Nos EUA, Amazon provoca e supermercados reagem

Será que o futuro das compras de supermercados vai depender de carros autoguiados, kits de refeições e centros de distribuição automatizados?
A Kroger, uma das maiores redes de supermercados dos Estados Unidos, está apostando em tudo isso. Desde maio, anunciou uma série de iniciativas para fortalecer sua posição no comércio eletrônico, o próximo campo de batalha dos supermercados, como mostrou matéria do Financial Times, publicada no Valor de 20/08.
A rede vem testando veículos autônomos para fazer entregas e comprou a
fabricante de kits de refeições Home Chef, além de uma participação de 183
milhões de libras esterlinas (US$ 233,5 milhões) na varejista on-line britânica Ocado, que licenciou sua tecnologia para entrega de encomendas à americana. Neste mês, o Kroger lançou serviços de entrega em quatro cidades e há planos para expandi-lo pelos Estados Unidos.
A companhia também está promovendo sua primeira investida internacional, por meio de uma aliança com o gigante de comércio eletrônico Alibaba para vender seus produtos de marca própria na China.
“O que realmente temos como foco é que quando alguém decidir comer algo, recorra a nós”, disse Rodney McMullen, CEO da Kroger, a analistas em teleconferência sobre seu balanço mais recente.
A Kroger não é a única rede de supermercados correndo para despejar dinheiro em novas tecnologias desde que a Amazon sacudiu o setor com a inesperada compra da rede Whole Foods por US$ 13,7 bilhões há cerca de um ano.
O Walmart lançou, nos Estados Unidos, um serviço que entrega as mercadorias no mesmo dia em que o consumidor faz o pedido e também testa robôs aptos a atender encomendas do tipo “retire em loja”, nas quais o cliente escolhe o produto na internet e faz a retirada em uma loja a sua escolha. A Target pagou US$ 550 milhões para comprar a Shipt, uma empresa de serviços de entrega no mesmo dia.
As redes de supermercados locais e regionais sem condições de comprar ou desenvolver suas próprias operações de entrega vêm fazendo parcerias com a Instacard, o grupo de entregas financiado por empresas de capital de risco cuja última rodada de investimentos lhe conferiu uma avaliação de US$ 4,35 bilhões.
O acirramento da competição ficou ainda mais evidente após o anúncio da Amazon, neste mês, de que os assinantes de seu serviço Prime em duas pequenas cidades dos EUA poderão encomendar alimentos da Whole Foods por meio do aplicativo no celular e buscá-los em uma loja 30 minutos depois sem precisar sair do carro.
Os serviços de “retire em loja” e de entrega no mesmo dia vêm se tornando uma expectativa básica dos consumidores, segundo Randy Burt, sócio da área de varejo e consumo da consultoria A.T. Kearney.
Em vez de estabelecer uma posição dominante no varejo de alimentos, a iniciativa da Amazon parece encaminhada a aumentar a fragmentação do mercado, à medida que as vendas passam para o mundo on-line. A proliferação de opções permite aos clientes gastar menos tempo nas lojas e dividir suas compras em várias empresas, tornando mais difícil para qualquer companhia monopolizar o mercado, de acordo com analistas e investidores.
Em 2022, as vendas on-line devem chegar a 20% do movimento dos supermercados, o que equivale a US$ 100 bi
Enquanto a compra de alimentos pela internet se torna cada vez mais comum na Europa e na Ásia, os americanos continuam teimosamente leais às compras presenciais nos supermercados. As vendas on-line representaram cerca de 2% do movimento de US$ 800 bilhões dos supermercados nos Estados Unidos em 2017, em comparação aos mais de 5% na França, mais de 7% no Reino Unido e quase 17% na Coreia do Sul, segundo a empresa de pesquisas Kantar Worldpanel.
A Kroger e outros varejistas de alimentos, porém, estão apostando alto que o mercado americano está no ponto certo para se transformar – incentivado em grande parte pela Amazon. A investida no setor de alimentos da maior empresa de comércio eletrônico dos Estados Unidos deixou as redes tradicionais alvoroçadas para evitar o mesmo destino das livrarias e lojas de CDs.
Também encorajou novas empresas atentas à oportunidade de conquistar participação nas vendas on-line, que deverão chegar a 20% do movimento total dos supermercados em 2022, o equivalente a US$ 100 bilhões, segundo previsões da Nielsen.
A Whole Foods tem uma base de lojas relativamente pequena, mas a combinação de seus 500 supermercados com a participação estimada de 18% da Amazon nas vendas de alimentos on-line, segundo a empresa de análise de mercado Packaged Facts, tem sido um forte motivador para as redes estabelecidas se mexerem.
Quando a Amazon anunciou que estava comprando a rede de supermercados de alto padrão em junho de 2017, o valor de mercado das cadeias tradicionais nos EUA e Europa diminuiu em US$ 40 bilhões. As ações sofreram outro tombo dois meses depois, quando a Amazon concluiu o negócio e anunciou que começaria a baixar os preços de tudo, das bananas à carne. Nos últimos 12 meses, promoveu mais cortes de preços, além de oferecer descontos dentro das próprias lojas e entregas grátis em duas horas para os assinantes de seu serviço Prime.
Nos últimos 12 meses, as ações das varejistas tradicionais de alimentos recuperaram parte das perdas, mas novos desafios surgiram no caminho, como os custos para selecionar e entregar as mercadorias pedidas pela internet e as despesas para reformar lojas e torná-las mais parecidas com centros de distribuição.
Ao mesmo tempo, os preços são pressionados para baixo por supermercados de desconto como Walmart, Aldi e Lidl.
Para complicar ainda mais o quadro, há uma nova safra de companhias bem financiadas entrando no mercado. A empresa de entrega de alimentos orgânicos Good Eggs, por exemplo, levantou US$ 50 milhões em maio, sob a liderança do fundo de capital de risco Benchmark, para expandir-se na Califórnia. O aporte chegou menos de três anos após a companhia ter sido obrigada a fechar as operações fora de San Francisco por ter exagerado na expansão.
A Brandless, uma startup de comércio eletrônico que vende alimentos embalados, artigos para a casa e produtos de cuidados pessoais por US$ 3 a unidade, levantou US$ 240 milhões do Vision Fund, do SoftBank, para expandir seu serviços de entrega e seu centro de distribuição.
Essas empresas e outras varejistas on-line de alimentos vêm seguindo o modelo da Amazon e se valendo da análise de dados para administrar estoques e personalizar linhas de produtos, enquanto enfatizam a transparência sobre a origem da mercadoria.
“A Amazon e a Whole Foods são um catalisador para a mudança do comportamento do consumidor on-line”, disse Bentley Hall, executivo-chefe da Good Eggs. “Longe de estar com medo, estou entusiasmado.”
À medida que a compra de alimentos na internet se tornar mais conveniente, graças a entregas mais rápidas ou à possibilidade de retirada em loja no mesmo dia, e mais competitiva nos preços, analistas e investidores dizem que os consumidores provavelmente vão se tornar mais seletivos ao escolher as varejistas on-line e off-line.
Jeff Housenbold, sócio-gerente do SoftBank, que se juntou ao conselho de administração da Brandless em julho, disse que em vez de depender de um supermercado, uma grande loja física ou um único portal on-line, os clientes estão perguntando: “Como vou conseguir o melhor em cada categoria?”

https://www.valor.com.br/empresas/5750023/nos-eua-amazon-provoca-e-supermercados-reagem#

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