Os escondidos índices de desigualdade social da China

Duda Cambraia, Fernanda Vasconcelos e Lorena Pomarico  –  Alunas do curso de Jornalismo da ESPM-SP

Conforme dados divulgados pelo Escritório Nacional de Estatísticas da China, o Produto Interno Bruto do país de 2019 fechou em 14,4 trilhões de dólares, um crescimento de 6,1% em relação ao ano anterior, o mais baixo em 29 anos. Apesar disso, a porcentagem está dentro dos padrões estipulados pelo governo e a China segue sendo a segunda maior economia do mundo, ficando atrás apenas dos EUA.

Variações da economia chinesa durante vintes anos 

Em um intervalo de setenta anos, a China conseguiu sair de uma condição agrária, politicamente dividida e economicamente atrasada para se tornar uma grande potência mundial. Esse fato é oriundo de uma herança histórica que pode ser confirmada a partir da revolução comunista de 1949, liderada por Mao Tsé-Tung. Quando Mao chegou ao poder, o país estava devastado por guerras e pela desigualdade socioeconômica entre ricos e pobres que perpetuava desde a época imperial. 

O autoritarismo comunista foi o preço que os chineses pagaram para ter melhorias nos indicadores sociais. A partir da década de 60, a taxa de mortalidade caiu drasticamente, a expectativa de vida que antes era de 43 anos, passou a ser 66 anos em 1978 e de 76 anos em 2016. Já a taxa de alfabetização em 1982 era de 65% e em 2010 superou 95%.

Em 1978, dois anos após a morte do fundador do Partido Comunista Chinês, Mao-Tsé Tung, Deng Xiaoping assumiu como secretário-geral do partido, dando início a abertura econômica chinesa. Para isso, Deng Xiaoping migrou a economia chinesa de um modelo centralizado para o “socialismo com características chinesas’, que apesar do Estado ainda ter o poder econômico sobre decisões estratégicas a longo prazo, esse novo modelo permitiu o ressurgimento do setor privado e deu aos agricultores maior liberdade. Além disso, Deng também promoveu a abertura econômica ao comércio exterior, o que permitiu a entrada de multinacionais e de investimentos estrangeiros no país.

Como consequência, o crescimento chinês disparou e foi na década de 1990 que houve o aprofundamento das reformas econômicas, bem como aumento considerável do PIB, com um crescimento de 14,2% em 1992. Com as mudanças de Deng Xiaoping, o Banco Mundial estima que 850 milhões de chineses saíram da pobreza.

Atualmente, colecionando vários títulos, o país asiático também se encaixa na categoria de maior população mundial. Com, exatamente, 1,4 bilhões de habitantes, o governo de Pequim falha ao lidar com tamanha proporção. Apesar de ocupar a posição de  segunda maior economia do mundo, a riqueza não chegou em todos os locais do território. Mais da metade da população chinesa sofre em condições precárias nas regiões agrícolas e rurais do país. Entretanto, poucos compreendem a brutal desigualdade social da nação, afinal, o marketing do poder chinês é primoroso. 

Segundo o professor de relações internacionais da ESPM – SP (Escola Superior de Propaganda e Marketing – São Paulo), Alexandre Uehara, que viveu por determinado período de tempo na China, é nítida a diferença social e econômica do país. “Há uma cortina transparente que divide o mundo capitalista, que abrange as pessoas que podem ir à Paris comer macarrons, do outro lado da cortina, que condiz com a população que vive em condições extremamente precárias”, comenta o professor. 

Entretanto, as diferenças econômicas no país não são uma novidade. A ideia de uniformizar o território economicamente já vêm sendo executada pelo governo de Pequim há anos. A primeira e mais essencial alternativa foi a tentativa de expandir seu mercado, abrindo as portas para a entrada de capital internacional. Muitas empresas multinacionais, também conhecidas como transnacionais, instalaram e continuam instalando filiais no país. Acarretando no aumento de oportunidades de trabalho, e, logo, no crescimento econômico interno local.

