G20 tenta conter restrições a alimentos

Os ministros de comércio das maiores economias do mundo, que formam o G20, farão hoje uma reunião virtual de urgência. Vão tentar compromisso para frear restrições crescentes nas cadeias globais de suprimento de alimentos e produtos de saúde, conforme o Valor apurou.

Em meio ao pânico causado pela propagação do coronavirus, desta vez participarão a Organização Mundial do Comércio (OMC), como é normal, mas também a Organização Mundial da Saúde (OMS), que está na frente do combate à pandemia. 

Em reunião na semana passada, os líderes do G20, como o chinês Xi Jinping e o americano Donald Trump, concordaram que trabalhariam para “solucionar interrupções nas cadeias globais de suprimentos” e assim garantir o fluxo entre fronteiras de materiais médicos vitais, produtos agrícolas essenciais e outros bens e serviços. 

Na prática, dobrou o número de países que desde o começo do mês já proibiram ou limitaram exportação de materiais de saúde como máscaras, respiradores, ventiladores e luvas. Eles são agora 60 nessa situação. Ou seja, nações importadoras 

que precisam desesperadamente de equipamentos médicos de proteção para prevenir mais infecções e um colapso dos sistemas de saúde, têm agora 60 fontes a menos de suprimento e, quando conseguem comprar, é a preço mais elevado. 

Apesar do discurso de solidariedade por toda parte, cada um tenta assegurar seu próprio abastecimento. A União Europeia teve que reagir, em meio a proibições de exportações dentro do próprio mercado comum, por exemplo da Alemanha para a Itália em certo momento. 

A Índia barrou a exportação de drogas que estão sendo testadas para o tratamento de coronavirus, como o hidroxicloroquina. A Hungria fez o mesmo. 

Para certos negociadores, uma tentativa no G20 de coordenação internacional para retirada das restrições às exportações de bens relacionados ao combate à covid-19 tem pouca chance de prosperar. 

O certo, para a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), é que restrições no comércio ameaçam não apenas a oferta na área médica, como podem provocar rupturas nas cadeias de abastecimento de alimentos. 

Basta ver que a Rússia interdita por um período a exportação de grãos em meio a uma corrida pela compra de seu trigo. O Cazaquistão interditou a exportação de trigo, centeio, açúcar, batata, cenoura, nabo, beterraba, cebola, repolho, sementes de girassol e óleo. 

O Vietnã, terceiro maior exportador de arroz, depois de Índia e Tailândia, suspendeu a exportação da commodity. Filipinas, terceiro maior importador, não esconde a inquietação nesse cenário. A Tailândia chegou a proibir agora a exportação de ovo de galinha. Paquistão interdita a venda de cebola para o exterior. 

“Temos que ter muito cuidado com as cadeias de suprimento de alimentos e produtos para a saude”, diz uma fonte. “É preciso tentar ao máximo deixar o mercado aberto”’. A preocupação é também com outros segmentos. Por exemplo, se houver problemas no abastecimento de plástico, com o confinamento em vários países, complicará ainda mais a distribuição de alimentos e outros produtos. 

Para Abdolreza Abbassian, economista senior da FAO, a agência da ONU para agricultura e alimentação, se países entrarem em pânico para se isolarem vai acontecer mais turbulência nas cadeias de suprimento. Para ele, é preciso ser racional, inclusive para não causar mais problemas na logística e rede de distribuição de alimentos. Do contrário, para a FAO aumentam os riscos de tensões no sistema alimentar mundial a partir de abril ou maio. 

Os países do G20 representam cerca de 80% da produção mundial, 75% do comércio internacional e dois terços da população mundial, segundo cálculos da Arábia Saudita, na presidência rotativa do grupo integrado por África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia, Turquia e União Europeia. A Espanha participa como convidado permanente. 

Na crise financeira global de 2008 e 2009, a comunidade internacional conseguiu limitar o protecionismo, evitando políticas de “beggar-thy-neighbour” (empobrecer o vizinho) ocorridas na Grande Depressão de 1929. 

O diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo, certamente obterá compromisso dos países de manter mercados abertos. A questão é até que ponto isso realmente ocorrerá na prática. Entidades do setor privado tentam influenciar nessa direção. 

A Coalizão Global Empresarial, formada por 17 organizações empresariais, incluindo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), sugeriu ao G20 a formação de um Comitê Global de Suprimento covid-19. O mecanismo serviria como plataforma de informação sobre o status global da cadeia de suprimentos, questões e soluções. 

Enquanto o comércio exterior tende a causar preocupações, o Fundo Monetário Internacional (FMI), aponta “uma ampla gama de problemas se acumulando em mercados emergentes”, como, no caso de exportadores de commodities, choques de preços. O FMI calcula que as necessidades de financiamento dos emergentes chegam a US$ 2,5 trilhões. 

https://valor.globo.com/empresas/noticia/2020/03/30/g20-tenta-conter-restricoes-a-alimentos.ghtml

Comentários estão desabilitados para essa publicação