Disputar uma fatia do bolo publicitário digital – um mercado projetado em US$ 83 bilhões neste ano, só nos Estados Unidos – significa desafiar colossos como Google e Facebook, mas a Oracle, outra gigante de tecnologia, acredita ter encontrado uma maneira de fazer isso, sem enfrentamentos diretos. A companhia quer saber por onde navegam e o que compram os consumidores na internet para, então, estabelecer uma base de dados que permita às marcas criar campanhas publicitárias de acordo com o gosto de seus clientes.
“Dados vão se tornar uma moeda”, disse Mark Hurd, codiretor-presidente da Oracle, na semana passada, durante evento voltado para a mídia na sede da companhia, em Redwood City, na Califórnia. “Quanto mais relevantes forem os dados [que uma empresa obtiver], quanto mais robustos, maior será a chance de vencer.”
A Oracle é uma das principais companhias globais de softwares empresariais e serviços na nuvem, um modelo que permite ao usuário acessar seus programas e dados via internet. No fim do mês passado, a companhia deu mais um passo para fortalecer seu negócio de análise de dados ao anunciar a aquisição da Moat. A empresa tem mais de 600 clientes e faz a medição independente de anúncios publicados em grandes plataformas digitais, como as do Facebook, YouTube e Snapchat., como mostrou matéria de Rodrigo Carro, publicada no Valor Econômico.
Ferramentas desse tipo ganharam atenção principalmente a partir do fim do ano passado, depois da onda de críticas à falta de transparência e de números confiáveis oferecidos pelos dois gigantes da publicidade digital.
Mas esse não é o primeiro movimento de Hurd nessa direção. O executivo, que chegou à Oracle em 2010, vindo da HP, comprou a Datalogix, outra empresa especializada em mensurar dados para uso em campanhas digitais, em dezembro de 2014. Antes disso, em fevereiro, a Oracle já havia adquirido a BlueKai, que usa computação em nuvem para personalizar campanhas de marketing.
O mercado de publicidade digital é extremamente concentrado – juntos, Google e Facebook absorvem mais de 75% dos gastos mundiais na área. A estratégia da Oracle é tirar vantagem de uma base de dados que engloba mais de cinco bilhões de consumidores, entre pessoas físicas e jurídicas. Por mês, a companhia coleta mais de 7,5 trilhões de informações derivadas de pesquisa e análise. “Nós também vendemos dados para nossos clientes [ incluindo Google e Facebook]”, disse Hurd. A IBM também tem investido nessa área, com três aquisições só em 2016.
A companhia não tem acesso automático aos dados armazenados por seus clientes na nuvem. Para que as informações sejam utilizadas é necessário um acordo de cessão entre as partes, esclarece o vice-presidente de inovação, digital e tecnologia da Oracle para a América Latina, Fernando Lemos. Com a computação em nuvem, a Oracle processa 55 bilhões de transações por dia em 195 países.
O repositório de dados da Oracle mistura informações obtidas via acordos com parceiros ou coletadas na web por Moat, BlueKai e Datalogix. As empresas de marketing digital adquiridas pela Oracle recolhem informações disponíveis na web a partir de “rastros” deixados pelos usuários. Por exemplo, registros de acessos feitos a partir de dispositivos móveis, números de cartões de crédito utilizados para compras e “cookies” (conjuntos de dados que permitem identificar o perfil de um usuário a cada visita que faz a um site). Em meio às preocupações crescentes com a privacidade, a empresa garante que os dados reunidos são anônimos, ou seja, não permitem identificar o internauta.
O crescimento baixo da economia dos EUA acaba estimulando o interesse natural das empresas de conhecer melhor seus clientes. “Não há mais crescimento de receita por aí. O S&P [índice do mercado acionário americano] não vem crescendo mais de 1% ou 2% nos últimos cinco anos”, disse Hurd. Nesse cenário, a expansão da receita das empresas depende mais da capacidade delas de tomar mercado dos concorrentes, afirma o executivo. Dados referentes ao PIB americano no primeiro trimestre de 2017 não foram dos mais animadores: a economia avançou 0,7%, na comparação anual, o percentual mais baixo em três anos.
As perspectivas na esfera mundial também são desafiadoras, segundo o presidente da Oracle, que trabalha com uma expansão estimada em torno de 2% do PIB mundial neste ano. “Cerca de 40% do crescimento do PIB [mundial] está concentrado em um país, que é a China”, afirmou Hurd. Para empresas que não estão no mercado chinês, alerta o executivo, a situação pode ser ainda mais difícil. “A maioria dos nossos clientes está numa posição em que têm que tirar consumidores de outra companhia para obter qualquer crescimento real”.
Na Oracle, tanto os esforços no segmento de marketing digital como os negócios mais tradicionais – em áreas como software, infraestrutura e plataformas digitais – têm em comum a transição para a computação em nuvem. Hurd estimou que, do total global de US$ 1 trilhão gastos anualmente com tecnologia da informação, metade seja direcionado para aplicações na nuvem.
A nuvem vem atraindo investimentos sob um ritmo muito superior ao do setor de tecnologia da informação (TI) como um todo, conforme indica um estudo da consultoria IDC. A expectativa é que no período entre 2015 e 2020, os gastos globais com computação em nuvem vão aumentar a uma taxa anual composta de 21,5%, quase sete vezes o percentual de crescimento geral dos gastos com TI. A previsão é os gastos com a nuvem vão alcançar US$ 203,4 bilhões no mundo em 2020.
Cinco anos depois, em 2025, a expectativa é que 80% dos centros de dados mantidos pelas empresas para abrigar sua infraestrutura de tecnologia e comunicação – como servidores e equipamentos de armazenagem de dados -, tenha desaparecido, substituídos pelo armazenamento na nuvem, previu Hurd em janeiro deste ano.