Recuperação global perde impulso

A economia mundial está se recuperando do drástico colapso sofrido no segundo trimestre do ano. Novos dados, no entanto, sugerem que ganhos iniciais decorrentes da suspensão dos confinamentos impostos pelo coronavírus já se esgotaram, o que reforça evidências de que a economia global poderá levar meses, se não anos, para se restabelecer totalmente. 

Novos números divulgados pelo Reino Unido fornecem elementos valiosos para se compreender o quadro da recuperação econômica em andamento. O país é um dos poucos a divulgar cifras mês a mês do crescimento da economia, o que oferece um retrato mais atualizado do que o oferecido por números trimestrais do PIB. 

A economia britânica cresceu 6,6% em julho, em comparação com junho, quando sua expansão foi de 8,7%. Isso coloca o Reino Unido em condições de registrar um crescimento econômico de 15% no terceiro trimestre, após a queda de 20,4% no segundo. 

No entanto, a produção do país permaneceu 11,7% inferior ao que era em fevereiro, último mês antes de a pandemia começar a desestabilizar a economia. A atividade do setor de serviços, que depende mais de contato pessoal, recuou 12,6% em relação a fevereiro, enquanto a industrial diminuiu 7%. 

Os números fortalecem a opinião de muitos economistas de que uma volta da produção aos níveis pré-coronavírus será dolorosamente lenta na maior parte do mundo desenvolvido, com a pandemia ainda restringindo de viagens a programas de entretenimento e trabalho nos escritórios. 

Dados econômicos com bom histórico em antecipar o crescimento futuro indicam que um sólido crescimento no terceiro trimestre deverá ser seguido por uma expansão mais modesta, enquanto empresas, trabalhadores e governos se adaptam ao que poderá ser um longo período de incerteza sobre a evolução da pandemia e a disponibilidade de uma vacina. 

“Desde que as maiores economias não precisem entrar em confinamento generalizado, a economia deverá continuar a melhorar, mas ela não conseguirá sustentar a recuperação espetacular observada com a reabertura de empresas alguns meses atrás”, disse Gilles Moëc, economista da seguradora Axa. “A parte difícil começa agora.” 

Economistas não preveem que a economia britânica volte à sua magnitude pré-pandemia antes de 2022. O Reino Unido sofreu a queda do PIB mais grave entre os países desenvolvidos durante o segundo trimestre. Mas a sequência mês a mês de declínio e recuperação foi, de modo geral, semelhante em outros países, inclusive nos Estados Unidos. 

O Federal Reserve (Fed, o BC dos EUA) de Atlanta estima que a economia americana está em condições de registrar uma expansão de 7% no terceiro trimestre, após a contração de 9,1% no período de três meses até junho. Economistas preveem que os EUA terão crescimento de apenas 1,25% no quarto trimestre e que se recuperará ao nível pré-pandemia somente no começo de 2022. 

A economia mundial contraiu-se pelo segundo trimestre consecutivo nos três meses até junho, inclusive, com o forte impacto no nível de atividade causado pelos confinamentos generalizados e os esforços individuais para evitar infecção. 

No grupo das vinte maiores economias do mundo (G20), a queda de 3,4% da produção contabilizada nos três primeiros meses do ano já foi a maior desde o início da série histórica, em 1998, mas a retração do segundo trimestre foi sem precedentes, desde o fim da Segunda Guerra Mundial. 

Mas os pontos de inflexão do nível de atividade durante a pandemia mostraram ser questão de meses, não de trimestres. Com exceção da China, as quedas se concentraram em março e abril, com recuperações tendo começado em muitos países em maio e se fortalecendo significativamente em junho e em julho, com a suspensão das quarentenas e flexibilização das restrições. 

Segundo dados divulgados na semana passada, a economia da Noruega – que encolheu menos drasticamente que as de alguns vizinhos europeus no segundo trimestre – cresceu 1,1% em julho, ritmo mais lento que a taxa de expansão de junho. O nível de atividade de julho ficou apenas 4,7% abaixo do nível de fevereiro. 

Na semana passada, Philip Lane, economista-chefe do Banco Central Europeu (BCE), se mostrou cauteloso ao falar da hesitante recuperação econômica e da baixa taxa de inflação europeias, deixando aberto o caminho para uma nova explosão de estímulos nos próximos meses. 

Sondagens entre empresas indicam que a recuperação continuou pelo quinto mês seguido em agosto. Uma medida fundamental do nível de atividade econômica em 45 países reunida pela empresa IHS Markit, a pedido do J.P. Morgan e baseada em respostas de gerentes de compras, alcançou alta recorde dos últimos sete meses. 

Mas há sinais de fragilidade, à medida que novos surtos do vírus desencadearam novas restrições e cuidados adicionais entre consumidores, com quedas no nível de atividade registradas no Japão, Índia, Austrália, Cazaquistão, Espanha e Itália. Juntos, esses países respondem por 15% do PIB mundial. 

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2020/09/14/recuperacao-global-perde-impulso.ghtml

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