Reabertura será um teste ao consumo global

Durante boa parte da pandemia, consumidores confinados em suas casas no Ocidente compraram todo tipo de mercadoria, desde computadores pessoais a esteiras elétricas. Agora, à medida que a vacinação se consolida, muitas pessoas começam a gastar em serviços de contato pessoal – cortes de cabelo, jantares fora, eventos de música ao vivo -, que ficaram fora de cogitação por tanto tempo. 

A volta dos consumidores ao mundo dos serviços está no centro de um caloroso debate entre empresas, economistas e autoridades. Eles precisam discernir se os novos gastos dos consumidores em serviços, em particular, em viagens, entretenimento e cuidados pessoais, virão à custa dos gastos em bens. A resposta tem grandes implicações, em especial, para a inflação. 

Em recente pesquisa, líderes empresariais na zona do euro disseram ao Banco Central Europeu (BCE) que parte do dinheiro deverá deixar de ser gasta em bens de consumo, uma mudança que pode tirar pressão das fábricas pelo mundo que encontram dificuldade em atender a demanda. Essa demanda criou gargalos nas cadeias de produção, disputas por matérias-primas e longos atrasos nas remessas – pressões que provocaram fortes altas nos preços.

Mas outros consideram improvável que um aumento nos gastos em serviços decorrente da reabertura das economias acabe com esses gargalos. Acreditam que os consumidores acumularam tanta poupança que poderão gastar tanto em bens quanto em serviços. 

“Penso que, claramente no curto prazo, a maioria das famílias, não todas, mas muitas, não enfrentará limitações nos gastos”, disse Jaana Remes, do McKinsey Global Institute. “Então, o fato de que eles começarão a ter capacidade de gastar mais em serviços não significará necessariamente que não terão poder de compra para continuar gastando em mercadorias.” 

Dados sobre os gastos em abril em lojas nos EUA respaldam sua avaliação. Mesmo com a retomada de uma série de serviços, as vendas no varejo ficaram inalteradas em relação a março, quando houve alta de 10,7% e cujo patamar foi superior ao anterior à pandemia. 

A covid-19 virou de ponta-cabeça os padrões normais de consumo. Normalmente, recessões envolvem um declínio nas compras de bens duráveis, porque os consumidores adiam esses gastos até que vejam uma melhora na economia, e gastam mais em necessidades imediatas, como alimentos. 

Mas durante a pandemia da covid-19 as pessoas gastaram, e muito, em produtos duráveis, como móveis, eletrodomésticos e equipamentos de ginástica para suas casas. 

Enquanto isso, serviços – como corte de cabelo – que normalmente se mantém fortes durantes recessões foram deixados de lado ou adiados. 

Em tempos normais, uma alta nos gastos em serviços implicaria m menos nos gastos em outros setores. Mas o acúmulo de poupança muda esse cálculo. Mundialmente, essa poupança acumulada é grande. A Oxford Economics estima o total em US$ 4,7 trilhões. Há muita variação entre os países onde a poupança cresceu, desde a equivalentes 12% da produção econômica anual nos EUA a algo em torno a 1% na Dinamarca. 

A distribuição dessa poupança também é desigual entre os consumidores. Em geral, os mais ricos e os idosos acumularam mais poupança durante a pandemia do que os mais jovens e os mais pobres. 

Os consumidores deixaram de comprar muitas outras coisas durante seu confinamento, como roupas, e é provável que, enfim, renovem seus guarda-roupas quando voltarem a trabalhar e a frequentar espaços sociais. Portanto, as compras de mercadorias provavelmente deverão se manter. 

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2021/05/24/reabertura-sera-um-teste-ao-consumo-global.ghtml

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