Exemplo de empreendedor que constrói o agribusiness do país

Rose Mary Lopes

Que o Brasil é grande produtor e exportador de alimentos, especialmente grãos, a maioria dos brasileiros sabem. Até sabe que na última década passamos a ser um grande fornecedor para a China, União Europeia, países asiáticos e outros, graças ao agribusiness competitivo e responsável por grande parte da balança comercial brasileira. Mas, conhece pouco além disto. Vale a pena então descortinar este cenário, vendo o impulso de empreendedores por trás dele.

Mesmo lutando com as mudanças climáticas e, em algumas regiões, enfrentando alteração da estação de chuvas e da quantidade delas, estima-se que a produção de grãos da safra atual chegará a 200 milhões de toneladas, superando em 3,4% a do ano anterior 2013/14. Com aumento previsto de 6,53 milhões de toneladas (dados do 5º levantamento da safra, fevereiro 2015, Companhia Nacional de Abastecimento – Conab).

Boa parte deste aumento provém da soja, cuja produtividade foi de 2854 kg por hectare na safra 2013/14 com expectativas de aumento para a safra atual, e que atingirá a barreira de 3000 kg por hectare (Conab, 2015). Com isto serão 95 milhões de toneladas de soja, que representam 47% dos grãos produzidos pelo país.

Com isto somos o segundo produtor mundial, seguindo nos calcanhares dos Estados Unidos (segundo dados do Departamento Agrícola deste mesmo país). A estimativa deles, publicada em janeiro de 2014, projetava para a safra 2013/14 os EUA com 91 milhões de toneladas e o Brasil com 86 milhões.

Para produzir esta montanha de soja, os produtores (empreendedores) e as cooperativas absorvem até menos crédito para custeio de safra – 12,12% – do que os que produzem milho – 67,24%. Os maiores estados produtores de soja são Mato Grosso (24,1%), Paraná (18,4%), Rio Grande do Sul (14,8%), região MATOPIBA (confluência entre Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, com 10%), Goiás (8,8%) e Mato Grosso do Sul (7,9%).

Acontece que até os anos 70 nem se imaginava ser possível produzir soja na região do cerrado brasileiro. Naquela altura o Centro-Oeste participava com menos de 2% da produção nacional, mas pulou para 20% nos anos 80, e para mais de 60% no início de 2000! É preciso, então, ver quem estava por trás desta enorme mudança.

Vários empreendedores, desbravadores foram taxados de malucos quando foram do sul e do sudeste para o Mato Grosso iniciar suas fazendas, com inúmeras dificuldades. Com grande falta de recursos – transporte, comunicação e humanos – e foram tateando com sementes que não eram adaptadas para o clima da região.

Um destes empreendedores é quase completamente desconhecido da geração atual. No entanto, foi um dos maiores empreendedores que o Brasil teve nos anos 70 e 80. Foi denominado Rei da Soja, sendo o maior produtor individual do mundo. Tinha construído um conglomerado com cerca de 40 empresas em diversos setores, e constou na Forbes como o bilionário brasileiro mais jovem. Seu nome: Olacyr Francisco de Moraes.

Como isto aconteceu? Olacyr trabalhou desde os 14 anos de idade. Com 19 trabalhava com o pai numa pequena empresa de transporte de cargas. Arrojado, aumentou a frota com financiamentos e conseguiu novos clientes como a Prefeitura de São Paulo. Percebeu logo a oportunidade de diversificar para pavimentação das ruas.

Daí fundou, em 1957, com seu irmão, a empresa de Construção e Transportes Constran Ltda. Com bom histórico dos serviços prestados, trabalhando duro, investindo tudo que podiam na própria empresa, acompanhou o ritmo de evolução do desenvolvimento da cidade, e foi ganhando obras maiores e mais complexas.

Com corpo especializado de funcionários pode fazer obras em outros locais e tão diversas como viadutos, pontes, portos, túneis, emissários submarinos, aeroportos, usinas, ferrovias. Foi a Constran que construiu os primeiros quilômetros do metrô de São Paulo. A partir da Constran ele fundou o Banco Itamarati.

Com o incentivo federal para que empresários investissem na região amazônica, a partir da instituição da Sudam, Olacyr juntamente com outros formaram um negócio para engorda de gado na região do norte do Mato Grosso. E depois, com a grande queda da produção americana de soja no ano de 1973, ele e outros agricultores perceberam a oportunidade de investir na soja.

Olacyr passa a ter fazendas – Itamarati – em Ponta Porã e Diamantino, onde planta soja, algodão, milho, arroz e trigo. Acontece que as espécies plantadas tanto de soja quanto a de algodão, não eram adaptadas. Investiu muito em pesquisas, construindo laboratórios próprios e estabeleceu convênios com a Embrapa e a Universidade Federal de Viçosa para desenvolver linhagens que produzissem melhor no solo e condições climáticas da região.

Após milhares de linhagens, no caso da soja geraram uma que produzia 48% de proteína relativamente ao peso – mais que os 44% da americana. E também criaram uma variedade de algodão (ITA90), com alta produtividade, que diminuiu enormemente a importação de algodão pelo país.

Irriquieto e sempre identificando novas oportunidades, percebeu que poderia produzir e comercializar o calcário para correção do solo, fundando duas empresas – Tangará (uma em 1979 e outra e, 1985, em municípios distintos). A trajetória dele passou também por construir e oferecer armazenagem para conservar os grãos produzidos no Mato Grosso.

Percebeu ainda a necessidade de construir a ligação ferroviária para escoar a produção, interligando-se com a rede ferroviária em São Paulo. Pena que nos acordos estabelecidos com o Estado, com aval do governo federal, somente a Constran tenha cumprido os prazos.

Assim, a Constran construiu mais de 200 km da Ferronorte, mas amargou todos os prejuízos financeiros pelo fato da ponte sobre o Rio Paraná, que a ligava ao estado de São Paulo, ter demorado mais de sete anos para ser construída. Em parte, associados a outros calotes governamentais, estes prejuízos levaram à derrocada de Olacyr. Mas, seu legado, bem como o de outros que realmente constroem e alimentam o país, aí está.

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