Indústria do aço na Europa avança em tecnologias de descarbonização

Produtoras de aço e mineradoras de ferro tiveram resultados financeiros, de forma geral, muito satisfatórios no quarto trimestre, e no ano, o que seria impensável no início da pandemia. Discute-se, inclusive, se estaríamos no início de um novo ciclo de commodities. Uma pergunta é se as siderúrgicas, em especial as europeias, estariam aptas para um novo cenário dessa indústria, o de investir cada vez mais na produção de “aço verde”. 

Tomando por base um relatório da consultoria McKinsey – “The future of the European steel”, o professor titular da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e especialista desse indústria, Germano Mendes de Paula, levanta muitos os desafios para a siderurgia europeia, que está mais avançada nesse processo. “É muito pertinente ao se concentrar em questões estruturais do setor. E aponta três desafios relevantes”, disse ao Valor. 

O estudo destaca a redução da demanda anual do patamar de 188 milhões de toneladas (2004 a 2008), para 153 milhões de toneladas (2011-2019). E, decorrência da covid-19, a ociosidade nas usinas subiu a 35% em 2020, devendo retornar a 25%-30% a médio prazo, mas ainda abaixo do nível recomendável de 15%. 

Segundo ponto: os riscos que impostos incidentes sobre a emissão de dióxido de carbono (CO2) aumentem, tornando a indústria menos competitiva. “Aliás, a União Europeia, que tradicionalmente era exportadora líquida de aço, passou para a condição de importadora líquida a partir de 2016”. Por último, o estudo ressalta que a descarbonização da siderurgia, a médio e longo prazos, exigirá significativos investimentos. 

A região enfrentou retração do consumo de aço – de 381 quilos per capita (2004- 2008) para 299 quilos (2011-2019). Estes números, diz, tornam ainda mais evidente a mudança estrutural, com o esgotamento de algumas possibilidades de negócios, decorrentes de uma infraestrutura já montada e do decréscimo da população. 44% da redução estrutural da demanda foi decorrente da construção, que vem liderando o crescimento do consumo nos países emergentes. 

Mendes de Paula observa que se chegou a apontar, durante o boom do início dos anos 2000, que a infraestrutura sem necessidade gerou um consumo além do normal. Ao mesmo tempo, no setor habitacional, a população empobreceu e não teve condições de comprar a casa própria. Porém, observa, a redução estrutural de consumo não é uma peculiaridade da Europa, sendo verificada em outros países de economia madura, como o Japão. 

Para a McKinsey, informa, a necessidade de lidar com excesso de capacidade instalada e os crescentes custos ambientais são mais intensivos na Europa, comparativamente a outras regiões. 

Segundo o professor da UFU, “vale recordar que vigora um sistema “cap and trade” na União Europeia. Com gradual redução das alocações de direitos de emissão [de CO2], somada à inclusão de outros setores no referido sistema, além das regras cada vez mais apertadas, o valor dos direitos no mercado está aumentando significativamente”. A McKinsey diz que o custo relacionado à emissão no setor europeu subiu de menos de €5 a tonelada em 2016-2017 para cerca de €28, em julho de 2020. 

A consultoria projeta que os custos podem alcançar €100 a tonelada em 2030 devido aos planos de descarbonização da União Europeia. “Aliás, estima-se eles estejam entre €70 e €78 para cada tonelada de bobina laminada a quente”, afirma Mendes de Paula. 

As pressões para a descarbonização das usinas acentuaram-se a partir do ano passado. E avalia-se que os investimentos para fazer esta transformação tecnológica são considerável. O problema é como o setor na Europa conciliará tais investimentos com um desempenho econômico-financeiro desfavorável (frente a outras atividades econômicas na região) e com baixa competitividade de custos (ante concorrentes globais). Mas, devido às metas de redução de emissões, as siderúrgicas locais reagiram e estão na vanguarda de investimentos com objetivo de descarbonização. 

O problema, ressalta, é o timing e o funding. Em parte, o funding está sendo resolvido porque a siderurgia fará parte do “Green Deal”. A ideia é investir €1 trilhão em tecnologias de transição nos próximos dez anos, considerando vários setores. Outro desafio é a transição energética – para o Green Hydrogen – para apoiar essas novas tecnologias que hoje parecem despontar como o melhor caminho. 

Para o especialista, a chave será o interesse da União Europeia em dar suporte ao setor para fazer a transição energética e se tornar mais limpo enquanto ainda viável economicamente. “A própria UE aprendeu na crise da covid-19 que não é inteligente perder as cadeias de produção, principalmente da indústria de base”. 

https://valor.globo.com/empresas/noticia/2021/03/10/industria-do-aco-na-europa-avanca-em-tecnologias-de-descarbonizacao.ghtml

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