Marcas entram nos condomínios residenciais em busca de cliente

O distanciamento social e o home office implementados devido à pandemia chamaram a atenção para um novo mercado: a venda de produtos em lojas criadas dentro de condomínios residenciais, onde a clientela passa a maior parte do tempo.

O formato mais difundido é o de minimercados, que se assemelham às lojas de conveniência em postos de combustível, mas sem funcionários.

“O condomínio sempre foi um patinho feio do mercado imobiliário, e agora começa a virar a bola da vez. Tem muita empresa olhando [para isso]”, afirma Julio Paim, diretor-executivo e fundador da plataforma SindicoNet.

A Market4U, empresa criada em fevereiro do ano passado, em Curitiba (PR), se especializou nesse segmento. Já tem pontos de venda em 1.420 condomínios pelo país e cerca de 200 franqueados.

Eduardo Córdova, diretor-executivo e fundador da empresa, diz que a ideia de operar nos prédios surgiu antes da pandemia. Mas a crise sanitária trouxe mais urgência na instalação do serviço tanto por parte de síndicos como também dos moradores.

O sistema é baseado na confiança —pelo menos até que algo aconteça. Os produtos ficam em prateleiras, sem vidros ou trancas. Pelo celular, no aplicativo da empresa, o consumidor escolhe quais itens vai comprar e escaneia etiquetas QR code. Também na plataforma, é possível visualizar o total da compra e fazer o pagamento. O próprio morador é quem, então, pega as mercadorias selecionadas.geladeira com bebidas fica fechada e é acionada por bluetooth após a compra ser confirmada no aplicativo. Não há caixa e nem funcionários, e a compra só pode ser realizada pela plataforma.

A segurança é feita por uma câmera comum, conectada a uma central. Caso haja furtos na loja, a empresa consegue instalar câmeras mais sensíveis e sistemas que travam a retirada dos produtos que não foram previamente pagos, mas isso encarece a operação.

“Só instalamos quando há necessidade”, diz Córdova. Ele afirma que esse sistema extra é utilizado em 7% dos prédios.

O condomínio na Barra Funda (zona oeste de São Paulo) em que vive a analista de sistemas Sheyla Pariona, 37, instalou há duas semanas um mercadinho da Market4U.

Segundo ela, os preços dos produtos são um pouco maiores do que nos supermercados, mas a conveniência compensa. “É uma mordomia, ainda mais aqui, onde não tem muita coisa por perto.”

Antes de ser instalado no condomínio, o mercadinho precisou ser aprovado em assembleia. Pariona conta que o único receio dos moradores era o de que o comércio representasse um aumento na conta do condomínio, pelo gasto com a eletricidade.

Segundo Córdova, o consumo de energia pelas geladeiras do mercadinho fica por conta da empresa, que também paga cerca de 3% do faturamento das vendas ao condomínio em troca do uso do espaço.

A expectativa da Market4U é terminar o ano com 5.000 unidades e 500 franqueados. “Nós, como startup, lideramos, mas o varejo inteiro vem atrás. Temos que ser rápidos porque essa é a nossa vantagem”, diz o fundador.

Um dos varejistas que aposta no segmento é o Carrefour. A empresa tem desde março uma loja autônoma em um condomínio residencial em São Bernardo do Campo , na Grande São Paulo.

“Foi algo acelerado pela pandemia, mas não temos dúvida de que veio para ficar, e inclusive nos possibilita estar mais perto do nosso cliente”, diz João Gravata, diretor de proximidade do Carrefour.

O processo de prospecção da empresa, antes focado em identificar bons pontos comerciais em vias públicas, agora acrescentou prédios residenciais a essa busca. O Carrefour pretende abrir mais unidades do tipo no segundo semestre.

A unidade em São Bernardo tem 43 m², um quarto do tamanho médio de uma loja do Carrefour Express que fica na rua. A rede já aprovou projetos de 15 m², para atender condomínios menores.

