Grupos de luxo já se recuperam da pandemia

Os maiores grupos do setor de artigos de luxo devem se recuperar do golpe da covid-19 já neste ano, uma vez que consumidores dos Estados Unidos e China estão fazendo com que as vendas possam superar os patamares pré-pandemia. 

A Hermès, nesta quinta-feira, superou as previsões dos analistas com o maior crescimento registrado no setor até agora, obtendo no primeiro trimestre uma receita de € 2 bilhões que foi 33% maior que a do mesmo período de 2019. 

A LVMH, líder do setor, deu o tom na semana passada ao anunciar que suas receitas cresceram 8% no primeiro trimestre em relação ao mesmo período do ano passado, antes da pandemia paralisar a economia mundial com “lockdowns” e proibições de viagens. A retomada na Kering foi menos pronunciada, com um crescimento de 5,5%, uma vez que sua principal marca, a Gucci, está no meio de uma reorganização. 

Nenhum desses grupos fornece diretrizes anuais, mas analistas estimam que as receitas deste ano dos três igualarão ou superarão as de 2019 neste ano, segundo a Thomson Reuters Eikon. LVMH e Hermès deverão anunciar lucros líquidos maiores do que em 2019. 

A recuperação dos líderes do setor de artigos de luxo começou na metade do ano passado e desde então ganha força, sugerindo que eles estão abocanhando fatia de mercado de marcas menores e independentes.

Thomas Chauvet, um analista do setor de artigos de luxo no Citigroup, diz que os piores temores dos investidores, de uma queda prolongada do setor, agora parecem infundados. A ação dos bancos centrais e grandes pacotes de estímulo econômico dos governos estimularam os preços dos ativos e os mercados de ações, levando o consumidor – especialmente o mais abastado – a se sentir otimista e disposto a gastar. “Desta vez a crise econômica foi severa, mas na verdade ela teve duração curta, ao contrário de crises anteriores”, disse o analista, referindo-se à crise financeira de 2008. 

Os investidores temiam que um congelamento das viagens internacionais pudesse debilitar o setor de artigos de luxo porque suas vendas dependem muito do fluxo de turistas para a Europa. Os consumidores chineses em particular compram muitos produtos da Louis Vuitton, Gucci e Chanel em Paris e Milão. Eles apreciam a experiência de comprar produtos sofisticados em grandes lojas, e aproveitam os preços mais baixos. 

Em novembro, analistas da Bain e da Altagamma previram que as vendas de artigos de luxo levariam até três anos para se recuperar e cairiam 23% no mundo, para € 217 bilhões em 2020. Mas na verdade o golpe sofrido pelos grandes grupos foi bem mais ameno, chegando a cerca de 10% no ano passado, segundo Luca Solca da Bernstein Research. Os chineses e americanos estão comprando em casa e as marcas vêm sendo bem-sucedidas em atrair a clientela local, dependendo menos dos turistas. 

“O segundo semestre do ano passado foi muito bom e o ritmo está melhorando agora”, disse Solca. “Está bem claro que a demanda está vigorosa, especialmente pelas maiores marcas.” 

A continuidade dessa tendência dependerá em grande parte do comportamento do vírus e do ritmo das campanhas de vacinação, e também do grau de gastos que serão desviados dos artigos de luxo, assim que os setores de viagens e lazer forem reabertos. 

Eric Du Halgouët, diretor financeiro da Hermès, disse nesta quinta-feira que está “difícil prever” se uma recuperação plena poderá ocorrer neste ano, dados os “acontecimentos preocupantes em relação ao vírus”, como no Japão, onde novos “lockdowns” poderão ocorrer. “As coisas vão se movimentar novamente, mas a recuperação corre o risco de ser caótica”, disse ele a jornalistas. 

Com as ações da LVMH em patamares recorde de alta, seu controlador Bernard Arnault projetou mais confiança em uma assembleia de acionistas recente. “Nossas casas já passaram por uma série de crises ao longo das últimas décadas e elas sempre nos ensinaram lições valiosas que possibilitam uma fundação poderosa para os anos de crescimento que se seguem”, disse ele. 

“Mesmo com o futuro incerto em relação à pandemia, dá para ser razoavelmente otimista”, disse o empresário. 

Isso ajudou a LVMH a “roubar” este ano a coroa de maior com panhia aberta da Europa, que pertencia à Nestlé (ver o desempenho do primeiro trimestre nesta página). As ações da LVMH subiram quase 50% desde janeiro de 2020, colocando Arnault no topo da lista das pessoas mais ricas do mundo. 

O magnata de 72 anos e sua família agora têm uma fortuna de US$ 185 bilhões, segundo a revista” “Forbes”, perdendo apenas para o fundador da Amazon, Jeff Bezos, cuja fortuna está estimada em US$ 196 bilhões. Quatro dos cinco filhos de Arnault trabalham na LVMH. 

Apesar do otimismo, permanece o risco de uma recuperação de duas velocidades no setor – os grupos menores pode ter dificuldades por mais tempo do que os líderes. 

Salvatore Ferragamo, Tod’s e Hugo Boss não deverão recuperar suas vendas ao nível de 2019 antes de 2023 ou além, segundo previsão de analistas da Eikon. 

Tal polarização se tornou uma característica do setor na última década, segundo analistas, e a pandemia poderá acentuar essa divisão. No último ano, os consumidores gravitaram em torno de artigos mais clássicos e atemporais, além das marcas que invocam uma sensação de tradição, o que favorece marcas em Hermès e Chanel, em detrimento de outros nomes menores. 

Até mesmo a normalmente exuberante Gucci diminuiu o tom em alguns de seus designs enquanto tenta retomar o crescimento – uma de suas novas bolsas Diana é feita de um rico couro marrom com uma alça de bambu que remete aos anos 50. 

https://valor.globo.com/empresas/noticia/2021/04/23/grupos-de-luxo-ja-se-recuperam-da-pandemia.ghtml

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