Com balconistas usando máscaras e os onipresentes frascos de álcool em gel por todos os lados, o efeito da pandemia do coronavírus é impossível de não ser sentido na loja de departamentos parisiense Le Bom Marché.
Mas talvez a evidência mais flagrante esteja num saguão do piso superior onde clientes de fora da União Europeia (UE) processam suas restituições de impostos sobre vendas. Antes da pandemia, a mais antiga loja de departamentos do mundo, controlada pelo grupo de artigos de luxo LVMH, tinha abertos 12 guichês para os turistas reivindicarem seus impostos. Na semana passada, a única atendente a serviço disse que realizaria só três restituições naquele dia.
Com as capitais da moda Paris, Roma e Milão voltando a ganhar vida, a indústria dos artigos de luxo enfrenta uma dura realidade: os turistas chineses, que respondiam por dois terços das vendas do setor na Europa antes da covid-19, estão ausentes e não deverão retornar no curto prazo.
Agora, marcas como Chanel, Gucci e Louis Vuitton terão de contemplar mais sua clientela local, buscando ao mesmo tempo entender a gravidade com que a emergência de saúde pública alterou os desejos dos clientes e as preferências de compra.
Remo Ruffini, CEO da marca italiana de artigos de luxo Moncler, diz que o choque de demanda provocará mudanças em tudo, do design às táticas de vendas. “A normalidade no momento é um horizonte distante”, disse ele ao “Financial Times”. Para a Moncler, mais conhecida por seus luxuosos casacos acolchoados, foi, segundo ele, “o momento de estimular o digital, redesenhar a rede de varejo, estabelecer uma relação mais próxima e construtiva com a cadeia de fornecimento, inventar novas maneiras de apresentar e vender as coleções, e reconsiderar como se relacionar com os clientes”.
Mas Ruffini alertou que alguns aspectos dos negócios não puderam ser mudados: “A indústria da moda é muito física, precisamos dos estilistas, alfaiates, acessórios, tecidos, nem tudo pode ser manejado remotamente”. Para encorajar os funcionários a voltar ao escritório em Milão, a Moncler está oferecendo a eles bicicletas, consultas gratuitas com médicos e testes de anticorpos para a covid-19.
Com a volta dos trabalhadores, a prioridade imediata será vender os estoques, especialmente de roupas. Na Le Bom Marché, casacos da Isabel Marant e mocassins da Tod’s já tiveram os preços reduzidos em 40%. “Os consumidores estão esperando os descontos como a nova regra do jogo”, diz Claudia D’Arpizio, analista do setor de artigos de luxo da Bain & Co.
Mas as marcas que têm lojas próprias vão limitar esses descontos e usar pontos de vendas de menor visibilidade para queimar seus estoques. Algumas, como Chanel e Louis Vuitton, chegaram até mesmo a aumentar seus preços em 5% a 17% para compensar os custos mais altos e proteger as margens.