Outro fator que, de certa forma, impedia o crescimento chinês era o preconceito externo dos outros países em relação à região. A China, por muito tempo foi vista como uma fábrica de falsificações, o governo pequinês de imediato percebeu tal atribuição negativa ao país, e com o intuito de extinguir esse semblante começou a investir em universidades, centros de pesquisas e empresas de tecnologia. 

“Hoje em dia, há muitas universidades chinesas que estão investindo fortemente na área de pesquisa e na compra de empresas multinacionais, sendo elas europeias, americanas e japonesas. Isso beneficia, de certa forma, o país, pois facilita que as empresas chinesas consigam trazer a tecnologia para dentro da região, sem parecer que estão roubando-a. Visando assim, a aniquilação da má fama”, conta Alexandre Uehara. 

E por fim, a política do One Belt on Road, representa a nova Rota da Seda, acredita-se que a construção de novas estruturas e a criação de ligações com os mercados da Europa, Oriente Médio e África, proporcionarão um desenvolvimento maior para o interior do país. Conforme as conexões com os mesmos se estabelecem, essas rotas vão gerando transformações econômicas, possibilitando  deste modo, que a tecnologia, que hoje está apenas nas zonas litorâneas, devido aos canais de exportação, se estenda e propague para todo o território chinês.

Desta forma, o governo pequinês tenta padronizar o nível socioeconômico da região acarretando na diminuição da desigualdade social do país. Um regime conservador impossibilita a ascendência de classes sociais, então algumas estratégias devem ser adotadas pelo governo para permitir que esses discrepantes raciocínios sigam trabalhando juntos. Buscar o dinamismo entre um governo ditatorial e uma economia liberal que é necessário para fortalecimento da economia, não é assim tão simples quanto parece. 

Normalmente, ao se falar em regime ditatorial, a primeira impressão despertada nas pessoas é o repúdio e o medo, porém, não nos chineses. Segundo Alexandre Uehara, a população não sente falta de uma democracia no país, afinal, uma parcela privilegiada da sociedade já possui uma parte dos seus desejos, satisfeita: dinheiro no bolso. 

“Uma das coisas mais interessantes que eu perguntei quando estive na China, foi se eles não sentiam falta de uma democracia no país, e para minha surpresa, a resposta que eu obtive foi “não”. Para algumas pessoas que eu conversei a liberdade neste momento significa ter dinheiro no bolso, pois isso eles não tinham antes.”, explica o professor. Entretanto, vale ressaltar que Alexandre conversou, apenas, com alguns habitantes da região, por isso, a opinião não deve ser generalizada ao restante do país. 

Além de todos os pontos já supracitados, a crise do coronavírus é outro segmento que pode prejudicar o desenvolvimento interno chinês. Há três diferentes perspectivas sobre o impacto da pandemia no cenário econômico, sendo que a primeira delas é que o país enfrente uma crise tipo V, ou seja, a economia despencará, fortemente, para emergir muito rapidamente. A segunda análise é de que o país enfrente uma grave crise econômica, assim como outras nações do mundo facearão também, colocando em xeque ainda mais a desigualdade do país asiático. 

A última perspectiva é de que a China, não consiga se recuperar rapidamente, entretanto, ainda sim, mantenha um crescimento econômico (mesmo que seja menor que anteriormente) em um ritmo dinâmico. Contudo, é necessário que todo mercado internacional, ou pelo menos, países que portam relações com a região acompanhem, também, o compasso do país asiático. Afinal, apesar do país investir no mercado doméstico ainda apresenta uma admirável dependência do mercado externo.  Por debaixo de uma resistente, porém nem tanto, carapaça, há um país vulnerável, que assim como outras nações, apresenta inúmeros problemas internos, sendo neste caso, a crucial desigualdade social. A imagem estereotipada da segunda maior economia mundial não deve ser levada ao pé da letra, pois, por detrás do título há uma população sofrida, a qual muitas vezes não possuí nem refeições diárias.  Até mesmo a grande, futura, potência têm segredos. 

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