Navio de carga deixa Ucrânia e desafia bloqueio russo

Um navio de carga partiu de Odessa, principal porto da Ucrânia, pela primeira vez desde que Vladimir Putin deixou o pacto que permitia o escoamento da produção de grãos do país pelo mar Negro.

O desafio é um teste da rota marítima proposta por Kiev aos navios que estavam em seus portos quando a Rússia suspendeu a participação no arranjo que garantia a segurança do trânsito na região, há um mês, em meio à Guerra da Ucrânia.

Desde então, Moscou passou a bombardear portos ucranianos, como fez na madrugada desta quarta, com um ataque de drones kamikaze contra Izmail, instalação no rio Danúbio a meros 200 metros da Romênia, integrante da Otan, a aliança militar ocidental, e da União Europeia. Um depósito de grãos foi destruído.

Além disso, forças russas passaram a patrulhar áreas ao sul do mar, longe da base naval em Sebastopol, na Crimeia anexada. No domingo (13), um barco de Moscou disparou tiros de advertência e abordou um cargueiro neutro, com bandeira de Palau, que rumava ao Danúbio. Após inspeção, o navio foi liberado.

Na mão inversa, a Ucrânia passou a empregar sua armada de drones aquáticos. Atingiu um navio de guerra e um petroleiro russos na semana passada e ameaça fazer um bloqueio assimétrico dos seis portos de Moscou no mar Negro a partir do dia 23. Ao mesmo tempo, anunciou a criação de um corredor marítimo, embora não tenha Marinha operante para proteger os navios que saem de seus portos.

Também nesta quarta, o Serviço de Segurança da Ucrânia divulgou pela primeira vez imagens claras de seus novos drones aquáticos, apelidados de Sea Baby (bebê do mar, em inglês). Segundo o órgão, eles podem levar até 850 kg de explosivos, mais do que o dobro do estimado anteriormente.

O Joseph Schulte, embarcação de bandeira de Hong Kong de propriedade teuto-chinesa, deixou Odessa às 8h13 desta quarta (2h13 em Brasília) e tem previsão de chegada ao porto turco de Ambarli, em Istambul, às 10h (4h em Brasília) desta quinta (17), de acordo com o site de monitoramento marítimo Marine Traffic.

Ele chegou à altura da Romênia sem incidentes. O navio leva, segundo o canal estatal ucraniano Suspilne, 30 mil toneladas de carga, inclusive grãos. Não foi divulgado o que mais ele transporta. A embarcação estava retida em Odessa desde o começo da guerra, em fevereiro de 2022.

A interrupção da exportação de grãos devido ao fim do acordo celebrado com mediação da ONU e da Turquia em julho de 2022 abriu uma nova frente na guerra, já que desde o afundamento do cruzador russo Moskva, em abril do ano passado, não havia movimentação militar tão relevante na área. Além disso, ameaça deixar o preço de produtos como o trigo até 20% mais caros neste ano, segundo o FMI.

Putin já disse que retomaria o acordo caso os países ocidentais cumprissem a promessa de facilitar a exportação de sua produção agrícola, que teve de driblar sanções que tiraram frotas de navios à sua disposição porque seguradoras deixaram de cobrir suas operações para não serem punidas.

A Turquia afirma que a posição russa é correta e tem de ser ouvida pelo Ocidente, mas até aqui não conseguiu avançar em um novo arranjo. Os ataques de Moscou contra portos também complicam a equação, que na prática ajuda a asfixiar a combalida economia da Ucrânia, cujo Produto Interno Bruto desabou cerca de 30% no primeiro ano da invasão russa.

A Rússia, por sua vez, teme que ataques no mar Negro afetem sua exportação de petróleo. Apenas pelo porto de Novorrosisk passam anualmente 2% da produção mundial do produto. A economia russa depende dessas receitas, que vêm caindo com a desaceleração chinesa, e a depreciação do rublo obrigou o Banco Central do país a subir a taxa de juros de 8,5% para 12% na terça-feira (15).

KIEV TOMA VILA, MAS RÚSSIA AVANÇA

Enquanto isso, a guerra segue em uma de suas fases mais dinâmicas em termos de atividade militar. A contraofensiva de Kiev, iniciada em junho e alvo de desconfiança entre os aliados ocidentais, avançou um pouco na frente sul de Donetsk, no leste. A vila de Urojaine foi tomada, segundo o Ministério da Defesa.

É uma localidade com mil habitantes, mas a vitória foi celebrada dada a escassez de boas notícias recentes para os ucranianos. Mesmo essa não durou muito. Segundo um dos principais generais do país, os russos fizeram novos ganhos no nordeste do país e parecem posicionados para retomar Kupiansk, uma importante junção ferroviária na região de Kharkiv.

A cidade foi tomada por Moscou no começo da guerra e retomada por Kiev em setembro, em uma contraofensiva surpresa. “Devido à complicação da situação na direção de Kupiansk, eu trabalhei quase todo o dia com unidades que lideram as defesas”, afirmou Oleksandr Sirskii. Todos os civis já foram retirados da região na semana passada.

Na terça, o chefe de gabinete do secretário-geral da Otan sugeriu que o país deveria ceder território à Rússia em troca da entrada na aliança, sendo criticado duramente em Kiev. Nesta quarta, pediu desculpas, mas não se retratou. “Minha fala era sobre uma discussão maior acerca de possíveis futuros cenários na Ucrânia, e eu não deveria ter dito daquele jeito. Foi um erro”, afirmou o norueguês Stian Jenssen.

No campo assimétrico da guerra, mais drones foram enviados contra território russo pela Ucrânia nesta segunda. Segundo a Rússia, três deles foram abatidos na região de Kaluga, e outro, sobre a Crimeia. Não houve vítimas ou danos relatados.

https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2023/08/navio-carregado-de-graos-deixa-ucrania-e-desafia-bloqueio-russo.shtml

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