Há muitas maneiras de defender uma moeda. Este mês, a Ayam Geprek Juara, cadeia de restaurantes indonésia que serve frango frito, ofereceu refeições gratuitas aos clientes que comprovassem ter trocado dólares por rupias no dia. O restaurante forneceu mais de 80 refeições para os “guerreiros da rupia”, segundo a Reuters.
O restaurante deveria ampliar a oferta para os funcionários do Banco da Indonésia, o banco central do país, que está a 20 minutos de uma das filiais da casa. Para defender a rupia, o banco central indonésio esta vendendo bilhões de dólares da sua reserva em divisas estrangeiras, que caíram de US$ 125 bilhões em janeiro para US$ 112 bilhões em agosto. E apesar dessas vendas e quatro elevações de juros desde maio, a rupia perdeu quase 10% do seu valor frente ao dólar este ano, retornando aos níveis observados durante a crise financeira na Ásia de 1997/1998.
Na Índia, a rupia indiana teve um desempenho ainda pior, registrando uma desvalorização recorde frente ao dólar. Mesmo onde as moedas permaneceram firmes, as bolsas despencaram. O índice Hang Seng de Hong Kong caiu 20% de janeiro a 12 de setembro.
Na China, os mercados financeiros vêm se debatendo. Uma pessoa que retornou de Marte imaginaria que algo horrível ocorreu na região, disse Chris Wood, da corretora CLSA. Mas o fato é que as economias emergentes da Ásia estão desfrutando de um período de crescimento respeitável e preços ao consumidor estáveis. Somente o Paquistão contabiliza um déficit comercial e fiscal tão terrível quanto o da Turquia e o da Argentina.
O Produto Interno Bruto (PIB) da Índia cresceu mais de 8% no último trimestre, em comparação com o ano anterior. E na Indonésia a expansão foi superior a 5%. Na China, o PIB cresceu acima de 6% (como sempre). E não é esperada uma desaceleração generalizada neste trimestre.
A guerra comercial afetou o ânimo na China e em Hong Kong. Mas as exportações chinesas para os EUA ainda cresceram mais de 13% em agosto e a feira comercial de Cantão foi a mais animada em seis anos, de acordo com o Instituto de Finanças Internacional. Muitos clientes americanos estão obviamente ávidos para comprar antes de as novas tarifas impostas entrarem em vigor. Alguns vizinhos da China, especialmente o Vietnã, acham que conseguirão vencer a guerra comercial absorvendo os novos refugiados, ou seja, as fabricantes que saíram da China para escapar das tarifas.
Índia e Indonésia estão bem isoladas da guerra comercial graças à força da sua demanda interna. Mas essa mesma força as deixa expostas a dois outros perigos: os preços mais altos do petróleo e o aperto monetário dos EUA.
Essas brechas seriam fáceis de financiar se os investidores estrangeiros se mostrassem complacentes. Mas não. Com o aumento dos juros nos EUA os emergentes são vistos como menos compensadores e mais perigosos.
Em resposta, o governo da Índia vem ajustando taxas e regulamentos para atrair mais capital estrangeiro e menos produtos do exterior.
Na Indonésia o governo vem incentivando as empresas estatais a diluírem o combustível importado com biodiesel extraído de óleo de dendê local. E adiou grandes projetos de infraestrutura. Aumentou as tarifas de importação de mais de mil produtos, incluindo perfumes, brinquedos de pelúcia e ketchup. A vida de um “guerreiro da rupia” envolve sacrifícios.
Em tese essas medidas seriam redundantes nas duas economias que adotaram taxas de câmbio flexíveis. Se o déficit comercial está insustentável, uma moeda flutuante supostamente deve desvalorizar e, com isso, desencorajar as importações (e incentivar as exportações) automaticamente. Com base nesse raciocínio, a desvalorização da rupia indiana e da rupia indonésia eventualmente resolveriam o problema que elas refletem. Mas a Indonésia teme ser mais difícil sustentar suas dívidas em moeda estrangeira com uma moeda mais frágil.
Os dois países também se preocupam com a possibilidade de essas desvalorizações da moeda engendrarem novas quedas. Depois de conter o deslize da rupia em 2013, Chatib Basri, na época ministro das Finanças da Indonésia, afirmou que uma drástica desvalorização da moeda lembraria a crise de 1997 e provocaria o pânico do investidor.
A oscilação que se verificou em 2013 foi decorrência de comentários vagos feitos pelo Federal Reserve americano, sugerindo que em breve reduziria suas compras de ativos. O subsequente aumento dos rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA tumultuou os mercados emergentes e ameaçou a frágil recuperação americana, levando o Fed a esclarecer e abrandar sua posição. Mas o aumento mais recente desses rendimentos é diferente, pois reflete uma expansão robusta nos EUA, reforçada por cortes generosos dos impostos devidos pelas empresas. Desta vez, existem poucas razões para esperar uma mudança de posição no Fed. Os EUA não sentem o desconforto dos mercados emergentes.
A Ásia há muito tempo sonha com uma separação dos EUA para conseguir prosperar mesmo quando o maior mercado do mundo não está avançando. Mas agora, pelo contrário, ela sofre mesmo quando os EUA não estão sofrendo e, em parte, exatamente por isso.