Criada para ser o principal fórum das Américas, a Organização dos Estados Americanos tem sua relevância colocada em xeque em uma região polarizada e sem liderança. A OEA não encontra respostas para frear a crise democrática na Venezuela e na Nicarágua, entra na mira dos governos de esquerda, e vê as cadeiras dos dois maiores países da região – Brasil e EUA – ocupadas por representantes interinos, em sinal de desprestígio.
“A incapacidade de deter a escorregada ditatorial da Nicarágua ou de enfrentar o colapso da Venezuela, que criou o maior desastre humano da história moderna da América Latina, mostram que a OEA deve tomar uma atitude mais proativa, mas não consegue em razão da natureza de seus arranjos de votação e das ambições de vários Estados-membros”, afirma Eric Farnsworth, vice-presidente do Council of the Americas e ex-assessor da Casa Branca.
As posições adotadas pelo organismo durante o mandato de Donald Trump fazem com que o órgão tenha sua credibilidade questionada por governos de esquerda, como o de Andrés Manuel López Obrador (México) e o de Alberto Fernández (Argentina).
Em 2019, a OEA legitimou a participação de um diplomata da oposição ao chavismo como o representante da Venezuela no órgão. A medida foi tomada antes de mais de 50 governos reconhecerem Juan Guaidó, e não Nicolás Maduro, como presidente da Venezuela. Mas a posição mais controvertida do Conselho Permanente do órgão foi a indicação de que houve fraude nas eleições da Bolívia de 2019, o que levou Evo Morales a renunciar ao posto. Pesquisadores ligados ao MIT chegaram a contestar o relatório da OEA, em 2020.
“Aos olhos de vários Estados-membros, a instituição está muito em dívida com os interesses dos EUA para fornecer uma defesa eficaz das instituições democráticas, levando alguns a clamar por organizações ‘autônomas’ para contestá-la”, afirmaram David Adler, coordenador do centro Progressive International, e Guillaume Long, ex-chanceler do Equador, em artigo publicado no inglês The Guardian.
Desafios
“A OEA está em uma posição muito difícil. No momento, ela está lutando para manter sua relevância e a capacidade de provar que pode resolver desafios e questões regionais”, afirma o cientista político Ryan Berg, do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais com sede em Washington. Para Berg, o fortalecimento de outros fóruns da América Latina faz parte de uma agenda de parte dos países da região para esvaziar a OEA propositalmente. “Os países que são algumas das democracias com pior comportamento ou antidemocráticos na região são os que pressionam para suplantar a OEA como organização regional preferida. Há uma agenda em jogo aqui”, afirma.
Criada em 2010, a Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) tinha o intuito de promover integração entre os governos da região e servir de contraponto à OEA, onde EUA e Canadá sentam à mesa. Com o México na presidência temporária do órgão, a Celac tem recuperado espaço no multilateralismo regional diante de uma OEA desgastada. Mas a permanência de Maduro no grupo expõe a divisão na região sobre a situação de Cuba, Nicarágua e Venezuela. Governos do Uruguai e do Paraguai criticaram a presença do venezuelano na última reunião da Celac, da qual o Brasil não fez parte. O presidente Jair Bolsonaro retirou o Brasil do grupo.
Na OEA, a representação da Venezuela é precária, feita pelo grupo de Guaidó, que não conseguiu retirar Maduro do poder. Cuba é um membro não ativo. E, há 15 dias, o nicaraguense Daniel Ortega formalizou o pedido de saída do país da OEA, que não reconheceu a legitimidade de sua reeleição, após seu governo ter prendido quase todos os opositores.