A batalha pelo metaverso está para começar

Muito antes de a internet ganhar a consciência popular, havia a Supervia da Informação. 

O nome tornou-se familiar no começo dos anos 90 para descrever a espinha dorsal digital que deveria se tornar um canal de comunicação, entretenimento e comércio. As gigantes da mídia e das telecomunicações da época sonhavam em controlar essa rede difusa. 

O que finalmente emergiu, na forma da internet, foi uma rede de redes muito mais aberta, que pavimentou o caminho para uma classe totalmente nova de intermediários on-line. 

Décadas depois, há quem acredite estar vendo um novo universo da informação brilhando no horizonte: o metaverso. Trata-se de um mundo de realidade virtual totalmente imersivo, um lugar onde as pessoas poderão buscar todos os aspectos da vida de forma indireta, como se estivessem em um universo digital paralelo. 

Assim como aconteceu com a Supervia da Informação, as visões iniciais do metaverso deverão ser uma aproximação imperfeita do que a realidade derradeira parecerá. A forma que ele assumirá e quais serão seus primeiros “aplicativos matadores” são apenas especulações. E o mais importante: ainda não está estabelecido quem vai definir as regras e colher os lucros – embora as atuais gigantes da internet estejam na “pole position”. 

Mark Zuckerberg certamente já fez sua aposta. No fim do mês passado o diretor- presidente do Facebook declarou que sua companhia um dia não será mais vista como uma rede social, e sim como uma “companhia do metaverso”. 

Dada a pressão política que o Facebook vem sofrendo, isso pode ser visto como uma tentativa de distração. Mas tentar moldar ideias do futuro como essa sempre foi uma forma importante para as companhias de tecnologia prepararem o mercado para o que elas planejam vender em seguida; e Zuckerberg está nisso há algum tempo. Lá se vão sete anos desde que ele comprou a companhia de realidade virtual Oculus. 

Zuckerberg poderá muito bem ter de esperar mais um tempo para obter retorno sobre esses investimentos. Para muitos, a ideia de conduzir algumas de suas mais importantes e pessoais interações sociais através de um avatar digital em um mundo virtual evoca um futuro de ficção científica remoto e particularmente não atraente. 

Mas depois que o isolamento social foi imposto sobre a maior parte da população mundial pela pandemia, a ideia da fuga para um espaço totalmente digital não parece mais tão estranha. Se os trabalhadores adotaram o Zoom tão facilmente, por que não se reunir em um escritório digital? 

E essa não é uma questão de tudo ou nada. Em vez de arrastar os usuários diretamente para um mundo de realidade virtual total, o metaverso poderá muito bem tomar forma mais gradualmente. Usar a realidade aumentada para projetar aspectos do metaverso sobre o mundo físico, por exemplo, é algo que o ajudaria a se moldar primeiro como uma sobreposição digital parcial. 

O produto final poderia ser um “jardim murado” definitivo, um lugar onde uma única companhia se beneficiaria da imersão total dos usuários. Se o Facebook e outras grandes empresas da internet construírem seus próprios jardins – e, especialmente, se cada uma delas vender seus próprios equipamentos para o consumidor acessar essas zonas -, o resultado poderá ser uma coleção de mundos isolados, o que forçaria os cidadãos digitais a escolher onde querem passar a maior parte do tempo. 

Por outro lado, o metaverso poderá compreender um conjunto de mundos mais intimamente interconectados, alguns dos quais controlados totalmente por seus usuários. Esse poderá ser um espaço no qual as pessoas levarão consigo seus dados pessoais, bens digitais e serviços favoritos, enquanto mudam de um lugar para outro. 

É tentador ver as gigantes da internet como as versões atuais das potências de telecomunicações e mídia do início dos anos 90, sonhando em moldar e controlar a próxima iteração do meio on-line. Nessa comparação, também é tentador ver a tecnologia de blockchain e as criptomoedas como as forças descentralizadoras da internet inicial. 

Os entusiastas das criptomoedas veem as pessoas controlando seus próprios cantos de um metaverso mais fragmentado, em vez de jogar todos os seus dados em algumas poucas grandes plataformas. 

Mesmo assim, limitar o poder das companhias de tecnologia dominantes não será fácil. Isso vai depender muito do resultado do atual esforço global por uma regulamentação mais eficiente. Vai depender também da possibilidade de as tecnologias que sustentam a revolução das criptomoedas dar origem a novas experiências e novos meios de interação não disponíveis hoje nos serviços on-line de massa. Ainda é difícil dizer exatamente quais serão essas experiências e esses novos meios de interação. 

Do jeito que as coisas estão, as atuais potências da internet estão numa boa posição para dominar um futuro metaverso. 

Se isso acontecer, então essas companhias acabarão com um poder muito maior de moldar a vida on-line de bilhões de pessoas do que aquele que elas já detêm atualmente. O que poderia dar errado?

https://valor.globo.com/empresas/noticia/2021/08/16/a-batalha-pelo-metaverso-esta-para-comecar.ghtml

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