Sanção deve elevar custo de crédito para a Rússia

As sanções impostas pelos EUA e pela União Europeia (UE) podem elevar o custo da tomada de empréstimos por Moscou e prenunciar controles mais rígidos que barrem totalmente aos investidores ocidentais o acesso ao mercado de papéis do país, disseram gestores de fundos. 

O presidente dos EUA, Joe Biden, anunciou na terça-feira uma proibição à participação no mercado secundário por quaisquer bônus russos emitidos após 1 de março, como parte de novas sanções após a Rússia reconhecer a independência de regiões separatistas no leste da Ucrânia. A UE fez o mesmo ontem, ao impor proibição própria à negociação de novos papéis russos. 

Os investidores americanos já estavam impedidos de conceder empréstimos diretos a Moscou. Uma proibição à compra de novos papéis russos em dólar está em vigor desde a anexação da Crimeia, em 2014, e Biden proibiu a participação no mercado primário – onde são vendidos os novos bônus – para títulos denominados em rublos no ano passado. A nova limitação, na prática, fecha uma brecha que permitia que os financiadores ocidentais bancassem indiretamente o Estado russo. 

“Isso fortalece as sanções anteriores”, disse Kaan Nazli, gestor de carteira de investimentos da Neuberger Berman. “Antes da noite de ontem, não se podia emprestar diretamente ao governo russo, mas, tecnicamente, as pessoas podiam simplesmente esperar até o segundo dia [após a emissão] e comprar bônus de um banco local que tinha feito a sua compra no mercado primário. Isso não era perda de financiamento para a Rússia.” 

O custo da tomada de empréstimos pela Rússia já subiu significativamente neste ano, na perspectiva da imposição de novas sanções, o que refletiu na queda significativa do preço dos papéis do país. 

O rendimento dos bônus de 10 anos em moeda local subiu para 10,9%, em relação aos 7% de setembro. Os rendimentos sobre os bônus em dólar também aumentaram. 

Embora isso seja problemático para alguns investidores, o governo da Rússia deverá enfrentar poucos obstáculos em gerir o país sem financiamento externo – pelo menos no curto prazo -, em vista da ampla receita gerada pelo petróleo, de suas reservas de mais de US$ 630 bilhões e do baixo nível de endividamento, dizem investidores. 

“Para a Rússia, [as sanções] não chegam a representar um problema”, disse Viktor Szabo, gerente de carteira da Abrdn. “Vão ampliar o custo de financiamento deles. Neste momento, não é obstáculo, mas, se os preços do petróleo voltarem a cair para US$ 20 o barril, a situação vai se tornar muito mais difícil.” 

Os bancos locais já aumentaram suas posições de bônus em rublos nos últimos anos. Os investidores estrangeiros detinham 20% do mercado no fim de 2021, em relação aos 35% de dois anos atrás, segundo dados do BC russo. Moscou pode tomar emprestado menos recurso dos mercados financeiros se necessário, por ter registrado um superávit público no ano passado. 

“Não é um fator que mude o jogo”, disse Nazli. “A Rússia não é um país como a Turquia ou a África do Sul, que depende intensamente dos mercados financeiros para se financiar.” 

Apesar da redução recente, os estrangeiros ainda detêm cerca de US$ 64 bilhões em dívidas soberanas russas, somando-se bônus em moeda local e em moeda externa, segundo Elina Ribakova, vice-economista-chefe do Instituto de Finanças Internacionais. 

Os bônus russos respondem por mais de 6% do atentamente monitorado índice de bônus dos mercados emergentes do J.P.Morgan de títulos em moeda local e por 3% da versão para papéis em moeda estrangeira. 

O J.P.Morgan disse a investidores que previa que os bônus russos recém-emitidos serão excluídos de seus índices, após a imposição das novas sanções, devido à sua inacessibilidade aos investidores ocidentais, segundo um gestor de fundo. 

Após as sanções reforçadas pelos EUA no ano passado, o banco disse que medidas que afetavam a “reprodutibilidade” de seus índices pelos investidores poderão resultar na exclusão de emissores sancionados do referencial. Se novos bônus forem eliminados, a participação da Rússia no índice cairá gradualmente com o passar do tempo, à medida que os bônus habilitados forem vencendo. 

Até agora, os EUA e a UE não chegaram a proibir integralmente negociação secundária dos títulos soberanos já emitidos. Mas alguns investidores se preparam para uma inciativa desse tipo no caso de a crise continuar a recrudescer. 

As sanções impostas aos bancos russos, porém, são considerados menos eficientes, uma vez que atingem instituições menores. Ao todo, seus ativos totalizam cerca de US$ 100 bilhões. 

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2022/02/24/sancao-deve-elevar-custo-de-credito-para-a-russia.ghtml

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