Queda na venda de imóveis acende alerta na China

As vendas de imóveis residenciais na China estão em queda, com restrições ao crédito e temores sobre a saúde financeira das incorporadoras desestimulando os compradores e jogando uma sombra sobre um setor que é fundamental para a economia chinesa. 

Grandes incorporadoras registraram volumes de vendas mais baixos em setembro e várias tiveram reduções de 20% a 30%, em comparação com o mesmo período de 2020. É uma queda brutal no mês que precede o feriado chinês do Dia Nacional, em 1o de outubro, quando promoções costumam fazer dele um dos períodos de vendas mais fortes do ano. 

Se essa forte queda for mantida, pode ter consequências econômicas graves. Nos últimos anos, o mercado imobiliário teve papel descomunal na economia chinesa. As famílias colocaram grande parte de sua riqueza em imóveis residenciais e para investimento. Uma desaceleração nas vendas pode afetar a construção, com o risco de prejudicar o crescimento, o emprego e as finanças de governos locais. Os descontos para estimular vendas podem aviltar os preços e impactar a riqueza das famílias. 

Incorporadoras como a China Evergrande têm tido dificuldades para se adaptarem a uma série de mudanças, que incluem as regras chamadas de “três linhas vermelhas” – lançadas no ano passado para conter o crescimento da dívida de empresas mais frágeis -, assim como limites para empréstimos imobiliários de bancos. Algumas não conseguiram fazer o pagamento de juros no prazo e os preços das ações e títulos caíram drasticamente em todo o setor. A notícia alarmou os compradores, especialmente porque as incorporadoras vendem muitos apartamentos antes da construção. 

Segundo Cheng Wee Tan, analista da Morningstar, a desaceleração das vendas é resultado, em parte, de uma política governamental mais rígida para o crédito imobiliário e de um declínio da confiança dos compradores de imóveis. Ele disse que os consumidores estão preocupados com a possibilidade de as incorporadoras não conseguirem concluir projetos. As notícias sobre construções inacabadas da Evergrande aumentam os temores. 

Ontem, a Longfor Group Holdings e a China Resources Land juntaram-se ao time das grandes empresas do setor imobiliário que têm divulgado resultados fracos. Em relatório, a Longfor informou que as vendas contratadas de setembro somaram o equivalente a US$ 3,1 bilhões, uma redução de quase 33% em relação a um ano antes. A China Resources Land relatou uma queda de quase 24%. As vendas contratadas são uma medida muito acompanhada. Refletem novos contratos de compradores de imóveis e indicam perspectivas futuras de receita. 

Pesos-pesados do setor também não foram poupados: a China Vanke, maior incorporadora do país em valor de mercado, teve queda de 34% nas vendas contratadas. Ao contrário de muitos de seus pares, a Vanke tem classificações de crédito com grau de investimento, o que indica que sua dívida é considerada segura. 

A Evergrande ainda não divulgou resultados à Bolsa de Valores de Hong Kong, mas em 14 de setembro alertou que “notícias negativas recorrentes nos meios de comunicação” desestimularam os compradores e era provável que isso significasse vendas expressivamente menores em setembro. Outras incorporadoras não deram explicações para a queda de vendas. 

Em geral, os resultados oficiais das empresas correspondem aos números divulgados anteriormente pelo provedor de dados chinês CRIC, que calculou que o total das vendas contratadas das 100 maiores incorporadoras da China caiu 36% em setembro em comparação com o mesmo mês de 2020. 

A queda nas vendas pode provocar estresse entre outras incorporadoras, com possibilidade de que algumas sejam impedidas de concluir projetos ou obrigadas a rever planos, segundo Logan Wright, diretor de pesquisa de mercado da China no Grupo Rhodium. 

“Se isso continuar, a maior preocupação será saber se algumas das medidas restritivas foram tomadas à custa da saúde de todo o setor”, disse Wright. “Veremos condições financeiras mais frágeis e atividades mais fracas de construção se espalharem na economia como um todo.”

No mês passado, a agência de classificação de risco Fitch Ratings rebaixou previsões para a expansão econômica da China neste ano e no próximo, com o argumento de que a desaceleração na atividade imobiliária “prejudicaria a demanda interna”. A Fitch reduziu sua projeção para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 8,4% para 8,1% neste ano, e de 5,5% para 5,2% no ano que vem. 

De canteiros de obras a estandes de vendas, o setor é uma fonte importante de empregos. Cerca de 18% dos 285 milhões de trabalhadores migrantes da China obtiveram renda de empregos relacionados à construção em 2020, de acordo com o Departamento Nacional de Estatísticas, enquanto muitos com diploma universitário trabalham como corretores de imóveis. Os governos locais, por sua vez, contam com a venda de terrenos a incorporadoras para obter cerca de um terço de sua receita. 

O mercado de imóveis residenciais da China, incluindo a atividade de construção e serviços, respondeu por 23% do PIB em 2018, segundo o Goldman Sachs. Os economistas do banco estimam que uma queda de 15% nas vendas de terrenos e de 5% nas vendas de propriedades e nos preços dos imóveis residenciais tiraria 1,4% do PIB do país em 2022. Segundo eles, na pior das hipóteses uma queda de 30% nas vendas de terrenos e de 10% nas vendas de imóveis poderia reduzir o PIB em até 4,1%. 

Por enquanto, as quedas nas vendas contratadas refletem mais o encolhimento do volume de vendas do que uma redução dos preços. Na Sunac China Holdings, por exemplo, o preço médio de venda caiu 1,4%, para o equivalente a pouco menos de US$ 200 por pé quadrado. Mas a área de vendas contratada encolheu 31%. 

Os consumidores mostram que acreditam que os preços podem cair. No terceiro trimestre, a proporção de depositantes de bancos do país que esperam alta nos preços dos imóveis caiu para 19,9%, segundo pesquisa do banco central da China. O percentual, que era de 25,1% há um ano, é o menor desde 2016. 

O menor volume de vendas também pode levar mais incorporadoras – que buscam recursos para pagar dívidas – a oferecer descontos maiores. Em setembro, pelo menos oito cidades proibiram as incorporadoras de fazerem cortes que consideraram excessivos nos preços de imóveis residenciais e, em alguns casos, instituíram preços mínimos, segundo os meios de comunicação estatais chineses. 

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2021/10/13/queda-na-venda-de-imoveis-acende-alerta-na-china.ghtml

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