O progresso tecnológico supostamente não deveria entrar em marcha a ré. No entanto, é isso o que parece estar ocorrendo no mundo das baterias para carros elétricos, depois da forte alta de algumas matérias-primas.
A Tesla, que tem guiado o caminho no desenvolvimento de veículos elétricos, está trocando o tipo de células usadas em todos os carros de sua linha básica no mundo por uma tecnologia que, segundo analistas chegaram a prever, em breve se tornaria obsoleta.
A empresa controlada por Elon Musk passará a usar baterias à base de ferro nesses carros, também chamadas de baterias de fosfato de ferro de lítio.
A tecnologia é bastante usada em veículos menos complexos, como carrinhos de golfe, ou em sistemas de reserva de energia residencial. Para os carros elétricos, contudo, há muito ela é considerada opçãomenos eficiente. No mundo, cerca de 10% de todas as células de baterias de carros elétricos produzidas hoje são à base de ferro.
A maior debilidade é o alcance menor. O material usado nas baterias à base de ferro tem uma menor densidade energética e oferece menos alcance por peso transportado a cada carga de abastecimento em comparação às baterias de íon de lítio à base de níquel, hoje mais usadas. Por esse motivo, quase todas as montadoras fora da China optaram por esse tipo.
A maior debilidade é o alcance menor. O material usado nas baterias à base de ferro tem uma menor densidade energética e oferece menos alcance por peso transportado a cada carga de abastecimento em comparação às baterias de íon de lítio à base de níquel, hoje mais usadas. Por esse motivo, quase todas as montadoras fora da China optaram por esse tipo, cujas principais matérias-primas são o níquel, o cobalto e o manganês.
Uma substituição pelas baterias à base de ferro, contudo, teria grande e crucial vantagem: o preço. As baterias são a parte mais cara do carro elétrico. As baterias antigas, à base de ferro, são bem mais baratas – cerca de 30% por célula de bateria do que as equivalentes à base de níquel, em grande medida em razão do preço mais baixo das matérias-primas usadas.
Em vista da forte alta nas cotações das commodities e do aperto nas margens de lucro, as fabricantes de baterias também vêm aumentando o preço que cobram pelas baterias de íon de lítio. Por exemplo, noticiou-se que a LG Energy Solution, fornecedora da Tesla, da Porsche e da BMW, elevou os preços em 10% neste ano, depois de a cotação do níquel ter quadruplicado em 2021.
Também há possíveis economias de custo com eventuais programas de substituição de peças defeituosas. As baterias à base de ferro são mais estáveis na temperatura e trazem menos riscos de pegar fogo. Um recall de 140 mil Chevrolet Bolts produzidos pela GM, em função de baterias que podiam incendiar-se, teve custo de US$ 2 bilhões – e a LG Energy Solution estima que sua parte no custo será de US$ 1,2 bilhão. Quando se divide a conta por carro vendido, os custos do recall poderiam começar a tirar as vantagens das baterias sobre a tecnologia mais antiga.
Apesar desses custos, as montadoras mundiais, em grande medida, optaram por ater-se às baterias de íon de lítio à base de níquel produzidas por fabricantes sul- coreanas e japonesas, que dominam 88% do mercado de baterias para carros elétricos, excluindo a China. Quase todas as baterias de alto padrão do mundo são feitas por três fabricantes: a japonesa Panasonic e as sul-coreanas LG Energy Solution e Samsung SDI.
A reorientação da Tesla poderia marcar um ponto de inflexão. Poderia convencer as montadoras rivais, cautelosas em usar baterias à base de ferro, de que se trata de uma opção viável e confiável.
A Volkswagen tem planos de usá-las em alguns modelos. Se mais montadoras passarem a usar a bateria, algum dia elas poderiam se tornar o novo padrão global para a linha básica de carros elétricos, especialmente se a infraestrutura de abastecimento se desenvolver a ponto de o alcance deixar de ser um fator tão preocupante.
O momento é oportuno. As principais restrições de patentes que impedem as chinesas de exportar baterias à base de ferro ao exterior expiram neste ano. As comissões pelo licenciamento do uso de tecnologias-chave para baterias à base de ferro por produtores fora da China terminarão.
No entanto, uma reorientação rumo às baterias à base de ferro significaria transferência de poder para a China. Mais de 95% das células de bateria à base de ferro são fabricadas no país. Das quatro fabricantes de baterias asiáticas que produzem a maioria das baterias de carros elétricos do mundo, apenas as duas chinesas (BYD e CATL) fabricam esses tipos de células de bateria e, até agora, só para o mercado doméstico. A China controla mais de 80% do refino e mineração mundial de matérias-primas para baterias de carros elétricos.
A atual falta mundial de chips tem colocado em evidência as consequências de depender demais de poucos países e empresas para receber componentes cruciais. Para evitar um destino semelhante, as montadoras não devem subestimar o verdadeiro custo caso optem por uma mudança hoje.