Por motivo inédito o presidente da República do Paraguai será afastado do cargo: desempenho insatisfatório de suas funções. Mesmo na difícil história da democracia na América Latina não há registro de impeachment presidencial por esta razão. Ontem, a Câmara dos Deputados paraguaia votou, por 73 votos a um, a destituição do presidente Fernando Lugo. Hoje, o processo continuará no Senado.
Para os analistas internacionais as chances de Lugo permanecer no poder são “remotas”. O fato que provocou a reação dos parlamentares foi a atuação de Lugo no episódio de Curuguaty, a pouco mais de 250 quilômetros da fronteira brasileira, quando grupo de camponeses armados entraram em choque com a polícia. Há dois anos, esses camponeses invadiram a fazenda do ex-senador Blas Riquelme, e a Justiça concedeu a reintegração de posse. No confronto morreram 17 pessoas, sete delas policiais, incluindo o comandante do destacamento.
A violência do fato chocou o país. O presidente Lugo agiu rápido demitindo no mesmo dia da tragédia o comandante da polícia e o ministro do Interior. A área de segurança pública considerou a atitude do presidente como atribuição de culpa aos policias pelo episódio, insistindo que os policiais cumpriam decisão judicial.
O presidente Lugo está isolado politicamente há meses. Porém, o rito sumário de demissão do presidente chamou a atenção das repúblicas vizinhas. A União das Nações Sul-Americanas, Unasul, enviou missão diplomática formada pela maioria dos ministros das Relações Exteriores dos países latino-americanos para acompanhar o caso. O chanceler brasileiro, Antonio Patriota, que ontem foi para Assunção, afirmou que o bloco Unasuil pede “respeito à ordem democrática do Paraguai”.
A tragédia de Curuguaty transformou-se no pretexto perfeito para a oposição destituir um presidente politicamente enfraquecido como é ocaso de Lugo. O problema, porém, deixou de ser interno ao Paraguai. A oposição a Lugo terá de convencer os vizinhos de que foi tudo legal no processo de impeachment, principalmente a rapidez da decisão, sob o risco de violar clausulas de “proteção à democracia” que integram tanto a Unasul como o Mercosul.
O quadro mudou na América Latina em relação à história de golpes de Estado tão comuns na região. Hoje, a destituição de um presidente vira problema regional, não apenas nacional. É uma mudança significativa.