A chave da produtividade

Em palestra de 1996 intitulada “Big Bills Left on the Sidewalk”, o falecido Mancur Olson fez uma observação de impacto: um indivíduo de um país pobre, digamos o Haiti, que emigra para outro mais rico, por exemplo, os Estados Unidos, de imediato se torna muito mais produtivo e ganha um salário bem maior do que antes. O indivíduo não muda da noite para o dia, portanto, sua capacitação profissional, ou atitudes culturais não explicam a melhora na situação. A resposta, em vez disso, tem que estar no ambiente do novo país. 

Dessa forma, Olson concluiu que muitas (ou a maioria) das economias não são eficientes socialmente. Um melhor contexto institucional e social, além de maiores estoques de ativos resultantes de investimentos do passado, pode fazer uma diferença enorme na produtividade dos indivíduos e, portanto, em seus padrões de vida. 

O problema, como destacado por Olson, é que os indivíduos não podem modificar o contexto geral no qual vivem e trabalham, a não ser mudando de lugar. As melhorias necessárias para aumentar a produtividade de toda uma economia requerem ação coletiva e coordenada. As próprias pesquisas de Olson sobre a lógica da ação coletiva são bem conhecidas e exploram por que ela é tão difícil de alcançar. 

Infelizmente, a percepção reveladora de Olson sobre a necessidade de coordenação e sua comparação a “notas de dinheiro grande deixadas na calçada” raramente aparecem no atual debate da produtividade. O foco da discussão, em vez de estar na necessidade de ação coordenada, está nos diversos possíveis fatores benéficos para a produtividade – desde os porquês de a produção por hora de trabalho estar praticamente estagnada em muitos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico desde meados dos anos 2000 até quais políticas direcionadas podem ajudar a revitalizar cidades ou regiões que ficaram para trás. 

Por exemplo, as autoridades econômicas normalmente avaliam projeto a projeto a relação custo/benefício de possíveis investimentos em infraestrutura. O retorno de qualquer projeto, contudo, será afetado por outras decisões, tanto públicas quanto privadas. Se uma nova linha ferroviária for aberta, os horários dos ônibus locais serão alterados para coordenar as viagens das pessoas? As incorporadoras imobiliárias construirão residências nas proximidades? Outras agências governamentais inaugurarão escolas na área? 

Na ausência de decisões coordenadas, a inclinação geral é ter a percepção de que a melhor opção para que o investimento valha a pena é optar por novos projetos nos locais onde mais dessas outras peças complementares já forem existentes. Infelizmente, agências governamentais que avaliam projetos raramente são encarregadas de elaborar uma análise holística do cenário político-econômico. 

Outro problema similar está nas armadilhas, regionais ou locais, da baixa capacitação profissional. Se não há empregos de bons salários em determinada área, então os indivíduos não terão incentivos para investir na própria educação. E se o conjunto local de mão de obra qualificada disponível for pequeno, os empregadores não terão incentivo para abrir escritórios ou fábricas ali. “Ir para fora” fica como a única opção para as pessoas que quiserem “ir para cima”. 

Exemplos como esses hoje alcançaram status quase incontestável entre os analistas econômicos, dada a aceitação geral de que as “instituições” são importantes para o crescimento e o desenvolvimento econômico. Ainda assim, os economistas precisam relacionar suas análises a uma compreensão do potencial político para mudar, da sociologia das organizações e da psicologia da tomada de decisões. Simplesmente conclamar regiões para se tornarem “mais parecidas ao Vale do Silício” é inútil. 

O desafio para analistas e autoridades econômicas é compreender, em cada contexto específico, exatamente o tipo de coordenação necessária para elevar a produtividade e que ações (e por parte de quem) podem conseguir isso. 

A vasta desigualdade entre regiões e, portanto, nas chances das pessoas na vida, é uma questão política crucial em quase qualquer lugar, como indicam as surpresas eleitorais e a crescente polarização política dos últimos anos. Além disso, a pandemia da covid-19, a probabilidade de turbulências econômicas decorrentes de conflitos civis ou condições climáticas extremas, a necessidade existencial de passarmos a uma economia de carbono zero e a desestabilização generalizada trazida pelo mundo digital farão da busca por uma prosperidade abrangente um imperativo ainda mais premente. 

Embora os obstáculos para o aumento da produtividade sejam quase universais, as soluções para cada país são específicas. São reflexo dos ativos herdados, do histórico industrial, da localização e da política local. Não existe (ainda) conhecimento científico no que se refere a que tipos de decisões precisam ser tomadas nas diferentes esferas governamentais ou sobre como coordenar as escolhas entre as diversas seções departamentais compartimentalizadas e seus orçamentos. (É por isso que essas questões são essenciais na agenda do Instituto da Produtividade recém-criado no Reino Unido). 

Não é surpresa para ninguém que a estagnação ou o baixo crescimento da produtividade sejam influenciados por fatores como a falta de investimento em ativos físicos e intangíveis, a falta de mão de obra qualificada, a infraestrutura inadequada, a má gestão e o fraco ambiente macroeconômico. A surpresa é a falta de atenção dedicada até agora a encontrar uma receita para enfrentar esses problemas em conjunto. Economistas e autoridades econômicas precisam começar a retificar isso sem demora. 

Diane Coyle é professora de políticas públicas na Universidade de Cambridge e autora de Markets, State, and People: Economics for Public Policy 

https://valor.globo.com/opiniao/coluna/a-chave-da-produtividade.ghtml

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