Li Zhenguo tenta, de todas as maneiras, voltar ao trabalho após ficar cinco semanas em casa em Zhumiao, vilarejo na província de Henan, na região central da China. Mas não há transporte público entre Zhumiao e Zhumadian, a cidade mais próxima.
Em Zhumadian, Li, de 51 anos, poderia pegar um trem de alta velocidade com destino à província de Guangdong, no sul do país, onde trabalha como montador em uma fábrica de baterias.
Mas, mesmo se conseguisse chegar à estação ferroviária, não teria como pagar pela passagem. O trem de alta velocidade custa mais que o triplo do comum, que não opera desde janeiro. “Não posso ir para lugar algum enquanto o tráfego não voltar ao normal”, disse.
Dezenas de milhões de trabalhadores migrantes chineses, principalmente originários do interior subdesenvolvido, também estão condenados à imobilidade. Desde o fim do recesso do Ano Novo Lunar chinês, eles tentam voltar às fábricas da zona litorânea depois de Pequim restringir o tráfego a fim de conter a propagação do vírus.
O custo das restrições de viagens chama a atenção para os desafios com os quais a China se defronta. Embora Pequim tenha dito que 70% das grandes empresas voltaram a operar, dados das pequenas fábricas são desesperadores.
O Ministério da Indústria e da Tecnologia da Informação disse que menos de um terço das empresas de pequeno e médio portes, que empregam 80% da população em idade ativa da China, estão operando normalmente. “A falta de mão de obra está inutilizando qualquer esforço de reiniciar a economia”, disse o economista Larry Hu, do Macquarie Group.
Desde que o governo chinês declarou a epidemia caso de emergência nacional, em janeiro, províncias e municípios impuseram rígidas limitações à movimentação da população. As medidas são rigorosas na zona rural, onde barreiras nas estradas impedem moradores de ir a vilarejos vizinhos.
O vírus pode estar dando sinais de recuo no continente, já que o número de novas contaminações caiu para zero em muitas províncias, segundo dados oficiais, mas as autoridades rurais têm relutado em relaxar o confinamento das pessoas aos seus locais de origem.
No vilarejo de Zhumiao, que não registrou casos, moradores têm de passar por ao menos três postos de controle para chegar ao terminal de ônibus mais próximo, que continua fechado. Para viajar para fora da cidadezinha para trabalhar, a população tem de apresentar certificado no qual o empregador declara que a empresa reabriu, além de um compromisso escrito de não voltar à aldeia antes do fim da epidemia.
Essas exigências criam, virtualmente, uma proibição de viagem para os habitantes que não possuem emprego formal. Zhang Yanwei, morador de Zhumiao, disse ter adiado viagem planejada à cidade de Lanzhou, no noroeste do país, para encontrar emprego como encanador, uma vez que não tem um contrato. “Não há nada que eu possa fazer a não ser esperar”, disse Zhang, de 31 anos.
No fim da semana passada, menos de 20% da população adulta de Zhumiao havia deixado a cidade, segundo o governo local. Antes do recesso, quase toda a população em idade ativa da cidadezinha trabalhava em outras localidades.
Mas esses problemas não se limitam a Zhumiao. Pesquisa realizada na semana passada pela universidade de Wuhan com 104 vilarejos em 12 províncias detectou que menos de um terço dos adultos havia saído de sua cidade para trabalhar após o Ano Novo Lunar. Normalmente, entre 80% e 90% dos adultos viajam para trabalhar.
A atividade industrial foi reduzida, em um momento em que as fábricas buscam desesperadamente trabalhadores para ativar linhas de montagem. A escassez de mão de obra contribui para deprimir o índice dos gerentes de compras da indústria para a baixa recorde de 35 pontos em fevereiro.
“Não podemos retomar a atividade quando metade dos nossos trabalhadores está presa em suas cidades, na zona rural, em Henan”, disse um funcionário da Companhia de Vidro de Yaoxin, na cidade de Hangzhou, leste da China.
Pequim tentou melhorar a mobilidade dos trabalhadores. Muitas cidades litorâneas contrataram ônibus e até aviões para buscar trabalhadores no interior do país.
Seus esforços, no entanto, não foram suficientes para resolver o problema. O serviço especial de ônibus só para em determinadas aldeias, o que significa que os trabalhadores não conseguem chegar ao ponto de concentração.
Um estudioso de Wuhan disse que a manutenção dos controles de tráfego é compreensível pois autoridades municipais serão responsabilizadas por autorizar, mesmo sem conhecimento, portadores do vírus a propagar a epidemia. Isso é difícil para autoridades, uma vez que os portadores do vírus costumam apresentar sintomas dias após terem contraído a doença.
“Os governos municipais enfrentarão pressões ao relaxar os controles, porque o fluxo de trabalhadores migrantes pode se traduzir em uma exportação dos riscos”, disse o especialista.
Na cidadezinha de Zhumiao, a prevenção continua sendo prioridade para as autoridades, embora a maioria dos habitantes tenha deixado de usar máscaras. Uma autoridade do distrito de Qihai, ao qual Zhumiao pertence, disse que o governo está discutindo quando restabelecer o serviço de ônibus.
“Nossa principal tarefa é eliminar o vírus”, disse a autoridade, “e a livre movimentação das pessoas vai dificultar nosso trabalho”.