Ameaça ao TikTok leva influenciadores a apostar no rival Triller

Quando se começou a falar em uma possível proibição do TikTok, em julho, os diretores de um pequeno aplicativo de vídeo social chamado Triller viram uma oportunidade de crescimento. Para atrair usuários, a companhia pôs os olhos nos maiores nomes do TikTok. Alguns dos Sway Boys, um grupo de influenciadores do TikTok, haviam brincado com a ideia de criar seu próprio aplicativo para competir com o TikTok, mas depois de uma discussão com Ryan Kavanaugh, o proprietário majoritário do Triller e veterano executivo da área de entretenimento, decidiram que a plataforma seria boa para eles.

O Triller ofereceu um acordo aos criadores: “contem ao seu público que vocês estão se mudando para o Triller, e nós daremos a vocês ações e cargos na companhia. Poderão ainda postar no TikTok, mas somente se postarem no Triller com mais frequência”. Deu certo: Josh Richards, de 18 anos, dos Sway Boys, foi nomeado diretor de estratégia do Triller. Seus colegas Griffin Johnson, de 21, e Noah Beck, de 19, entraram como assessores com ações.

Logo, a CNBC, CNN, Fox News e o jornal Los Angeles Times escreveram sobre a deserção do TikTok para o Triller, um aplicativo que descreveram como substituto viável do TikTok se este fosse proibido. Em agosto, o Triller anunciou que estava procurando recursos por US$ 250 milhões, elevando o seu valor de mercado para mais de US$ 1 bilhão. Mas ele poderia sobreviver à propaganda exagerada?

Conseguir aquele “dinheiro do Triller”

Fundado em 2015, o Triller se define como um aplicativo para a rápida produção de vídeos de música com aparência de profissionais. Em termos funcionais, é diferente do TikTok: ele tem ferramentas de edição diferentes; seus usuários não podem fazer “duetos” ou reagir aos vídeos; e embora ofereça grandes singles e canções de sucesso, não tem a ampla biblioteca de sons e coleção de músicas para os usuários do TikTok poderem se expressar.“Acho que há muitas coisas no Triller que o TikTok não tem e vice-versa; ambos têm suas vantagens”, disse Beck, dos Sway Boys.

O Triller, por exemplo, tem fama por causa dos seus astros. A companhia conseguiu levantar dinheiro de executivos e celebridades do entretenimento, como Snoop Dogg, 21 Savage and Migos, e trouxe uma lista de usuários de grande destaque, entre eles The Weeknd, Marshmello, Lil Wayne, Young Thug, Kendrick Lamar, Tyga, T.I. e Jake Paul.

O mais importante a respeito do Triller, segundo alguns dos seus patrocinadores, e o fato de ser uma empresa americana. As discussões a respeito da proibição do TikTok decorreram da preocupações com a segurança de dados porque a ByteDance, dona do TikTok, é uma corporação chinesa. “Proteja sua família e o nosso país, não use o #tiktok”, tuitou Kavanaugh em outubro no ano passado. “Retire seus dados, não deixe que eles destruam a Indústria da Música americana e espionem os nossos filhos. Trabalhe com os artistas para os artistas”. 

Para atrair artistas, o Triller pretende usar todos os recursos de que dispõe. O “dinheiro do Triller” se tornou uma piada popular entre os TikTokers em Los Angeles, porque, como dizem, a companhia quer fazer de tudo para se associar aos astros certos.

Além disso, alugou mansões em Los Angeles para os principais criadores morarem. Depois que a prefeitura desligou a energia dos astros do TikTok Bryce Hall e Blake Grey porque em agosto não obedeceram às normas estabelecidas para as reuniões presenciais, eles se mudaram para uma casa do Triller. Na semana passada, nove criadores, entre eles Tayler Holder, de 23, da Hype House, se mudaram para outra propriedade alugada pelo Triller.

A companhia paga a manutenção da casa, os pedidos semanais de supermercado, transportes terrestres, Wi-Fi de banda larga e equipamentos para a produção como ring lights. Qualquer coisa de que o criador precisar para produzir conteúdo, o Triller conseguirá. Para um vídeo recente de um criador, a companhia conseguiu um helicóptero.

