Nos EUA, atividade deve acelerar mais do que criação de empregos

Empregadores nos EUA podem ter problemas nos próximos meses para contratar trabalhadores com rapidez suficiente para acompanhar a esperada explosão de crescimento econômico do país. 

Os gastos do consumidor em restaurantes, hotéis e salões de beleza já começam a deslanchar com o abrandamento da restrições contra a covid-19 e com o maior número de pessoas vacinadas, que lançam mão de seus cheques de estímulos recebidos pelo governo federal e de poupanças. 

Mas muitos economistas preveem que, por motivos diversos, o nível de atividade econômica subirá mais aceleradamente do que o das folhas de pagamento, pelo menos inicialmente, o que causará gargalos e pressões salariais. 

Isso aconteceu no ano passado em vários setores da indústria, que passaram por escassez de mão de obra, em um momento em que americanos que trabalhavam de casa encomendaram mais móveis, equipamentos para exercícios físicos e outros produtos. 

Neste ano, é provável que esse quadro se repita, especialmente no caso de fornecedores de serviços que exigem proximidade pessoal, já que foram os que registraram as maiores quedas de movimento e nível de emprego e que tendem a vivenciar maior recuperação da demanda neste ano. 

Economistas ouvidos pelo “The Wall Street Journal” projetam que o Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA – valor de todos os bens e serviços produzidos – crescerá 6,4% neste ano, medido a partir do quarto trimestre de 2020 até o mesmo período deste ano. Isso elevará a produção para quase 4% acima do nível pré-pandemia, medido no quarto trimestre de 2019. 

Por outro lado, economistas preveem que os empregadores criarão 7,1 milhões de novos empregos no período de 12 meses concluído em dezembro de 2021, o que representa aumento de 5%. Isso deixaria o nível de emprego 1,6% abaixo do registrado no quarto trimestre de 2019. 

A expansão do nível de emprego será menor que a do PIB por dois motivos principais, segundo economistas. Em primeiro lugar, muitas empresas relutarão em contratar funcionários enquanto não estiverem convencidas de que a intensificação da demanda do consumidor persistirá. 

Em segundo lugar, milhões se retiraram da população economicamente ativa (PEA, os trabalhadores ocupados e os desocupados com que o setor produtivo pode contar) na pandemia, e poderão levar tempo para voltar. 

Economistas apontam várias forças que estão por trás da dúvida dos empregadores em contratar. Por exemplo, não se sabe quando a pandemia chegará ao fim. Embora as taxas de vacinação estejam subindo, os totais de casos diários de covid- 19 em muitas regiões dos EUA estão aumentando, com a disseminação de novas cepas do vírus e com o abrandamento das restrições à atividade econômica. 

Além disso, muitas empresas enfrentam incertezas sobre a possibilidade de se defrontarem com uma demanda permanentemente mais fraca devido aos efeitos da pandemia. Viagens de negócios podem nunca voltar aos níveis pré-pandemia. Uma mudança duradoura para o trabalho remoto poderá desincentivar cafés e lojas próximas a escritórios. 

“Eles estão muito contentes de ver essa escalada, em um momento em que tudo reabre. Mas ainda há incerteza sobre qual será seu fluxo de receita”, disse Steven Blitz, da consultoria TS Lombard. 

Mesmo depois que um empregador divulga a abertura de uma vaga, o processo de contratação pode levar semanas ou meses. Por outro lado, a reserva de mão de obra encolheu na pandemia. 

A parcela dos americanos de 25 a 54 anos que estão empregados ou emprego – a chamada taxa de participação da força de trabalho em idade produtiva – procurando era de 81,3% em março, ante 82,9% de fevereiro de 2020, o que representa uma perda de 1,9 milhão de trabalhadores. 

Muitas dessas pessoas se retiraram da PEA a fim de cuidar dos filhos no período de fechamento das escolas. Outras deixaram de procurar emprego por medo de contrair ou transmitir covid-19. Além disso, o pacote de US$ 1,9 trilhão determinou o envio de novos cheques de estímulo a muitos americanos e prorrogou ajuda complementar aos desempregados de US$ 300 por semana, o que também pode estar desestimulando alguns de procurar emprego.

“É um grande contingente de pessoas que precisam voltar ao trabalho, e isso não vai acontecer da noite para o dia”, disse o presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), Jerome Powell, no mês passado. 

A queda acentuada na participação da força de trabalho não dá sinais de reversão rápida. Embora a criação de vagas ultrapasse os níveis pré-pandemia, dados do Google Trends mostram queda da busca de empregos on-line por parte dos trabalhadores. 

Daniel Zhao, economista da empresa de oferta de empregos e pesquisa salarial Glassdoor, disse que essa queda recente “levanta preocupações de que a participação da força de trabalho pode não se recuperar rapidamente, mesmo após o fim da pandemia”. 

O desemprego de longo prazo representa um obstáculo a mais. Em março havia 4,2 milhões de americanos enfrentando períodos de desemprego de pelo menos 27 semanas, em relação aos 1,1 milhão de fevereiro de 2020. 

“Quanto maior for o tempo em que as pessoas continuam desempregadas, mais suas qualificações começam a se atrofiar e mais difícil fica para elas retornarem”, disse Jay Bryson, economista do Corporate and Investment Bank, da financeira Wells Fargo. 

O resultado, pelo menos temporariamente, pode ser gargalos que aborrecem os consumidores, até a demanda e a oferta de mão de obra entrarem em equilíbrio. Por exemplo, as filas de check-in dos aeroportos neste verão (de junho a setembro no hemisfério norte) poderão crescer à medida em que os funcionários tentarem atender um fluxo de viajantes. 

Os salões de beleza poderão precisar que cabeleireiros profissionais cumpram expedientes mais longos para atender muitos clientes que passaram um ano sem cortar o cabelo. Restaurantes poderão elevar os salários a fim de atrair mão de obra e repassar os custos por meio de elevação dos preços dos pratos. 

“Nos próximos meses poderemos assistir a uma demanda realmente sólida e sofrer algumas dessas pressões… em termos de salários etc”, disse Bryson. “[Mas] nossa sensação é de que não será uma espiral ascendente que durará anos.” 

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2021/04/19/nos-eua-atividade-deve-acelerar-mais-do-que-criacao-de-empregos.ghtml

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