Hillary e Trump somem das campanhas dos candidatos ao Congresso

Candidatos ao Congresso dos Estados Unidos estão literalmente se afastando de Donald Trump e de Hillary Clinton, dada a rejeição de ambos entre o eleitorado, e desenvolvem campanhas independentes, desconectadas dos presidenciáveis de seus próprios partidos.

A rejeição de ambos é a maior da história das eleições americanas. Segundo pesquisa do instituto Ipsos encomendada pela Reuters e feita entre 8 e 12 de setembro, 57% dos eleitores têm visão desfavorável de Trump, enquanto 56% têm imagem negativa de Hillary.

Essa rejeição está fazendo com que congressistas republicanos só se refiram à eleição presidencial para criticar a democrata Hillary, fugindo de questões polêmicas envolvendo Trump. Por outro lado, congressistas democratas também procuram ressaltar mais os defeitos do republicano Trump do que as qualidades de Hillary, como mostrou material de Juliano Basile no Valor de 19/09.

“Muitos deputados republicanos que disputam a reeleição estão fugindo quando questionados se vão apoiar Trump em seus Estados”, contou Melinda Henneberger, editora-chefe do “Roll Call”, um dos jornais mais tradicionais na cobertura política em Washington. Ela lembrou que isso aconteceu com a deputada Sharron Angle (Nevada), que literalmente correu dos jornalistas quando questionada sobre o apoio a Trump.

Em geral, o discurso de Trump afasta eleitores negros e imigrantes, além de ser rejeitado por pessoas preocupadas com a igualdade de gênero. Já Hillary é a candidata governista, desgastada por mais de três décadas de vida pública e que convive com constantes notícias sobre investigações do período em que foi secretária de Estado do governo Barack Obama, quando utilizou e-mail pessoal para tratar de questões de segurança nacional. “Ela pode perder votos até entre os democratas porque não é muito popular”, apontou Melinda.

Na Pensilvânia, onde ocorreu a convenção democrata, Katie McGinty, candidata do partido ao Senado, é a favor de quase todas as propostas de campanha de Hillary, como igualdade de salários às mulheres, controle de venda de armas e aumento do salário mínimo para US$ 15 por hora, mas evita o nome da candidata em sua campanha. O site de McGinty traz imagens dela com o vice-presidente Joe Biden, mas não tem uma foto de Hillary.

Quando menciona o seu adversário na disputa pelo Senado, o republicano Pat Toomey, McGinty o compara a Trump, alegando que ambos vão beneficiar empresários e grandes corporações.

Já Toomey nem sequer endossou a candidatura de Trump, criticou as propostas do presidenciável de barrar muçulmanos do país e procura relacionar McGinty a Hillary. “Ela defende as políticas que estão prejudicando os trabalhadores da classe média”, declarou.

Em Ohio, onde ocorreu a convenção republicana, Rob Portman, candidato do partido ao Senado, desconectou a sua campanha dos discursos de Trump a tal ponto que, quando Trump caiu nas pesquisas, em agosto, Portman subiu. Seu adversário na disputa local, o ex-governador democrata Ted Strickland, não é um grande apoiador de Hillary e ainda cometeu uma gafe na semana passada ao declarar que Tim Kaine, o vice na chapa da candidata democrata, estaria “perfeitamente preparado para assumir o cargo de presidente, caso isso seja necessário” por conta da pneumonia que acometeu Hillary.

Houve casos mais graves, como o deputado republicano Richard Hanna (Nova York) que disse que votará em Hillary após chamar Trump de “vergonha nacional”.

“A impopularidade é um problema para os dois candidatos. Mas há algo incomum neste ano, que é um nível de frustração mais elevado”, disse Chris Brennan, colunista de política do jornal “The Philadelphia Inquirer” e que cobre eleições desde 1999. Segundo o Ipsos, 65% dos americanos acham que o país está na direção errada. “Então, mesmo que Trump seja mais impopular que Hillary, é possível que haja um voto de protesto que aposte em algo diferente do que a política tradicional oferece.”

Essa desconexão dos candidatos ao Congresso com os presidenciáveis deverá trazer um desafio extra para quem ganhar as eleições: se os congressistas estão se dissociando dos possíveis presidentes, como o vencedor conseguirá uma maioria no Congresso após a eleição?

Atualmente, os republicanos controlam o Senado, com 54 cadeiras contra 44 dos democratas. Como os dois senadores independentes, Bernie Sanders (Vermont) e Angus King (Maine), costumam se aliar aos democratas, o partido de Hillary precisa conquistar só mais quatro cadeiras para retomar o controle do Senado, desde que ela ganhe a corrida presidencial, uma vez que o vice-presidente também é o presidente da casa.

Essa chance é reforçada pelo fato de os republicanos estarem defendendo a maioria das cadeiras em jogo nestas eleições. Sete dos candidatos republicanos à reeleição são de Estados em que Obama foi vitorioso em 2012.

“Se Hillary vencer os Estados que Obama conquistou em 2012, isso em tese ajudaria os democratas que disputam o Senado”, disse Geoff Skelley, do Centro de Políticas da Universidade da Virgínia. Só que muitos candidatos do partido se unem a Hillary mais para criticar Trump do que para defendê-la.

Já na Câmara a liderança republicana é “bastante sólida”, continuou Skelley. Os democratas precisariam de mais 30 assentos para tirar a maioria dos republicanos, que é de 247 contra 188. “Seria preciso uma vitória democrata muito forte para dar ao partido a chance de retomar o controle da Câmara. Esse é um desafio muito grande.”

Para obter essa vitória, os democratas teriam que obter muitos votos em subúrbios nos quais Trump está prometendo ajudar a classe trabalhadora por meio de restrições à imigração – algo que é duramente criticado por Hillary. “Os democratas estão na ofensiva para conquistar esses votos, mas os republicanos também, pois eles querem manter o nível de eleitores que conquistaram nas últimas eleições legislativas”, resumiu.

A desconexão pode fazer com que o presidente eleito fique sem a maioria necessária no Congresso para governar – justamente o que ocorre com Obama. “Os americanos gostam de ver um governo dividido, com freios e contrapesos e os poderes controlados por diferentes partidos”, disse Melinda.

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