Quebradores de acordos

Em julho, o Triller começou a oferecer aos criadores centenas de dólares por mês para postar no aplicativo. Quran Stenline, de 21, conhecido como @SwagBoyQ, disse que a companhia lhe ofereceu dinheiro para usar aplicativo e garantiu que os seus vídeos serão apresentados na versão do Triller da página For You, que é o equivalente da primeira página do TikTok.

Stenline recusou a oportunidade. “Não acho que seja justo para os criadores menores ou outros criadores em geral que estão tentando chamar a atenção”, ele disse. Pelo menos no TikTok, afirmou, todo mundo tem uma maneira mais correta de chamar a atenção.

Os criadores também acharam frustrante navegar no aplicativo. “Toda vez em que tento usar o Triller é uma experiência terrível”, disse Doug Marland, de 23, que tem 2,3 milhões de seguidores no TikTok. “Tenho a impressão de que para conseguirem criadores que usem o aplicativo terão de pagá-los. Não acho que, de outro modo,  qualquer criador esteja disposto a usar o aplicativo”.

Também foram levantadas dúvidas quanto à precisão das métricas relatadas do Triller. Em agosto, o aplicativo ameaçou processar a Apptopia, uma empresa de análise de aplicativos de terceiros, por divulgar estimativas dos downloads do aplicativo da Triller que eram muito menores do que os números informados publicamente pela companhia. Na semana passada, seis ex-funcionários da Triller falaram com o site Business Insider afirmando que a empresa “informou um número de usuários mensais ativos cinco vezes maior do que mostravam as métricas internas.”

No dia 15 de agosto, a equipe social do presidente começou a publicar vídeos com o seu nome. Quando um concurso de rap chamado #MAGAChallenge parodiou o Triller, Trump tuitou que levaria os vencedores da competição para a Casa Branca de avião. (Dois funcionários do Triller se demitiram da companhia depois que o desafio se tornou viral.) Donald Trump Jr. aderiu ao Triller no início de setembro e postou um monólogo de oito minutos sobre o que ele vê de péssimo no TikTok para os Estados Unidos.

Enquanto este ano a TikTok e o Facebook reprimiram a desinformação, a proibição de hashtags e páginas relacionadas às teorias da conspiração, como QAnon e Pizzagate, o Triller permitiu que elas crescessem. Kavanaugh disse que a decisão de não proibir este conteúdo foi intencional.

“A nossa posição”, afirmou, “é que se não é ilegal, se não é antiético, não prejudica um grupo, e não é contrário às nossas condições de serviço, não iremos filtrá-lo ou proibi-lo. Pessoalmente tenho um enorme problema com o fato de as companhias de tecnologia se considerarem árbitras da verdade. Nós nunca escolhemos um lado, nós defendemos a liberdade de expressão. Nós não pretendemos decidir que lama está suja e qual nós achamos limpa”.

O que devemos esperar

Embora o Triller tenha conseguido contratar talentos, ainda não provou sua capacidade de lançar as carreiras de influenciadores. O TikTok é ainda o lugar predefinido procurado pelos jovens que iniciam uma carreira a partir do anonimato e conseguem formar um público.

Mas Kavanaugh disse que tudo isto mudará em breve. Na semana que vem, o aplicativo lançará um novo feed melhorado em termos algorítmicos, cuja função será ajudar os criadores que estão criando um público do zero. “Todas as pessoas que acham que não conseguirão peças ou visualizações, irão conseguir”, afirmou Kavanaugh. O Triller está trabalhando também para trazer mais criadoras de alto gabarito do TikTok para o aplicativo; até o momento, seus criadores parceiros são na maioria homens.

Mesmo que o Triller não supere o TikTok, ainda assim poderá tornar-se um grande negócio. “O TikTok e o Triller podem coexistir e ambos terem sucesso”, disse Anis Uzzaman, diretor executivo da Pegasus Tech Ventures e investidor no Triller.

Kavanaugh afirmou que este é apenas o começo de uma mudança maior na área de entretenimento e consumo, e ele espera que o Triller seja parte desta mudança. “O mundo gira rapidamente”, prosseguiu. “É tudo gratificação instantânea. Há a fama instantânea e o conteúdo instantâneo, e, na nossa opinião, o futuro do mundo será assim”.

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