The Economist: Dois terços Merkel, um terço Thatcher

Serão os franceses capazes de eleger pela primeira vez na história uma presidente quando forem às urnas em abril? Ségolène Royal quase chegou lá quando se candidatou pelo Partido Socialista, em 2007, mas foi derrotada por Nicolas Sarkozy. Dez anos depois, Marine Le Pen, uma populista-nacionalista, foi esmagada pelo centrista Emmanuel Macron.

Agora é a vez do partido gaulista tentar. Em 4 de dezembro, o Republicanos escolheu Valérie Pécresse, líder da região de Ile-de-France, no entorno de Paris, como sua candidata à presidência. No segundo turno das primárias do partido, ela derrotou Eric Ciotti, um deputado de Nice da direita linha-dura, anti-imigração, garantindo 61% dos votos, contra 39% do adversário. 

Dias depois, o instituto de pesquisas Elabe registrou um salto de Pécresse do quarto para o segundo lugar na disputa presidencial francesa, sugerindo que ela poderia derrotar Macron no segundo turno. Saltos nas pesquisas eleitorais posteriores a indicações dos partidos são comuns, e outros institutos registraram um crescimento menor. No entanto, a ex-ministra do Orçamento, graduada na École Nationale d’Administration, de elite, subitamente parece uma competidora viável.

Antes da campanha para as primárias, Pécresse era vista como uma outsider por alguns setores. Pesquisas sugeriam que, se ela fosse indicada pelo Republicanos, teria desempenho pior na eleição presidencial do que Xavier Bertrand, rival dela nas primárias e líder da região de Hauts-de-France. Como ele, ela havia deixado o partido, no caso dela em razão de uma exasperação em relação à impotência da legenda. 

Mas Pécresse apresentou bom desempenho nos debates televisionados das primárias, passando impressão de seriedade, preparo e vigor. E foi cuidadosa em lembrar os espectadores de que também é boa de voto. Este ano, ela foi reeleita presidente da região de Ile-de-France, esmagando a extrema direita, os verdes e o centro. 

Política

Finalmente, nas primárias, os membros de seu partido preferiram ela a Bertrand e Michel Barnier, o ex-negociador da União Europeia no Brexit, ambos eliminados em uma votação apertada de primeiro turno. Na política há muitos anos, Pécresse é uma figura conhecida na França. Eleita deputada pela primeira vez 19 anos atrás, ela era protegida de Jacques Chirac, um ex-presidente gaulista, e foi ministra do governo Sarkozy. Pécresse descreve a si mesma como “dois terços Merkel, um terço Thatcher” – uma mistura entre a busca de consenso e o reformismo.

Como ministra do Ensino Superior, Pécresse enfrentou os sindicatos e deu mais autonomia às universidades. Como candidata das primárias de seu partido, ela fustigou Macron por não cortar empregos públicos e “queimar dinheiro” com gastos do governo.

É um erro, porém, qualificar Pécresse acriticamente como uma centrista em seu partido. Formada em escola católica particular, ela é conservadora tanto culturalmente quanto fiscalmente. Em 2013, Pécresse votou contra a legalização do casamento gay (apesar de posteriormente tê-lo aceitado) e adota posições duras contra imigração, incluindo o fim do direito automático à cidadania para descendentes de imigrantes nascidos na França. 

Disputa

Pécresse pode ter triunfado nas primárias, mas agora ela terá de unir um partido dividido. Eric Zemmour, um polemista reacionário, também se declarou candidato. Isso arrastou o debate para um nível tóxico. Em 2017, Ciotti recusou-se a votar em Macron para afastar Le Pen. Agora, ele preferiria Zemmour a Macron, se eles forem as opções em 2022. Ciotti já reclamou, após a indicação de Pécresse, que ela não representa apropriadamente suas visões, antes de a dupla anunciar apressadamente uma trégua diante das câmeras, em um restaurante de Nice.

Se conseguir seguir nessa linha habilmente, Pécresse se transformará em uma competidora complicada para Macron, que segue aparecendo como favorito na maioria das pesquisas para as eleições de 2022. 

Na centro-direita, ela poderia conquistar alguns apoiadores de Macron alarmados com os altos índices da dívida pública. Na extrema direita, ela poderia atrair ex-eleitores de François Fillon, que têm sido tentados por Zemmour. A candidatura do polemista dividirá os eleitores da extrema direita e reduzirá o número de votos necessários para se qualificar para o segundo turno. 

Com a esquerda enfraquecida, isso significará um segundo turno entre Macron e algum candidato de centro-direita, o que parecia improvável meses atrás, enquanto os membros do Republicanos se engalfinhavam. No entanto, hoje é totalmente plausível. Até agora, somente uma pesquisa sugeriu que Pécresse poderia derrotar Macron nesse cenário. O que não é um mau início.

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