Leonard Downie Jr. foi um dos editores da cobertura de Watergate pelo Washington Post nos anos 1970, modelo para o jornalismo nas décadas seguintes. Posteriormente, substituiu o próprio Ben Bradlee como editor-executivo, cargo que ocupou por 17 anos, até 2008.
Hoje professor da Escola de Jornalismo Walter Cronkite, na Universidade do Arizona, ele acaba de completar um relatório, junto com um ex-diretor de Jornalismo da CBS News, em que marca o fim do ideal de objetividade na imprensa americana.
Em suma, escreve na introdução: “Ser ‘objetivo’ ainda deve continuar sendo uma meta? Se não, como foi nossa conclusão, como criar um novo conjunto de padrões para notícias com credibilidade?”.
Lista diversos motivos para o caso da busca por objetividade, do êxito do modelo de negócios da Fox News aos jovens ativistas que tomaram as grandes redações. E afirma que abandonar essa meta ajuda a recuperar a confiança no jornalismo.
A reação de colegas como James Fallows, outro veterano da grande imprensa, é de apoio, mas não sem ironia: “Esse é um passo significativo e bem-vindo de Downie. Nos anos 1990, o argumento dele era que os repórteres nem deviam votar, porque comprometia sua objetividade”.
O relatório ouve mais de 70 jornalistas, inclusive os principais editores, como Kevin Merida, do Los Angeles Times, que quer soltar as amarras: “Estamos tentando criar um ambiente em que não policiemos demais nossos jornalistas. Nossos jovens querem ser participantes no mundo”.
Downie não chega a propor padrões “novos”, defendendo, por exemplo, transparência e foco em reportagem. Lança bordões como “esforce-se não só pela precisão, mas pela verdade”, uma forma de combater o “equilíbrio irracional” entre os dois lados —ainda que se trate apenas da “melhor versão disponível da verdade”.
Questionado sobre o estudo, Carlos Eduardo Lins da Silva, professor do Insper e ex-correspondente em Washington, diz ver um “descenso do jornalismo nos EUA” e projeta sua volta ao passado, ao século 19, quando era atividade de “intelectuais, políticos e ativistas de causas sociais”.
Ressalva que não seria um retorno “necessariamente ao alinhamento a partidos políticos, estes também em baixa na sociedade, mas alinhamento a causas, um jornalismo ‘partisan’ mais que partidário”.
Sobre as conclusões de Downie, avalia que, “com as mudanças em curso, tem início o processo de construção de novas argumentações para um discurso que justifique a alteração de procedimentos hegemônicos há um século”.
Diferente dele, não acredita ser uma tendência “necessariamente boa nem para a sociedade nem para a democracia”, porque “o ambiente social decorrente dessa transformação será muito diferente do que existia naqueles tempos, provavelmente mais arriscado e menos democrático”.