DeepSeek faz ‘big techs’ provarem do próprio remédio

As gigantes de tecnologia no mercado de inteligência artificial (IA) levaram um susto na última semana de janeiro, quando viram as ações de empresas como Microsoft, Nvidia, Alphabet (controladora do Google) e Tesla sofrerem grande desvalorização. Os papéis de algumas delas praticamente derreteram. O que muitos especialistas e executivos questionam é se está se desenhando uma nova ordem no mercado a partir da ruptura provocada por uma ousada startup chinesa, a DeepSeek.

Na segunda-feira (27), a Nvidia perdeu cerca de US$ 600 bilhões em valor de mercado após uma queda de 16,86% nas suas ações na bolsa americana. Na quinta-feira (30), US$ 200 bilhões evaporaram do valor de mercado da Microsoft. E assim a desvalorização passou de gigante para gigante.

A pequena DeepSeek, especializada em inteligência artificial, publicou um relatório explicando que treinou seu novo chatoot (software que conversa, responde perguntas) R1 com menos de US$ 6 milhões, uma fração do gasto por concorrentes como OpenAl e Google Gemini. Além disso, o fundador da DeepSeek, Liang Wenfeng, decidiu deixar os códigos de seu modelo abertos e o acesso ao chatbot é gratuito.

Indiferentes aos burburinhos tecnológicos e à desvalorização no mercado de ações, os usuários se apressaram em acessar o novo sistema. Na segunda-feira (27), os downloads do assistente de lA chinês haviam superado o ChatGPT, seu rival americano, na App Store, a loja online de aplicativos da Apple.

Enquanto digeriam a revelação de Liang e a corrida dos usuários, investidores questionaram a eficácia dos aportes bilionários nas grandes empresas de lA. Por que gastar tanto com essas empresas, se uma startup consegue desempenho equivalente e ainda mais eficiente com menos dinheiro?

Ainda no meio do abalo, a OpenAl, sua parceira Microsoft, a Nvidia e outros especialistas expressaram admiração pela realização da DeepSeek. Passado o susto, alguns competidores questionam como a startup chegou aos resultados obtidos. Mais contundente, a OpenAl acusou a pequena rival de treinar os modelos dela usando o seu robô ChatGPT.

Paradoxalmente, as “big techs” afirmam que vão se espelhar nas inovações da DeepSeek para aperfeiçoar seus próprios modelos de lA.

O que se observa é que enquanto as americanas acusam a chinesa de copiar seus modelos, essas gigantes pretendem se apropriar das informações, facilitadas pelo código aberto imposto pela DeepSeek, para aprimorar os seus próprios robôs.

Nesse processo intrincado, é difícil saber quem copia quem.

É notório que, para desenvolver seus chatbots, as “big techs” usaram conteúdo da mídia e de pesquisadores sem autorização, o que provocou processos na Europa, nos EUA e na Austrália, além de medidas de proteção de dados, inclusive no Brasil. Agora, essas grandes empresas de tecnologia provam do próprio remédio.

Se a startup treinou seus modelos com os de concorrentes mais maduros (que receberam bilhões de dólares em aportes), a DeepSeek expõe o desenvolvimento estratégico dessas companhias, o que é intrigante.

O movimento da novata chinesa tende a baratear o desenvolvimento e os serviços prestados pelas inteligências artificiais.

Isso significa que os custos da computação para inferência também devem cair, permitindo que as pessoas possam consumir mais a tecnologia e, consequentemente, sejam desenvolvidos mais aplicativos. Inferência é como são chamados os cálculos feitos pelos modelos de linguagem para gerar respostas a comandos.

Com o argumento de proteger os dados dos usuários, autoridades de vários países interpelaram a startup e bloquearam o aplicativo, inclusive onde o chatbot não opera. França, Itália, Alemanha, Irlanda e Estados Unidos estão entre os países que tomaram medidas para conter a expansão do sistema da DeepSeek, na contramão de usuários que tentam garantir o aplicativo. E o movimento está apenas começando.

https://valor.globo.com/empresas/noticia/2025/02/03/startup-chinesa-deepseek-faz-big-techs-provarem-do-proprio-remedio.ghtml

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