A frieza da grama do vizinho

Beatriz Ré Magro, aluna do 4° semestre do curso de Propaganda e Marketing ESPM / SP

Quando ficamos fadados a uma rotina, um desconforto vem à tona e implora inconscientemente por mudança. Enquanto não conhecemos a fundo, o outro é divino; é salvador. Isola o tédio e ambienta uma pulsação pelo novo; fome com toque de gula. O perigo: uma vez que isso começa, comemos até cansar e continuamos – por puro comodismo. E, novamente, temos um cotidiano. Na procura de um basta para esse ciclo vicioso, a caótica São Paulo.

A capital paulistana abriga sentimentos complementares em seus extremos: amor e ódio. É apaixonante e, concomitantemente, intragável. O trânsito insano, a movimentação de pedestres, os mendigos a cada esquina, o elevado preço de absolutamente tudo, a distância infinita entre dois pontos – que, de início, pareciam tão próximos –, a violência brutal de todos os instantes e instâncias e, incabível de não mencionar, o aroma característico do rio Tietê. Relevemos, são 460 anos nas costas.

Por outro lado, do que seria São Paulo se não existissem seus espaços culturais, eventos icônicos, parques arborizados, a irresistível gastronomia de todos os cantos por todos os cantos, oportunidades de emprego, as vivências e experiências que oferece aos 18 milhões habitantes? Sem contar os 13,2 milhões visitantes, que logo se vão com “gostinho de quero mais”. (Fonte de dados: IBGE,2013)

Em meio às suas faltas e presenças, é válido ressaltar o individualismo. O encanto por São Paulo não se finda ao físico, ultrapassa para o intangível; provém daquilo que incita e proporciona ao paulistano, nativo ou não. Ainda sim, em paralelo, há uma tendência em abster-se de solidariedade e se reservar. Eis a desordem emocional que paira por seus ares frustrados.

Na visão de forasteiros, os males que afligem a cidade não ocorrem no metro que ocupam, mas sim em um “tão tão distante”. Migram para ela com as melhores intenções e expectativas e, já em processo de simbiose, as mazelas e prazeres do novo ambiente são intrínsecos ao diário particular. Estes, desprevenidos, têm a ilusão rompida com a percepção de que, no final das contas, é cada um por si. Vale crer no que já dizia Gabriel Pensador: “se ficar o bicho come, se correr o bicho pega”. Não há escapatória da cobrança exacerbada sobre os filhos da pátria – em seu sentido pleno de terra paterna – paulistana.

A partir dessa linha de pensamento, vê-se São Paulo no papel de pai. Responsável pela instrução do filho, biológico ou de criação, a figura paterna procura responder às necessidades básicas de tal com o intuito de proporcionar um desenvolvimento integral enquanto ser. Com isso, é crucial no processo de construção de caráter e personalidade do iniciante. Traçados os limites, almeja evitar frustrações futuras. Entretanto, no decorrer da trama, emerge um desgaste entre ambas as partes. “Deixe-me crescer”, sussurra a nossa vitalidade.

Logo, ser e estar em território paulistano é dispor-se a revelar dádivas e defeitos. Para uma convivência harmônica, a paciência do anfitrião e dos transeuntes é fundamental. A metrópole está de braços abertos. O segredo, talvez, seja dar tempo ao tempo. Se houver verdadeira empatia, a volta do entusiasmo é certa. A fim de aguentarmos a inquieta realidade embasada na autoafirmação e coletivismo, um último pedido: abrace-nos, São Paulo!

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