“Podemos fazer diversos tipos de loja, adaptadas a diferentes áreas, características de condomínio e de construções”, afirma Gravata.

A rede AmPm, dos postos Ipiranga, também está de olho no mercado dos condomínios e pretende ter dez unidades em prédios residenciais e comerciais até o fim do ano. O modelo deve ser similar ao que já existe nos postos de combustível, mas com o mix de produto adaptado para as necessidades dos moradores.

Segundo Marcello Farrel, diretor-geral da AmPm, esse segmento da empresa irá focar em grandes condomínios, residenciais ou comerciais, que tenham várias torres.

Do lado das incorporadoras, esse tipo de serviço já é visto como um chamariz para novos clientes.

Todas as empresas consultadas afirmam estar em negociação com construtoras para que as marcas estejam presentes nos próximos lançamentos, em espaços dedicados aos mercadinhos.

Foi o que fez a Living. A incorporadora já tem três prédios entregues com minimercados —operados pela startup Onii— e prevê espaços em todos os seus novos projetos. Para apresentar a ideia aos possíveis compradores, eles colocaram réplicas do mercadinho no estande de vendas.

“Os consumidores estão de fato percebendo isso como um diferencial”, diz Felipe Cunha, diretor de incorporação da Living.

Segundo as marcas consultadas, é possível já fechar negócio desde a planta, mas nada impede que a operação seja decidida após a entrega do empreendimento.

O síndico profissional Marcos Carmona atua no condomínio Living Magic 2, em Osasco (Grande São Paulo), que tem desde junho de 2020 um mercadinho da Onii. A loja está sendo ampliada para oferecer mais produtos.

Carmona afirma que, além da praticidade para os moradores, a devolução de 3% a 4% do valor das vendas gera renda para o condomínio. “Aplicamos na conta corrente e vamos usar no fim do ano para fazer festa para o Dia da Criança, comprar decoração natalina ou fazer um churrasco para os moradores.”

Não é só de mercadinhos que vive o comércio nos condomínios. Cunha diz que a incorporadora Vivaz, que pertence ao mesmo grupo, tem uma lavanderia coletiva operada pela Omo, da multinacional Unilever.

Segundo Teo Figueiredo, diretor da Omo Lavanderia, a empresa oferece desde 2019 o serviço de compartilhamento em prédios residenciais e hotéis. Já são 360 unidades em operação.

Assim como nos mercados, a chave de acesso está em um aplicativo. O cliente reserva as máquinas para lavar e secar e paga pelo app. O sabão e o amaciante são liberados dentro dos equipamentos —não é preciso levar os itens de casa.

“Identificamos a lavanderia compartilhada como uma tendência já procurada por grandes do mercado, tendo em vista que os imóveis estão cada vez menores ou com espaço para home office e lazer”, diz Figueiredo.

É possível pensar o empreendimento em parceria com a Omo para já ter a lavanderia planejada para operação. O serviço também pode ser contratado posteriormente.

Dependendo do plano escolhido, não há custo para o condomínio, só para o usuário: o ciclo de lavagem custa cerca de R$ 12.

Outra marca conhecida que entrou no último ano no segmento residencial é a Sem Parar, de chips para pedágio. A empresa lançou no fim de 2020 um serviço que permite o uso do seu adesivo para controle automático do portão da garagem.

O modelo já existia em prédios de escritório, mas foi adaptado. O condomínio residencial paga o aluguel da antena usada no sistema, cujo valor varia conforme o tamanho do prédio.

“Estávamos com essa ideia antes, e a pandemia ajudou a dar esse passo. Se a gente quer estar no dia a dia dos clientes e eles estão em casa, vamos para a casa deles”, explica Rogério Pezelli, diretor de desenvolvimento de negócios da marca.

https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/06/marcas-entram-nos-condominios-residenciais-em-busca-de-cliente.shtml

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