Kofi Annan, ex-secretário-geral da ONU, se opôs à invasão do Iraque

O ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan, morreu neste sábado, 18, aos 80 anos. A fundação que leva seu nome anunciou sua morte, por meio de um comunicado, apenas indicando que ele teria sofrido uma doença súbita. Nascido em Gana em 1938, o africano, à frente da organização internacional por dez anos, recebeu o Prêmio Nobel da Paz, em 2001.

Annan, que comandou a organização entre 1997 e 2006, foi internado às pressas num hospital de Berna, Suíça. António Guterres, atual secretário-geral da ONU, emitiu um comunicado expressando sua “profunda tristeza”. “De muitas formas, Annan era a ONU. Ele subiu dentro da organização para liderá-la ao novo milênio, com dignidade e determinação”, escreveu.  

O lema de Annan era manter o diálogo com todos para buscar a paz, até mesmo com ditadores. Mas sua passagem pela ONU não deixou de ser alvo de críticas. Nos anos 90, era ele o chefe do Departamento de Operações de Paz, quando o genocídio de Ruandaocorreu. A ONU – e seu departamento – foram acusados de não terem conseguido evitar a onda de violência que deixou 800 mil mortos. 

Ainda assim, ele foi escolhido para comandar a entidade, em 1997. Enquanto o mundo ainda se recuperava dos atentados de setembro de 2001, os organizadores do Prêmio Nobel decidiram dar ao africano e à ONU a distinção, na esperança de enviar um sinal aos líderes internacionais sobre a importância da luta pela paz. 

Annan teve seu mandato marcado pela decisão de denunciar como “ilegal” a guerra de George W. Bush no Iraque. A partir de então, passou a ser alvo de ataques por parte da diplomacia americana.
O roteiro do drama vivido pelo ganês no comando da diplomacia da ONU levou-o à depressão e ao sumiço de sua voz. Abalado pela decisão dos EUA de invadir o Iraque, seguida pela morte, em Bagdá, do enviado especial e amigo pessoal Sérgio Vieira de Mello, e depois por denúncias de corrupção, Annan deu sinais de que abandonaria o cargo.

As revelações são de Fred Eckhart, que por oito anos foi o porta-voz de Annan na ONU e publicou o livro de memórias Kofi Annan sobre o primeiro negro a liderar o órgão. Em entrevista ao Estado, Eckhart revelou como o secretário-geral entrou em rota de colisão com o governo americano em razão do Iraque. Annan tinha recebido aval da Casa Branca para comandar a organização em substituição ao egípcio Boutros-Boutros Ghali, cujo mandato à frente da ONU foi considerado “desastroso” por Washington.

Annan, porém, também acabou sendo alvo de ataques. “Quem enfrenta os EUA sabe que sofrerá retaliações e foi isso o que ocorreu”, contou Eckhart. “Annan viu a Carta da ONU ser rasgada na sua cara”, disse em relação à decisão dos americanos de ignorar o Conselho de Segurança, adotar a estratégia de ataques preventivos e rever toda a questão da tortura.

Sua crise pessoal agravou-se com o atentado contra a sede da ONU em Bagdá em que Vieira de Mello e outras 22 pessoas morreram. No livro, Eckhart revela que o envio do amigo a Bagdá foi a pedido dos EUA. Para Annan, o dia do atentado – 19 de agosto de 2003 – foi o pior de seu mandato. Quando Annan finalmente alertou que a guerra do Iraque era ilegal, em uma entrevista à BBC, Eckhart disse ter advertido o secretário-geral de que teria problemas. O que se seguiu foi uma série de acusações de corrupção contra Annan, a maioria vinda de aliados do governo Bush.

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