Washington Post; Após um congresso legislativo em que cimentou sua visão de governo sobre a China, Xi Jinping passa a dedicar-se à maneira como pretende criar uma ordem mundial melhor. Essa ordem teria como base respeito mútuo, tolerância e equidade — e a China seria sua líder natural, disse ele a chefes de partidos políticos de uma série de países, incluindo Rússia, África do Sul, Nicarágua e Timor Leste.
“O estilo chinês de modernização não segue o caminho antigo da exploração colonial ou da hegemonia de países fortes”, disse-lhes Xi em uma videochamada, na quarta-feira, sentado a uma mesa entre bandeiras do Partido Comunista Chinês.
“O mundo não precisa de outra Guerra Fria”, afirmou ele, anunciando seu novo conceito — a “iniciativa civilização global”, um conjunto de princípios norteadores para um “novo tipo de relações internacionais” que a China está construindo.
Os comentários de Xi foram um claro sermão aos Estados Unidos — e reflexo de um tom mais duro que ele adota conforme intensifica os esforços diplomáticos da China com uma visita à Rússia na agenda.
O presidente Vladimir Putin afirmou em dezembro que tinha convidado Xi para uma visita de Estado na primavera (Hemisfério Norte). Essa viagem poderá acontecer na próxima semana, segundo noticiou a agência Reuters na segunda-feira.
Questionado na terça-feira a respeito de Xi estar ou não planejando visitar a Rússia, o porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da China, Wang Wenbin, respondeu que não tinha informação que pudesse compartilhar “neste momento”. “China e Rússia têm mantido comunicações próximas em todos os níveis”, afirmou ele.
Xi deverá conversar pelo telefone com o presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, depois dessa viagem, de acordo com o Wall Street Journal. Seria seu primeiro diálogo direto desde que a guerra começou.
Mediador
Isso ocorre após a China intermediar um acordo para a retomada de relações diplomáticas entre dois antigo rivais, Arábia Saudita e Irã, depois de uma série de reuniões secretas em Pequim, um anúncio que surpreendeu o governo americano. Na segunda-feira, o presidente Joe Biden disse que espera conversar com Xi no futuro próximo.
A imagem da China como intermediadora da paz e árbitra internacional dá a Xi um novo impulso. Recém-confirmado em seu terceiro mandato sem precedentes, ele tenta afrontar o que percebe como um esforço americano em conter Pequim propondo um sistema global que atenda aos interesses chineses. Sob a liderança da China, afirma ele, os países não precisariam escolher lados em uma batalha entre autocracia e democracia.
“A China percebe que precisa criar algo novo, um espaço novo para o país que redefina seu papel no mundo e, com alguma esperança, redefina o sistema mundial”, afirmou Yun Sun, diretora do programa para China do Centro Stimson, em Washington, DC.
Conforme os governos dos EUA e de outros países ocidentais criticam a China em relação à sua parceria “sem limites” com a Rússia e suas seguidas ameaças contra Taiwan, Pequim tem tentado argumentar que está do lado da paz, que são os EUA e seus aliados que estão desestabilizando a Europa e o Indo-Pacífico.
Sua mais recente iniciativa e projeção são elementos cruciais desse movimento.
“A China tenta sinalizar que o mundo não depende dos EUA e seus aliados e parceiros”, afirmou Chong Ja Ian, professor-associado de ciência política da Universidade Nacional de Cingapura. “A China está tentando ser uma jogadora global em todos os espectros e demonstra que é capaz também de fornecer bens públicos.”
Depois de uma reforma no governo e uma reformulação na liderança que o garantiu ainda mais controle sobre a tomada de decisões, Xi está em uma posição mais forte para perseguir seu objetivo de uma ordem internacional mais amigável à China.
Acusação direta
Na semana passada, ele tomou a atitude incomum de acusar os EUA diretamente de tentar “conter, cercar e suprimir” a China (no passado, líderes chineses tenderam a se referir obliquamente a “certos países”).
A visão de Xi encapsula-se em uma política vaga, que ele anunciou em abril, chamada “conceito de segurança global”. Citada repetidamente por diplomatas chineses, ela inclui princípios como “segurança indivisível” — a ideia de que a segurança de um país não pode ocorrer sob o custo da segurança de outro, argumento que Moscou usou para justificar sua invasão à Ucrânia.