México tem poucas opções na disputa comercial com EUA

O apelo do México por calma em resposta à ameaça de tarifas comerciais punitivas dos EUA reflete a falta de opções do presidente Andrés Manuel López Obrador, que enfrenta uma ameaça que pode levar a economia de seu país à recessão, disseram especialistas.
A promessa do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de impor tarifas às importações mexicanas neste mês, a menos que o país reduza o fluxo de imigrantes para os EUA, criou a maior crise para o governo de López Obrador, que está há seis meses no poder.
A resposta imediata do presidente mexicano foi despachar uma missão de emergência a Washington e enviar uma carta de duas páginas a Trump dizendo: “Não quero um confronto”. Hoje, a ministra da Economia mexicana, Graciela Márquez, deve se reunir com o secretário de Comércio dos EUA, Wilbur Ross, na capital americana, para iniciar as negociações entre os dois países..
Se o presidente dos EUA seguir adiante com as tarifas, López Obrador estará limitado pelas realidades de uma relação desigual com os EUA, o que lhe confere pouco poder de barganha, e por uma terrível situação social na vizinha América Central.
A economia do México, aberta e orientada para as exportações, é muito mais dependente do comércio do que a americana e depende demais de um único mercado: 80% das exportações mexicanas vão para os EUA. Os EUA investem mais de seis vezes no México do que o México investe nos EUA, e a economia americana é 16 vezes maior.
Mesmo antes de Trump jogar essa bomba tarifária, a economia do México estava em dificuldades. Um setor de serviços fraco causou uma contração de 0,2% no primeiro trimestre deste ano e a maioria dos analistas não está confiante nas perspectivas para o ano.
Algumas autoridades mexicanas ainda esperam que a ameaça dos EUA não se materialize, lembrando uma promessa não cumprida do Trump em março de fechar a fronteira se o México não restringisse a migração ilegal.
Funcionários da governo Trump têm sido vagos sobre exatamente o que o México precisa fazer para evitar as tarifas, que começam com 5% e podem subir 5 pontos ao mês até chegar a 25%. Mick Mulvaney, chefe de gabinete da Casa Branca, disse ontem Mulvaney à TV americana Fox News, que Trump fala “realmente a sério” sobre impor tarifas ao México. Ele deixou claro o uso do comércio como arma política. “Essa é uma questão de imigração, não de comércio”, afirmou. E reiterou que os EUA queriam ver uma redução “significativa e substancial” dos migrantes que chegavam à fronteira sul.
É improvável que isso aconteça rapidamente, já que a maioria dos migrantes está fugindo da pobreza endêmica e da violência na América Central. “Não há como o México, mesmo com vontade política, conseguir barrar todos os migrantes”, disse Shannon K O’Neil, vice-presidente do Council on Foreign Relations, um centro de estudos de Washington.
O’Neil também observou que López Obrador cortou drasticamente neste ano o orçamento da agência mexicana de imigração, o Instituto Nacional de Migração, como parte de um ajuste fiscal, reduzindo a capacidade do país de lidar com o aumento da chegada de migrantes de Guatemala, Honduras. e El Salvador, que tanto enfureceu Trump.
Eric Olson, do Instituto do Wilson Center do México, sugeriu que López Obrador, conhecido como Amlo, poderia oferecer patrulhas de fronteira para evitar que migrantes da América Central entrem no México, mas acrescentou: “O desafio para o Amlo é não parecer subserviente nem ofender sua própria base. ”
López Obrador já recebeu críticas por ter oferecido aos migrantes da América Central um visto humanitário que lhes permitia uma estada de 90 dias no México. A política foi desfeita rapidamente depois que o número de migrantes disparou no início deste ano.
Embora o esquerdista López Obrador tenha posição política diferente de Trump, ele até agora se absteve de confrontar ou criticar os EUA. Isso reflete o seu desejo de se concentrar em suas prioridades domésticas de combate à corrupção e à pobreza.
“O México vai se tornar uma potência econômica com bem-estar e justiça, e a migração será opcional… não obrigatória “, disse López Obrador num evento no sábado. Ele prometeu sempre defender “nossos compatriotas migrantes. Não apenas migrantes mexicanos… todos os migrantes merecem nosso respeito, nossa compreensão e nossa mão fraterna “.
Mas se as tarifas morderem, o líder mexicano provavelmente ficará sob forte pressão da comunidade de negócios no México para negociar uma saída. Isso não será fácil. López Obrador não tem relações pessoais com o Trump e, em vez disso, confia no seu respeitado ministro das Relações Exteriores, Marcelo Ebrard, para fazer o trabalho pesado em Washington.
Ebrard deve se encontrar com o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, na quarta-feira, mas ñão parece provável que essas conversas influenciarão Trump.
“O México está enviando uma grande delegação para falar sobre a fronteira”, tuitou ontem o presidente, que acusou o México de “abusar” dos EUA por décadas. “O problema é que eles estão ‘ falando’ há 25 anos. Nós queremos ação, não falação. Eles poderiam resolver a crise da fronteira em um dia, se assim o desejassem. Caso contrário, nossas empresas e empregos vão voltar para os EUA!”
Arturo Sarukhán, ex-embaixador mexicano nos EUA, sugeriu que o México precisa “resistir a um valentão” e seguir uma abordagem dupla: “Incentivar aliados [nos EUA] a pressionar o presidente (…) e deixar que empresas e consumidores dos EUA sintam o impacto se as tarifas forem adotadas”. Na sexta-feira, houve forte reação nos EUA, tanto de políticos como no meio empresarial, contra as tarifas ao México.

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