Se você nunca ouviu falar em liquidez de sinal, é melhor prestar atenção ao termo. Principalmente se trabalha no varejo. O conceito é relativamente novo e expressa a capacidade de coletar e compreender os sinais que o consumidor emite espontaneamente sobre suas preferências e hábitos de compra, explica Letícia Abraham, vice-presidente executiva do grupo britânico Ascential na América Latina. Cada vez mais relevantes na hora de ajustar produtos e estratégias comerciais, essas informações podem vir de qualquer lugar, como uma rede social, um serviço de streaming ou um “reality show”.
Há pouco mais de um ano, a Ascential, que fornece informações e análises para marcas com foco no comércio eletrônico, adquiriu a brasileira Intellibrand, cujos softwares ajudam a melhorar o desempenho das vendas on-line e medir resultados. A aquisição permitiu à companhia, que é dona do Festival de Criatividade de Cannes, acompanhar mais de perto as peculiaridades do e-commerce brasileiro e detectar tendências que se aceleraram na pandemia. “O consumo pela internet é um caminho sem volta. Avançamos dez anos em dois”, afirma Abraham.
O conceito de liquidez de sinal, ou “signal liquidity”, foi criado pelo americano Scott Galloway, professor de marketing na Universidade de Nova York. Ao comparar a Netflix com o TikTok, ele disse que o serviço de streaming recolhe três sinais em uma hora: o que o usuário quer ver, quanto tempo viu o programa, e se assistiu ou não a mais de um capítulo. Enquanto isso, o algoritmo do TikTok obtém centenas de sinais no intervalo médio de 30 segundos porque o conteúdo é mais curto e a interação com o usuário, mais fácil. A liquidez de sinal é maior. E quanto mais liquidez, maiores as chances de uma marca prever o comportamento do cliente e ajustar a oferta.
No Brasil, um dos segmentos mais promissores nessa caça aos sinais é o dos apps de entrega de refeições como iFood e Rappi, diz Abraham. A Ascential planeja começar a exportar o IntelliFoods, produto da Intellibrand que permite a clientes como fabricantes de bebidas ou alimentos monitorar seu desempenho nesses agregadores. Os apps de comida estão se tornando grandes marketplaces à medida que incorporam mais produtos, como remédios, compras de supermercado e itens para “pets”, afirma a executiva.
Em 2020, o Brasil concentrou quase metade (48,77%) dos pedidos de delivery na América Latina, segundo o site Statista. Apesar disso, os apps de entrega continuam um canal pouco explorado pela indústria, diz Francesco Weiss, cofundador e diretor comercial da Intellibrand. Mesmo os varejistas demoraram para se lançar ao comércio eletrônico no país, afirma o executivo, o que levou à uma corrida para se atualizar na pandemia, quando os meios eletrônicos viraram questão de sobrevivência.
A Intellibrand foi criada em 2013 por Weiss e seu sócio Chau Sanh, que é vice- presidente de tecnologia. Os sistemas da empresa conferem imagens, títulos e descritivos dos produtos. Se o consumidor está em busca de um pacote de fraldas, por exemplo, os softwares o encaminham para a loja mais próxima e com estoque suficiente. Dados de diversos canais on-line são compilados e agregados em um lugar só para a marca. No caso do IntelliFoods, diz Weiss, é possível ver a posição em que um produto aparece nas buscas, se está disponível, qual a avaliação média dos clientes e o posicionamento de preço frente aos concorrentes, entre outras informações.
O negócio entre a Ascential e a Intellibrand foi fechado em dezembro de 2020. “Para nós, o principal fator foi a capacidade da plataforma [da Ascential] de alavancar os negócios”, diz Weiss. Em um ano, desde a aquisição, a receita da Intellibrand cresceu mais de 100%, segundo a Ascential. Os valores não são divulgados.
O grupo britânico tem quase 20 marcas diferentes no mundo. A lista inclui Edge, Flywheel e Perpetua na área de comércio eletrônico; WGSN, de previsão de tendências; e Warc, de planejamento de mídia. O Festival Cannes Lions, outra propriedade, não foi realizado no ano passado por causa da covid e a companhia estuda a possibilidade de retomá-lo neste ano.
A Intellibrand continuará a atuar de maneira independente, com marca própria, mas o plano da Ascential é aproximar equipes e produtos das empresas do grupo que atuam no mesmo segmento. “Os clientes são globais e querem ter tudo num lugar só”, justifica Abraham
