The Economist: A acirrada disputa pela maioria do Senado

A escolha mais importante que o eleitor americano fará diz respeito à reeleição de Donald Trump para a presidência. A segunda decisão mais importante diz respeito ao controle do Senado, necessário para a aprovação de leis federais e para a confirmação de indicados para tribunais federais e cargos do alto escalão.

Se Trump for reeleito, é quase certo que os republicanos conservarão o controle do Senado. Mas, se ele perder, um Senado controlado pelos republicanos serviria como um forte contrapeso para um governo de Joe Biden. Se o histórico do líder da maioria republicana no Senado, Mitch McConnell, serve de guia, uma câmara superior hostil poderia frear boa parte da pauta legislativa de Biden e impedi-lo de preencher a maioria das vagas no Judiciário – mesmo se ele vencer a eleição com uma vantagem expressiva. Da mesma forma, até uma maioria mínima dos democratas no Senado abriria para ele novas possibilidades.

Na prática, os democratas seriam limitados pela necessidade de manter sua bancada coesa. Se eles reconquistarem o Senado, a maioria de seus novos membros será de centristas; o candidato deles no Kansas era republicano até 2018. As mais recentes eleições intercalares, quando os democratas tiveram bons resultados, trouxeram uma injeção de moderados representando localidades relativamente conservadoras. Ainda assim, seria significativa a diferença na trajetória política americana entre uma situação em que os democratas ficam com 49 assentos no Senado e as situações em que conseguem 50 cadeiras – em caso de empate, é o vice-presidente quem vota.

Talvez a disputa pelo Senado receba menos atenção do que merece, e um dos motivos disso pode ser a dificuldade em analisá-la. Não há pesquisas de intenção de voto para o Senado de alcance nacional. Em vez disso, há 35 disputas separadas, em diferentes Estados (os outros 65 assentos não participam da eleição deste ano). Em algumas disputas as pesquisas de intenção de voto são frequentes, em outras são raras. Até as regras podem variar: Louisiana e Geórgia usam um sistema de dois turnos; recentemente, o Maine adotou votação por classificação (primeira opção, segunda, etc).

Para superar essas complexidades, construímos um modelo estatístico para calcular a probabilidade de cada partido de controlar o Senado (bem como a Câmara dos Deputados, que os democratas já controlam). No momento, o modelo aponta 67% de probabilidade de os democratas formarem uma maioria no Senado neste ano. É uma probabilidade inferior aos 86% de chance de ganhar a presidência atribuídas a Biden por nosso modelo, mas superior às chances que o senso comum atribuía aos democratas em 2019 para a briga pelo Senado. 

O limite da suposição

Como todas as previsões , o limite da qualidade do nosso modelo são as suposições nas quais ele se baseia. Acima de tudo, o modelo se ancora na premissa segundo a qual a fórmula estatística que mais acertou na previsão dos resultados das eleições legislativas seguirá mais ou menos inalterada. Como nenhuma das eleições em que esse modelo foi usado ocorreu durante uma pandemia, essa premissa pode se revelar inesperadamente frágil em 2020. O modelo não sabe, por exemplo, que há grande chance de uma explosão de votos pelo correio. Ninguém sabe qual lado será beneficiado por essas mudanças, mas elas injetam na disputa uma dose de incerteza impossível de quantificar.

Feita essa ressalva, os dados detalhados a respeito das disputas para o Congresso – foram realizadas quase 18 mil eleições desde 1945 – permitem que os estatísticos cheguem a conclusões relativamente sólidas quanto ao comportamento do eleitor. Nosso modelo usa ampla gama de indicadores, incluindo pesquisas de intenção de voto de alcance nacional, estadual e distrital; o histórico eleitoral de cada Estado e distrito; a experiência dos candidatos em cargos eletivos, seu posicionamento ideológico, mandatos, captação de recursos e envolvimento em escândalos; o índice de aprovação do presidente; os resultados de eleições s realizadas para preencher vagas no Legislativo em todo o país. Aplicada às eleições anteriores, a previsão errou a composição do Senado por questão de dois assentos e, na Câmara dos Deputados, de 435, o erro foi por diferença de oito assentos.

