto dos negros, o ex-vice-presidente de Barack Obama conquistou 48,4% no estado, enquanto Sanders ficou num distante segundo lugar, com 19,9%.
A ótima performance reverteu o pessimismo que envolvia a campanha de Biden após resultados frustrantes nas três primeiras prévias e ainda obrigou dois centristas a desistirem da corrida: Tom Steyer e Pete Buttigieg.
O primeiro não tinha se saído bem em nenhuma prévia até aqui. Buttigieg, por sua vez, largou muito bem em Iowa e New Hampshire —estados majoritariamente brancos—, mas não conseguiu ampliar sua base para além desse eleitorado em regiões mais diversas, como Nevada e Carolina do Sul.
Com o ótimo desempenho de Biden no fim de semana, preferiu guardar capital político e não encarar o desgaste de novas derrotas na Super Terça.
A saída do ex-prefeito de South Bend, no estado de Indiana, pressiona Sanders à medida que afunila o campo dos moderados que querem se viabilizar como uma alternativa ao senador progressista.
Além de Biden, o ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg entra oficialmente nas prévias nesta terça, após investir milhões de dólares em propagandas de TV e nas redes sociais que tentam colocá-lo como a melhor opção a Sanders.
Na média dos levantamentos nacionais, o senador aparece com 28,8%, seguido por Biden, com 16,7%, e por Bloomberg, que tem 15,1%.
A Super Terça vai eleger 1.344 dos 3.979 delegados que vão ao encontro nacional democrata no meio do ano e ganhou contornos ainda mais importantes com a mexida no tabuleiro centrista neste fim de semana.
Com diversidade política e demográfica, o quadro desta terçã é bem parecido com o que se vê no resto dos Estados Unidos, contribuindo para nacionalizar a disputa.
Entre os 327 milhões de americanos, 60% são brancos, 18% são hispânicos e 12% são negros, enquanto entre os 130 milhões que vivem nos 14 estados que votam nesta semana 53% são brancos, 25% são hispânicos e 11% são negros.
Estarão nesta etapa Califórnia e Texas, com 415 e 228 delegados, respectivamente, além de outros 12 estados e o território de Samoa Americana.
Ninguém leva a nomeação imediatamente depois de vencer nesses estados, mas a boa performance garante a continuidade da campanha, enquanto um desempenho ruim pode enterrar uma candidatura.
Biden e Bloomberg devem disputar com Sanders pelos principais estados a partir de agora, após a desistência de Buttigieg. Já a moderada Amy Klobuchar e a progressista Elizabeth Warren devem desidratar diante do crescimento de outros nomes dos seus campos.
Assim como Buttigieg, Klobuchar não conseguiu ampliar suas bases para além do eleitorado branco e analistas apostam que logo ela também deve ficar pelo caminho.
Warren, por sua vez, concorre com Sanders pelo nicho mais à esquerda dos democratas, com propostas que vão da taxação dos mais ricos até saúde e educação grátis para todos. Conforme ele ganha terreno, ela deve perder cada vez mais espaço.
O senador por Vermont lidera os três principais estados da Super Terça, ao lado de Biden. Na Califórnia, mais diversa e progressista, Sanders tem 32%, seguido por Biden, com 15,4%. Warren tem 14,3% e Bloomberg, 12,6%.
Já no tradicionalmente republicano Texas, o senador tem 29,1%, enquanto Biden aparece com 22,6%, e Bloomberg tem 17,3%. Warren fica em quarto lugar, com 12,1%.
Na moderada Carolina do Norte, Biden aparece na ponta, com 24,8%, seguido por Sanders, com 23%. Bloomberg tem 16,4% e Warren, 10,3%.
O crescimento do progressista tem incomodado o establishment do partido, e figurões democratas já se mostraram dispostos a impedir a nomeação em benefício de um candidato mais palatável ao status quo.
O temor é que a agenda de justiça social e igualdade econômica de Sanders afaste os moderados que ajudaram os democratas a recuperar a maioria da Câmara em 2018, implicando em mais uma derrota contra Trump.
A maneira mais fácil de conseguir a nomeação democrata é ter os votos de 1.991 dos 3.979 delegados escolhidos nas prévias. Mas, além deles, há 771 superdelegados —governadores, integrantes do comitê nacional e do Congresso, por exemplo—, que podem entrar em ação caso nenhum candidato atinja o número mínimo de delegados e seja necessário realizar um segundo turno na convenção do partido.
Reportagem do jornal The New York Times publicada na semana passada entrevistou 93 dos superdelegados e encontrou uma oposição fortíssima à indicação de Sanders.
O senador precisaria chegar à convenção de julho com uma vantagem significativa para tentar impedir um movimento contra ele.
A Super Terça ganha assim mais um ingrediente crucial: se Sanders não ficar entre os três mais bem colocados, não conseguirá manter o argumento de que pode unir o partido —e o país— para vencer Trump.
Além de Califórnia e Texas, o senador é favorito em Maine, Massachusetts e Vermont, por exemplo, mas disputa de perto com Biden em estados-pêndulo, considerados essenciais na corrida, como Carolina do Norte e Virgínia. Moderados, eles ora votam em democratas, ora em republicanos na eleição geral e são o quarto e o quinto em número de delegados nas prévias desta terça.
Um dos principais argumentos dos críticos a Sanders é que ele não venceria Trump nessas regiões, mas o senador tem aparecido com vantagem sobre o presidente nos levantamentos, além de ter apelo junto à classe média trabalhadora, que elegeu e reelegeu Obama, mas, em 2016, desapontada com os democratas, preferiu o republicano.
Vencer nesses estados pode ser a primeira sinalização objetiva de Sanders ao establishment democrata de que é possível formar uma ampla base em torno dele e levar o partido de volta à Casa Branca.