Europa quer ampliar uso do euro como moeda de reserva

O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, prometeu transformar o euro numa moeda de reserva global capaz de competir com o dólar, como parte do esforço da União Europeia (UE) para reduzir a sua dependência financeira dos EUA.
No seu discurso sobre “o Estado da União” no Parlamento Europeu ontem, em Estrasburgo, o presidente da Comissão (órgão executivo da União Europeia) disse que é “uma aberração” que a UE pague mais de 80% de suas importações do setor de energia em dólares, embora só 2% venham dos EUA. A maioria das importações em dólar vem da Rússia e dos países do Golfo Pérsico.
“Temos de mudar isso. O euro precisa se tornar o instrumento ativo de uma nova Europa soberana”, afirmou Juncker, cujo mandato à frente da Comissão termina no ano que vem. Ele também pediu aos países-membros da UE que resolvam as diferenças que têm afetado a capacidade da UE de exercer sua influência coletiva no cenário internacional.
“É hora de pôr um fim a esse triste espetáculo de uma Europa dividida”, disse Juncker. “Nosso continente merece algo melhor.”
Um alto funcionário da UE afirmou que uma das iniciativas da Comissão deve ser encorajar o Banco Central Europeu (BCE) a promover o uso do euro.
A mudança é um reflexo das preocupações da Europa com a forma como o presidente dos EUA, Donald Trump, tem agido para usar o dólar como uma arma, um instrumento de política externa para punir os rivais americanos. A Casa Branca já ameaçou excluir empresas europeias do sistema financeiro americano por descumprirem as novas e mais duras sanções contra o Irã.
Alguns diplomatas europeus consideram a ruptura do acordo nuclear de 2015 com o Irã – que os EUA abandonaram, mas que os europeus querem preservar – como uma “lição salutar” sobre a predominância do dólar.
A UE disse neste ano que passaria a usar euros em vez de dólares para pagar as importações de petróleo iranianas. No mês passado, o ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Heiko Maas, propôs que a Europa monte um sistema internacional de pagamentos paralelo, para preservar o acordo nuclear com Teerã.
Pode ser difícil promover o euro numa economia global dominada pelo dólar. O BCE tem sustentado que é “neutro” na questão do papel internacional do euro como moeda de reserva.
Mas diplomatas europeus avaliam que o fato de o Banco da Inglaterra (banco central britânico) ter elevado a parcela em euros de suas reservas estrangeiras para um nível recorde é um sinal da crescente confiança dos investidores globais na moeda única. “O euro não pode mais ser neutro”, acrescentou o alto funcionário da UE.
A ofensiva de Juncker com relação ao euro é parte de um esforço mais amplo para levar os governos da UE a enfrentarem a comunidade internacional como um bloco único. Ele adverte que a exigência atual de unanimidade para a tomada de decisões de política externa tem minado a credibilidade da Europa.
“Não está certo que a UE tenha mantido silêncio no Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) quando se discutiu a condenação dos abusos cometidos pela China. E isso ocorreu porque não houve concordância de todos os países-membros [da UE]”, disse Juncker.
No entanto, os governos europeus já se opuseram a propostas anteriores de centralizar a tomada de decisões em relação a política externa e, nos últimos anos, têm estado fundamentalmente divididos em relação a questões centrais, sobre como lidar com a Rússia e com as sanções internacionais à Venezuela.
Ao definir a agenda de Bruxelas para os próximos meses, Juncker também propôs novos poderes à Autoridade Bancária Europeia, numa reação à série de escândalos de lavagem de dinheiro que têm reduzido a confiança na supervisão do bloco sobre os seus próprios bancos.
O discurso marcou uma das últimas grandes oportunidades de Juncker para tentar conduzir a agenda da UE antes das eleições para o Parlamento Europeu do ano que vem, que devem se concentrar em questões como migração e política econômica, que alimentaram disputas amargas entre os governos do bloco.
Num sinal dos obstáculos que o chamado à unidade de Juncker enfrenta, seu discurso ocorreu no mesmo dia em que o Parlamento aprovou o início de um procedimento disciplinar contra o governo da Hungria, sob acusação de violar o quadro legal europeu.
“Daqui até as eleições europeias, devemos mostrar que a Europa é capaz de superar diferenças entre norte e sul, leste e oeste”, disse Juncker.

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