Hackers ameaçam a energia dos EUA

Quando a Opep barrou as exportações de petróleo para os Estados Unidos, em 1973, criando longas filas nos postos de gasolina do país, o presidente Richard Nixon jurou se empenhar em um esforço que combinaria o espírito do programa espacial Apollo com a determinação do Projeto Manhattan. “Até o fim desta década, teremos desenvolvido o potencial de atender às nossas próprias necessidades energéticas sem depender de nenhuma fonte exterior”, afirmou em um discurso televisionado.

Sua noção de tempo estava fora de sintonia – isso levou mais de 40 anos –, mas o país se aproximou bastante da independência energética nos anos recentes, graças a um aumento na produção de petróleo de xisto, gás natural, energia solar e eólica.

Essa independência, porém, é frágil. Há mais ou menos 10 dias, carros fizeram fila em postos de gasolina em grande parte do sudeste americano, após a Colonial Pipeline ser paralisada por um ciberataque de um grupo criminoso que exigia dinheiro para liberar o fluxo no oleoduto. A rede de distribuição de energia elétrica também está enfrentando mais problemas por causa das mudanças climáticas. No ano passado, uma onda de calor na Califórnia e uma onda de clima congelante no Texas forçaram amplos blecautes, enquanto a demanda por eletricidade superava a oferta.

“Oito presidentes desejaram independência energética, e agora que conseguimos isso, temos maior resiliência em relação às oscilações do mercado global de petróleo”, afirmou Daniel Yergin, historiador especializado em energia e autor do livro The New Map: Energy, Climate and the Clash of Nations (O novo mapa: energia, clima e o conflito entre países). “Mas a resiliência ainda é problemática em relação à maneira que o sistema opera sob pressão, tratando-se tanto de oleodutos quanto de energia elétrica.”

A paralisação da Colonial Pipeline não teve nada a ver com instabilidades no Oriente Médio ou deficiências na produção de petróleo dentro dos EUA. Ainda assim, em um movimento jamais visto em décadas, consumidores em pânico compraram tanto combustível que causaram escassez, e o preço da gasolina comum na bomba chegou a aumentar em até US$ 0,20 por galão (3,8 litros) em alguns Estados em poucos dias, de acordo com a Associação Americana de Automóveis (AAA).

A Colonial Pipeline, uma empresa privada, retomou totalmente as operações, mas ainda levará algum tempo até que muitos postos de gasolina sejam reabastecidos. 

Empresas de energia sofrerão cada vez mais pressão de governos e investidores para reforçar suas defesas contra ciberataques, mas essas e outras vulnerabilidades não serão superadas com facilidade, especialmente após anos de baixo investimento.

Eletricidade

Nos casos das redes de eletricidade da Califórnia e do Texas, há pouca saída em relação às vulnerabilidades reveladas pela onda de calor e as baixas temperaturas, que custaram bilhões de dólares a esses Estados, mataram várias pessoas e deixaram milhares de desabrigados. O fato de os dois mais populosos Estados do país terem ficado incapacitados sugere que as usinas e linhas de transmissão de eletricidade não estão preparadas para eventos climáticos extremos, que, segundo especialistas, ficarão cada vez mais frequentes.

Por todo o país, cortes de fornecimento de eletricidade causados pelo clima se elevaram em dois terços desde 2000, de acordo com o Departamento de Energia. “Nossas estratégias tradicionais de produção e fornecimento de energia estão sob a ameaça do clima e de ciberterroristas”, afirmou Mark Brownstein, vice-presidente sênior do Fundo de Defesa Ambiental.

Renovar e atualizar o sistema de energia não será fácil. Um financiamento considerável precisará ser feito por empresas e governo, assim como pesquisa para se manter à frente dos cibercriminosos. O plano de investimento em infraestrutura de US$ 2 trilhões do presidente Joe Biden destina US$ 100 bilhões à rede de distribuição de energia.

Ao longo dos 15 anos mais recentes, aproximadamente, a produção de petróleo e gás dos EUA manteve os preços da energia baixos domesticamente e no exterior, favorecendo a economia global. Exportações de energia possibilitaram a Washington competir com os envios russos de gás à Europa, ajudam aliados como o Japão, que importa muita energia, e bloqueiam envios de petróleo iraniano e venezuelano.

Os grupos criminosos representam uma ameaça para outras indústrias, além do setor de energia. Especialistas, porém, afirmam que o setor de energia causa preocupação particularmente porque é essencial para o funcionamento da economia. Esse perigo não é menos complexo do que reduzir a dependência dos EUA do petróleo estrangeiro, afirmou Bill Richardson, ex-secretário de Energia. “É uma nova ameaça para a qual não estamos preparados”, afirmou

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