China tenta conter fuga de empresas do país

A China está numa corrida para manter empresas estrangeiras no país, oferecendo benefícios especiais para que as vantagens de ficar compensem as pesadas tarifas impostas pelos EUA.
Decorrido um ano da guerra comercial com os EUA, mais de 50 empresas globais, como a Apple e a Nintendo, anunciaram ou consideram a possibilidade de transferir a produção para fora da China, segundo uma pesquisa do Nikkei.
E a situação não afeta só empresas estrangeiras. Fabricantes chinesas, além de americanas, japonesas e taiwanesas também participam desse movimento de saída, incluindo companhias de computadores pessoais, smartphones e outros produtos eletrônicos.
“Precisamos de medidas permanentes para evitar o risco das tarifas e podermos participar das licitações nos EUA”, diz Kiyofumi Kakudo, presidente-executivo da fabricante de PCs Dynabook. A unidade da Sharp está avaliando um plano para realocar a produção de notebooks vendidos nos EUA para uma nova fábrica em construção no Vietnã. Esses PCs respondem por 10% da produção na China.
A Dynabook fabrica quase todos os seus notebooks na China. “Embora a quarta rodada de tarifas dos EUA tenha sido temporariamente engavetada, não podemos dizer o que vai acontecer, nem quando”, diz Kakudo.
A Apple pediu a grandes fornecedores que considerem transferir de 15% a 30% da produção do iPhone para fora da China. A empresa está para iniciar testes de produção de seus fones sem fio AirPods no Vietnã. Testes assim costumam preceder produção em massa.
As fabricantes americanas de PCs HP e Dell estão cogitando transferir até 30% da produção de seis notebooks da China para o Sudeste da Ásia e outros países. A Nintendo, do Japão, também vai mudar uma parte da produção de seu sistema de jogos Nintendo Switch da China para o Vietnã.
Há um temor de que essas transferências possam afetar os níveis de emprego e consumo na China. Para minimizar o golpe, Pequim está estendendo o tapete vermelho às empresas estrangeiras.
A Tesla está à frente desse esforço do governo. A empresa está transferindo equipamentos para sua nova fábrica perto de Xangai, que começou a ser construída há apenas um ano. E está contratando trabalhadores para colocar suas linhas em operação já em agosto.
Acredita-se que a fabricante americana de carros elétricos conseguiu o terreno da fábrica com um desconto do governo local e provavelmente também recebeu empréstimos a custo baixo.
Desde 2018, quando as tensões comerciais com os EUA se intensificaram, a China vem gradualmente se abrindo para as empresas internacionais. O investimento estrangeiro direto no país cresceu 3,5% no primeiro semestre, para US$ 70,7 bilhões, sobre igual período do ano passado, segundo o Ministério do Comércio chinês.
No fim de junho, Pequim anunciou que iria amenizar as restrições a investimentos externos em cinco áreas, incluindo de gás e petróleo. As autoridades também preparam a abertura do setor financeiro.
Não está claro, porém, se essas medidas serão suficientes para compensar o impacto da guerra comercial com os EUA.
Na principal fábrica da UE Furniture, a 200 km de Xangai, operários começam a deixar o prédio às 16h30. “Não estamos mais fazendo horas extras por causa das tarifas”, diz um funcionário. A empresa decidiu abrir unidades no Vietnã para evitar as tarifas americanas. Até agora não parece ter demitido, mas muitos estão ganhando menos por trabalhar menos.
A preocupação com a situação cresce entre os líderes políticos. O Conselho Estatal da China decidiu em maio criar um grupo para traçar medidas de emprego e intensificar programas der treinamento.
A disputa comercial começa a aparecer nos fluxos de produtos e capital. Nos primeiros cinco meses do ano, as exportações da China para os EUA caíram 12% em relação ao mesmo período do ano passado, em valor, enquanto as exportações da Índia, Vietnã e Taiwan tiveram alta de dois dígitos.
Muitas empresas alarmadas com a possibilidade de um conflito comercial longo, tentam se proteger. Enquanto procuram locais alternativos para fabricar produtos para os EUA, muitas mantêm fábricas operando na China, voltadas para o mercado interno. Assim, muitos fabricantes serão forçados a estabelecer cadeias duplas: uma para a China e uma para os outros mercados, aumentando seus custos e afetando os lucros.
“A possibilidade de o mercado mundial se dividir em China e não-China está aumentando”, diz Yuji Miura, economista do Japan Research Institute. A separação dos laços econômicos entre EUA e China e a divisão da economia mundial em dois blocos hostis é uma possibilidade real.
Além de custos maiores, as empresas deverão enfrentar excesso de capacidade de produção numa economia global dividida. Desde julho, o governo dos EUA já impôs três rodadas de tarifas sobre as importações chinesas, cobrindo US$ 250 bilhões em produtos. A quarta rodada, cobrindo os demais produtos, está suspensa, mas as empresas se preparam para o pior.

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