A União Europeia vai doar € 5 milhões em quatro anos para projetos de conservação e desenvolvimento sustentável do Cerrado. Outros € 500 mil virão do consórcio de ONGs que receberão os recursos da cooperação internacional europeia.
Os € 5,5 milhões – ou cerca de R$ 35 milhões, em valores de hoje- darão corpo ao Projeto Ceres, sigla para “Cerrado Resiliente” e também nome da deusa grega da fertilidade. O projeto é transnacional. Envolve também esforços no cerrado paraguaio e as organizações WWF-Brasil e WWF-Paraguai, com coordenação do WWF-Holanda e o Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), que existe há 31 anos e promove a conservação e desenvolvimento com populações tradicionais na Caatinga, Cerrado e Amazônia, principalmente na região conhecida como Arco do Desmatamento.
O projeto de cooperação começou a ser desenhado em 2019, combinando a preocupação ambiental com a agricultura sustentável, explica Ignacio Ybáñez, embaixador da União Europeia no Brasil. O projeto original abrange Brasil, Colômbia, Honduras, Paraguai, Equador e Bolívia e também nações africanas, com um total de 25 países. O foco é em segurança alimentar, mitigação de gases-estufa, conservação e uso da biodiversidade e apoio da retomada verde de forma inclusiva.
“O Cerrado é um bioma importante que enfrenta muitos desafios”, disse Ybáñez ao Valor. “Para nós, é também um laboratório de ideias e experiências para olharmos ao futuro e parte do esforço de cooperação que a UE faz no Brasil”, continua. “A iniciativa pode trabalhar tanto com a grande atividade agrícola, mas também os produtores familiares. Queremos aprender com o processo e ajudar nas soluções de atividades agrícolas que darão resultado econômico e fazer isso com sustentabilidade”.
Segundo o Mapbiomas, 47,1% do Cerrado já foi convertido principalmente em produção agrícola e pecuária. Dados do Censo Agropecuário Brasileiro de 2006 mostram que 69% das propriedades rurais do bioma pertencem a pequenos agricultores. Nele vivem diferentes grupos indígenas e milhares de comunidades que dependem de sua biodiversidade. São esses grupos que produzem muitos itens da sociobiodiversidade como frutas, castanhas, fibras, mel, flores e artesanato.
“Ceres é um projeto que tem abordagem de paisagem”, diz Ana Carolina Crisostomo, analista de conservação do WWF-Brasil. Isso quer dizer que o projeto considera o território olhando para seus atores – agronegócio, agricultores familiares, populações tradicionais e a biodiversidade propriamente dita. “Esses atores muitas vezes estão em conflito sobre o uso do território”, diz ela. “O Cerrado também tem grande importância para a UE por toda a soja que se exporta para lá, então também temos este olhar de construir uma produção em base sustentável e fazer a transição para o desenvolvimento de baixa emissão de carbono”.
Um dos enfoques será trabalhar na geração de renda e produção agrícola dos pequenos agricultores, tanto no fortalecimento de associações comunitárias e projetos de estímulo à sociobiodiversidade como na recuperação ambiental e em formas de agricultura mais amigável, diz a ecóloga Isabel Figueiredo, coordenadora do programa Cerrado e Caatinga do ISPN. “Uma das linhas será trabalhar com as famílias envolvidas na produção de buriti, babaçu, baru e mel de abelha nativa”, cita ela.
O projeto, que será apresentado hoje em webinar, tem três componentes, diz Stefan Agne, chefe de Cooperação da Delegação da UE no Brasil. O primeiro é a perspectiva da paisagem com os diferentes usos da terra, dos grandes produtores aos sistemas agrícolas tradicionais. O segundo eixo é promover tecnologias sustentáveis e ainda a interação com políticas públicas de uso sustentável da terra.
As atividades iniciais do Ceres serão no Cerrado do Mato Grosso do Sul, Paraguai e na região do Matopiba, diz Cristina Carvalho, gestora de projetos da área de ambiente e clima da cooperação da UE. “Mais de € 800 mil darão apoio aos pequenos”, adianta. Está em elaboração um edital emergencial para ajudar os agricultores familiares a superar as dificuldades impostas pela pandemia.