A expectativa média do modelo prevê um ganho de oito assentos para os democratas na Câmara. Pelo menos dois são garantidos, graças a uma redistribuição distrital determinada pelos tribunais na Carolina do Norte. Outros devem ser vitórias entre uma lista de mais de uma dezena de distritos vulneráveis.

Para os republicanos, os alvos são muito menos promissores. Em geral, o ambiente deste ano parece favorecer os democratas quase tanto quanto as eleições intercalares de 2018. De acordo com o modelo, a ex-vice-governadora de Minnesota e presidente do Senado estadual, Michelle Fischbach, é forte favorita para vencer um democrata eleito no sétimo distrito deste Estado, na zona rural, que elegeu Donald Trump por uma margem de 31 pontos em 2016. Mas, no geral, as previsões indicam que a chance de os republicanos recuperarem a maioria no Congresso é de apenas 1% a 2%.

O Senado, em comparação, apresenta equilíbrio mais delicado. Com 47 assentos, os democratas precisam de mais três para formar a maioria se Biden vencer, ou mais quatro se ele perder. Como o democrata eleito Doug Jones, do Alabama, Estado de tradição republicana, provavelmente perderá seu assento – foi eleito em 2017 disputando contra um adversário acusado de assédio sexual contra adolescentes –, o partido deve precisar de quatro novos assentos além da vitória de Biden.

Candidatos democratas são os francos favoritos em duas disputas. No Arizona, Martha McSally, que perdeu por pouco uma eleição para o Senado em 2018, acabou sendo nomeada para ocupar um assento vago. O adversário dela é Mark Kelly, ex-astronauta casado com Gabby Giffords, que atuou como deputada até ser baleada na cabeça por um lunático em 2011 (e sobreviver, milagrosamente). Kelly arrecadou impressionantes US$ 45 milhões, e tem vantagem de oito pontos porcentuais nas intenções de voto. Nosso modelo indica que ele tem 90% de chance de vencer.

Outra vitória relativamente fácil para os democratas está no Colorado, Estado cuja população tende cada vez mais a favorecê-los. Seu candidato, John Hickenlooper, é um ex-governador centrista. As pesquisas foram mais raras, e a campanha de Hickenlooper surpreendeu pelos altos e baixos. Mas ele parece conservar vantagem de sete pontos em relação ao senador eleito Cory Gardner. Nosso modelo atribui a Hickenlooper 80% de chances de vitória.

As outras corridas pelo Senado são menos fáceis para os democratas. Além desses dois assentos, a melhor chance deles parece estar na Carolina do Norte. Biden mantém no Estado uma pequena vantagem, mas, no Senado, as coisas são diferentes: Cal Cunningham tem resultado bem melhor que Biden e mantém diferença de seis pontos em relação a Thom Tillis, um senador republicano pouco querido.

Levando em consideração o quanto as disputas pela presidência e pelo Senado se tornaram interligadas – em 2016, pela primeira vez desde a instituição do voto popular para o Senado, um século atrás, todos os Estados onde foi disputada uma vaga no Senado elegeram o mesmo partido para ambos os ramos do governo – seria surpreendente se o resultado de Tillis for tão pior que o de Trump. Mas se trata de um padrão que apareceu em várias pesquisas de intenção de voto.

O último Estado em que o modelo aponta favoritismo para um candidato democrata é o Maine. A senadora eleita Susan Collins é a republicana mais moderada do Senado e, em 2014, o eleitorado a reconduziu ao cargo com vantagem de 37 pontos. Mas o voto dela confirmando a nomeação do juiz conservador Brett Kavanaugh para a Suprema Corte parece ter alertado o eleitorado do Maine, onde os democratas gozam de pequena vantagem, para o fato de que uma republicana centrista não deixa de ser republicana.

https://internacional.estadao.com.br/noticias/geral,the-economist-a-acirrada-disputa-pela-maioria-do-senado,70003498203

Comentários estão desabilitados para essa publicação