Cresce busca por engenheiros de produtos

O avanço das startups e a necessidade crescente de transformação digital nas companhias tradicionais têm impulsionado a procura por engenheiros para atuar, principalmente, com desenvolvimento de software e produtos. Encontrar profissionais qualificados, porém, não tem sido uma tarefa fácil para as companhias. Na prática, a equação não fecha. Segundo especialistas, a demanda está aquecida e os talentos estão sendo disputados. 

“A área de tecnologia foi a que menos sofreu com a crise nos últimos anos. Isso porque existem empresas investindo bastante em ferramentas tecnológicas ou que dependem delas”, analisa Caio Arnaes, diretor de recrutamento da Robert Half. Segundo ele, a velocidade de formação de novos profissionais está aquém da demanda nas organizações. “É por isso, inclusive, que tem crescimento no nível salarial desses profissionais”, diz. 

O cargo de engenheiro de software tinha salários entre R$ 8 mil e R$ 18 mil no ano passado, de acordo com o Guia Salarial da Robert Half. Para este ano, a remuneração varia de R$ 10.050 a R$ 20.450, conforme o nível de qualificação e experiência do candidato, setor de atuação ou disponibilidade da posição no mercado. Em meio ao crescimento acelerado do negócio, o Nubank reforçou no início de 2020 o time de engenharia, com a aquisição da consultoria Plataformatec, especializada em engenharia de software e metodologias ágeis. A equipe de 50 pessoas da consultoria passou a fazer parte da equipe de desenvolvimento da fintech. 

O ‘fit cultural’ dos profissionais é um dos principais motivos para a startup ter adotado essa estratégia na ampliação do time, explica Filipe Sabella, líder de engenharia de cartão de crédito do Nubank. “Além disso, os profissionais têm na essência a capacidade de resolver problemas complexos com agilidade.” No ano passado, o Nubank contratou 300 engenheiros – atualmente, a equipe de engenheiros tem mais de 500 funcionários. O time representa cerca de 20% do total de profissionais da fintech, que hoje emprega mais de 2,5 mil pessoas. A expectativa é seguir o ritmo de contratação neste ano. 

A Movile, dona do iFood, tem mais de 500 vagas abertas em 12 cidades brasileiras, sendo 40% delas para a área de tecnologia, como engenheiros de software, analistas de dados e desenvolvedores “back-end”. Com expectativa de fechar as contratações nos próximos seis meses, a empresa busca profissionais que dominem as linguagens de programação, tenham espírito empreendedor e sejam curiosos. 

 “Temos barras técnicas muito altas, com um tempo médio de 35 dias para o fechamento de posições de tecnologia”, explica Luciana Carvalho, VP de gente e gestão do grupo Movile. Para ajudar na seleção de talentos, a Movile montou três hubs de tecnologia em 2019, nas cidades de São Carlos (SP), Recife e Porto Alegre. 

 “Fizemos vários estudos para entender onde tinha comunidade de tecnologia fortalecida, disponibilidade de profissionais e boas universidades”, diz. 

Outro caminho adotado é treinar pessoas internamente. Desde 2018, a empresa realiza um curso de capacitação de desenvolvedores, que forma cerca de 90 pessoas por ano. Ao terminar o programa, os participantes podem receber uma oferta de trabalho da companhia, que atualmente tem 4 mil funcionários, 40% deles em tecnologia. 

As startups não são as únicas de olho em engenheiros. Existem oportunidades para atuar em bancos, indústrias e montadoras. Na Fiat Chrysler Automobiles (FCA) a criação de novos produtos exige contratação de engenheiros, mas esses profissionais também chegam para trabalhar nas áreas de compras e supply chain, segundo Marcela Sampaio, gerente de RH da companhia, que conta com 20 mil funcionários no Brasil. “No ano passado, contratamos 200 engenheiros para posições em que os requisitos exigem profissionais, por exemplo, de desenvolvimento de produtos”, conta. 

Segundo ela, contratar engenheiro nunca é uma tarefa fácil. Em Recife, onde a montadora mantém um centro de desenvolvimento de software, um dos caminhos para encontrar talentos foi firmar parcerias com universidades locais. A empresa também faz eventos voltados à comunidade de engenheiros. Com 90 profissionais na equipe, a meta é ampliar para 130 até março deste ano — as oportunidades foram divulgadas em outubro e ainda há vagas abertas. “No ano passado, redesenhamos a estrutura e seis jovens especialistas assumiram posições de liderança”, diz. 

Além de conhecimento técnico, como tecnologias embarcadas e desenvolvimento de software para o setor automotivo, a companhia busca nos candidatos as chamadas “soft skills”, entre elas, comunicação, negociação e trabalho em equipe. Isso porque a tendência é que os engenheiros façam parte cada vez mais de projetos ao lado de outras áreas. “A resiliência e a capacidade de gerir times são fundamentais. Talvez anos atrás fosse incomum pensar que o engenheiro teria essas habilidades.” 

Formado em engenharia mecatrônica, Pedro Okuhara, 34, precisou desenvolver habilidades de comunicação e vendas no início da carreira, ao ingressar no programa de estágio da Siemens, em 2006. No grupo alemão, descobriu a vontade de trabalhar com marketing. Depois de quase oito anos no grupo alemão, passou pelas multinacionais Schneider Electric e Hager Group, onde atuou como chefe de produto e gerente de marketing. Desde 2017, trabalha como especialista de produto e aplicação na Mitsubishi Electric Brasil. 

Para ele, a capacidade de resolução de problemas é um dos trunfos dos engenheiros. “Isso faz com que o profissional seja flexível, multitarefa e tenha vontade de aprender. Quando está envolvido com tecnologia, precisa se manter constantemente atualizado e tentar entender o que pode vir no futuro”, afirma. Curiosidade, comunicação e trabalho em equipe são outros itens essenciais, segundo Semiramis Miziara, gerente de RH da Mitsubishi Electric. “Nosso desafio é encontrar um engenheiro que seja técnico, mas também comercial e mais comunicativo”. 

Na Semantix, especializada em big data e inteligência artificial, estão abertas cerca de 60 vagas para as áreas de engenharia e ciência de dados. “Hoje, uma das nossas maiores dificuldades é encontrar profissionais que de fato estejam capacitados tecnicamente às novas tecnologias e estejam acompanhando as novas tendências”, afirma Leonardo Santos, CEO da Semantix. 

Segundo ele, o perfil questionador é um atributo importante, principalmente para os maiores projetos da empresa. A companhia oferece treinamentos, cursos, workshops e certificações para ajudar na formação dos funcionários. Atualmente com 300 profissionais – cerca de 60% são engenheiros -, a Semantix prevê chegar a 400 neste ano. 

Com o investimento maior das empresas em automação, a figura do engenheiro de robôs também aparece como uma oportunidade, diz Semiramis, da Mitsubishi Electric. “É uma posição nova. Abrimos uma vaga na área, mas tivemos dificuldade para preenchê-la”. Segundo ela, a indústria 4.0 traz desafios tanto para as organizações quanto para os engenheiros. Ao mesmo tempo em que as máquinas e a conectividade avançam, serão cada vez mais exigidas competências humanas dos candidatos. 

https://valor.globo.com/carreira/noticia/2020/03/02/cresce-busca-por-engenheiros-de-produtos.ghtml

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