Europeus reduzem uso de dinheiro em espécie

A Europa começa a sair da crise sanitária usando cada vez menos dinheiro físico. Os efeitos da pandemia aceleraram dramaticamente a mudança no comportamento dos europeus com relação aos meios de pagamentos. O uso de dinheiro em espécie diminuiu significativamente, enquanto os meios digitais ganharam importância. O pagamento sem contato por cartão e telefone celular é o novo padrão, usado para as mais variadas despesas. 

O Bundesbank, o banco central alemão, mostrou essa situação numa conferência internacional sobre dinheiro na semana passada. No entanto, autoridades monetárias alertam que, embora os consumidores estejam usando muito mais os meios de pagamentos digitais, ainda será preciso mais que uma pandemia para transformar a Europa numa sociedade sem dinheiro físico. 

O uso de pagamento digital já vinha se tornando mais popular antes da pandemia e acelerou com a crise sanitária. Segundo pesquisa feita pelo Bundesbank, a participação 

do dinheiro nas transações cotidianas no país caiu de 74% para 60% nos últimos três anos. 

O Banco Central Europeu (BCE) também foi a campo para entender o novo comportamento dos consumidores. Em sua pesquisa, 40% dos entrevistados responderam que passaram a usar menos dinheiro desde o começo da pandemia, com quase 90% dizendo que continuariam a usar menos moeda física a partir de agora. 

No Reino Unido, o número de pagamentos usando notas e moedas caiu cerca de 35% em 2020. Cinco em seis pagamentos agora não envolvem mais dinheiro vivo, comparado com metade das transações de dez anos atrás. 

Na Suíça, o pagamento com dinheiro caiu de 26,5% do total em 2019 para 13,3% em maio deste ano, conforme pesquisa feita pelo professor Tobias Trütsch, da Universidade de St. Gallen. Mas ele aponta agora uma retomada gradual do uso de dinheiro comparado a novembro do ano passado. Ou seja, o pagamento digital continua em expansão, mas alguns consumidores ainda acham mais fácil controlar suas despesas com dinheiro na mão. 

“Estamos vendo um declínio no uso de cash mesmo na Alemanha, onde o consumidor é mais conservador, afirmou Burkhard Balz, membro do conselho executivo do Bundesbank em seminário no Parlamento europeu. “Para muitos na Alemanha, foi a primeira vez que perceberam que já não tinham dinheiro em suas carteiras, mas sim um cartão sem contato. A questão, acrescentou Balz, é se esses novos hábitos adquiridos em tempos de disrupção vieram para ficar. “Eu penso que sim.” 

A Suécia, o primeiro a introduzir as notas de banco em 1661, já tinha bem antes da crise sanitária planos de se tornar a primeira sociedade sem dinheiro nos próximos anos. A maioria dos suecos deixou de carregar dinheiro. Mas há alguns movimentos organizados também a favor do papel moeda. O Riksbank, o BC sueco, lançou neste ano um projeto piloto chamado e-krona para “investigar possível emissão de dinheiro digital em complemento ao cash”. 

No seminário do Budesbank, Fábio Panetta, membro do conselho executivo do BCE, disse que a digitalização acelerada da economia não significa o fim do “cash” tão cedo, pelo menos na zona do euro, onde diz ver ainda demanda pelas notas de dinheiro. 

Ele notou que a pandemia deflagrou atitudes divergentes sobre o uso de dinheiro. De um lado, houve clara redução no uso de dinheiro em espécie nos pagamentos quotidianos, por razões bem conhecidas: expansão do comércio eletrônico e restrições que tiveram impacto em atividades com uso intensivo de dinheiro como viagens, entretenimento e eventos culturais e esportivos. O pagamento eletrônico tornou-se mais conveniente em meio a preocupações com o risco de infecção através das notas. 

De outro lado, o BCE constatou, em paralelo, um enorme aumento na demanda por notas de euro, com aumento de € 190 bilhões, ou € 550 per capita entre março de 2020 a maio de 2021, representando 4% a mais de emissões comparado aos cinco anos anteriores. 

Uma possível explicação para esse paradoxo é que durante a crise sanitária os europeus preferiram ter mais liquidez em mãos para “gerenciar incertezas”. Segundo o BCE, apenas 20% das notas de euro em circulação são ativamente usadas para pagamentos. A vasta maioria do cash, cerca de € 1 trilhão (R$ 5,98 trilhões), é mantida como ativo e usada apenas esporadicamente para pagamentos. 

Um estudo de três economistas do Banco de Compensações Internacionais (BIS), espécie de banco dos bancos centrais, alertam para o severo impacto das mudanças sobre pessoas sem conta bancária e consumidores idosos em Londres, que encontram dificuldade para pagar em dinheiro. Essa é uma preocupação também na zona do euro, onde 13,5 milhões de pessoas sem conta bancária usam papel moeda para pagar contas. “O cash pode estar sob ameaça se, por exemplo, varejistas pararem de aceitar dinheiro ”, diz Panetta. 

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2021/06/21/europeus-reduzem-uso-de-dinheiro-em-especie.ghtml

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