Por Mario Rene
“Low profile, calado, sóbrio e frugal, são alguns dos adjetivos usados por seus mais fiéis colaboradores. Seus inimigos, no entanto, preferem defini-lo como calculista, frio, traiçoeiro e autoritário. Mas, para a maioria dos argentinos, o cardeal Jorge Mario Bergoglio é simplesmente um mistério”.
Assim começa um artigo intitulado “O Jesuíta leitor de Dostoievski”, publicado no Jornal “O Estado de São Paulo”, 14 de Março da semana recém-finda.
O Papa então é um mistério…
Eu diria, sem medo de errar, ele e 96% dos seres humanos.
Porque os demais 4% são claramente ou santos, ou demônios.
Primeiro, os Santos. São aqueles indivíduos tão bons que quase enxergamos uma aura em torno deles. Madre Tereza, Gandhi, os dois São Francisco, e alguns iluminados anônimos.
Agora, os genuinamente maus: os psicopatas. Estes, infelizmente, não podem ser reconhecidos pela aparência. Pena que não exalem enxofre… Apenas são identificados ao assassinar em série, esquartejar, estuprar, atirar a esmo em alunos, sendo frios e calculistas.
Mas… o que dizer de um casal ‘aparentemente’ normal, que arremessa a filha pela janela do apartamento? Psicopata ou… parte daqueles 96% de seres humanos que são um mistério, capazes de surpreendentes atitudes tresloucadas?
Como a do ex-diretor de Redação do Estadão que assassinou friamente a ex-namorada?
Ou a “meiga” Suzane Von Richtofen, que não destoava dos colegas da PUC, até que… simplesmente encomendou o assassinato dos próprios pais.
Até aportamos ao caso do Alex – estudante de Psicologia – que atropelou aquele ciclista, decepando seu braço, que após o acidente foi por ele encontrado no banco do seu carro. O que ele fez? Arremessou-o no córrego do Ipiranga.
Horrível, lamentável e repugnante a sua atitude. Todos nós somos unânimes em execrá-lo. Para o juiz Kleber Leyser de Aquino, do Dipo, Alex deve permanecer preso porque demonstrou uma “personalidade fria, cruel e insensível ao jogar no rio o braço decepado”.
Lembram-se do início deste Blog, acerca do contraponto sobre o Papa Francisco?!… Pois é…
O Alex provavelmente não é um psicopata; provavelmente pertence àquela massa de 96% que são…
… um mistério.
Que às vezes até podem ser frios e insensíveis…
Que formam o contingente ao qual você e eu pertencemos. A verdade é que convivemos diariamente com tais pessoas absolutamente “normais”.
O paradoxal é que se eles tivessem sido entrevistados antes de cometerem seus delitos, todos, em uníssono, se declarariam incapazes de cometê-los: arremessar filhas, assassinar ex-namoradas, encomendar a morte de pais, jogar braços recém-decepados em córregos por aí…
Assim como você e eu, sendo entrevistados, certamente afirmaríamos que nunca cometeríamos os desatinos do Alex.
Mas será mesmo? E aí pergunto: temos todos nós a certeza de que não o faríamos? De que, em uma situação de extremo estresse, não romperíamos os limites?
A única resposta sensata que vejo perante tudo isso é que ao invés de execrar tais condutas (abomináveis, é óbvio), a gente precisa se colocar no lugar daqueles indivíduos, e simular, quase que teatralmente, os cenários em que se encontravam. Se questionar repetidas vezes o que a gente faria em uma madrugada de domingo, após cometer a insanidade de alcoolizado atropelar um ciclista e não prestar socorro, e ainda totalmente em choque se deparar com um braço decepado no próprio carro.
Quer dizer, ao invés de apenas ficarmos pasmos, nós, que não somos psicopatas, precisamos criar antídotos e mais antídotos : o que você faria em tais circunstâncias? Como reagiria estressado? A quem recorreria? O que está ao seu alcance fazer para jamais chegar a situações-limite?
E quanto mais simularmos, mais poderemos criar antídotos para gestos insanos de pessoas até então tão normais…