Muitas empresas globais estão rebaixando a China em suas listas de destino de investimentos e consolidando suas operações no país, citando o crescimento mais lento e a redução dos lucros.
Uma pesquisa da Câmara de Comércio dos EUA constatou que a porcentagem dos entrevistados que classificam a China como principal destino dos investimentos de suas sedes caiu ao menor nível desde que essa pesquisa anual começou a ser feita há 25 anos.
A tendência desanimadora para os investimentos é o foco de dois relatórios divulgados esta semana pela Câmara de Comércio da União Europeia na China e a Câmara de Comércio dos Estados Unidos em Xangai.
“O risco de fazer negócios na China aumentou nos últimos anos e ao mesmo tempo o mercado está desacelerando”, diz Eric Zheng, presidente da AmCham Xangai.
A China já se deu conta disso. Em agosto, o governo da cidade de Xangai disse que um de seus desafios econômicos mais urgentes é o esvaziamento da “cadeia de frutas” — uma referência à decisão da Apple de transferir a produção de alguns produtos eletrônicos para países como Índia e Vietnã.
Impulsionando essas decisões está uma crise econômica prolongada, a intensificação da concorrência local, as tensões geopolíticas e o surgimento de destinos de produção alternativos na Ásia. As câmaras do comércio afirmam também que as margens de lucro na China não superam mais as de outros mercados.
No mês passado, o Walmart vendeu uma participação de oito anos que mantinha em uma das principais plataformas de e-commerce da China por US$ 3,6 bilhões e a IBM fechou institutos de pesquisa na China, afetando mais de 1.000 empregos.
As montadoras também estão reduzindo seus investimentos na China porque as companhias chinesas agora detêm quase três quintos do mercado de carros de passageiros. Neste terceiro trimestre a maioria dos automóveis novos vendidos passaram a ser elétricos ou híbridos plug-in, em vez de veículos movidos puramente a gasolina, nos quais as montadoras estrangeiras há muito detêm uma vantagem.
Recentemente, a Honda Motor do Japão suspendeu a produção em três fábricas na China e reduziu o número de funcionários por meio de planos de aposentadoria voluntária. As vendas unitárias da Honda na China caíram 32%, para 209 mil, no trimestre abril-junho, comparado ao mesmo período do ano passado.
Em 2023, os investimentos estrangeiros na China caíram 8% em relação ao ano anterior, em termos de yuans. Segundo números da Organização das Nações Unidas (ONU), a Indonésia, com uma população bem menor do que a da China, está atraindo mais dos chamados investimentos verdes em que novas instalações são construídas do zero.
Certamente a maioria das empresas não está abandonando a China. A maior parte está tentando manter as operações existentes, com algumas afirmando que acompanhar a tecnologia chinesa as ajuda a aprimorar sua vantagem competitiva. O Walmart está aumentando o número de suas lojas Sam’s Club no país.
Em uma pesquisa anual da Câmara do Comércio dos EUA conduzida em maio, 15% dos participantes disseram que a China é seu principal destino de investimentos. Durante anos esse percentual foi de 20% dos participantes.
Em outra pesquisa, cerca de 20% dos 306 participantes consultados pela câmara americana em Xangai disseram que vão reduzir os investimentos na China este ano, citando preocupações com o crescimento da economia e as decisões de redirecionar investimentos para lugares como a Índia e o Vietnã.
Em meados de agosto, o Ministério do Comércio da China convocou uma reunião com empresas estrangeiras que estão fazendo grandes investimentos no país e prometeu eliminar em tempo hábil os obstáculos financeiros e burocráticos que elas enfrentam. Entre os participantes estavam representantes da fabricante dinamarquesa de brinquedos Lego e da companhia farmacêutica Moderna.
A agência de planejamento econômico de Xangai disse no mês passado que o declínio nos investimentos estrangeiros em Xangai se deve em parte ao fato de empresas multinacionais como fornecedoras da Apple estarem transferindo capacidade de produção para fora do país, segundo o “The Paper”, um meio de comunicação apoiado pelo governo de Xangai. Muitos fornecedores da Apple, como a montadora de produtos eletrônicos Quanta, têm bases de produção na cidade.
A ênfase da Apple em terceirizar para a Índia e o Vietnã aumentou depois das tensões geopolíticas e dos lockdowns da pandemia de covid-19 na China.
Uma década ou duas atrás, as multinacionais corriam para a China, atraídas por sua mão de obra abundante e barata e o potencial poder de compra de seus 1,4 bilhão de habitantes.
Naquela época, as empresas estrangeiras vendiam para um mercado ávido por seus produtos e podiam cobrar um ágio. Mas desde então, as concorrentes chinesas melhoraram a tecnologia e a oferta de produtos. A competição local está aumentando em carros, aço, artigos esportivos e outros setores, sempre acompanhada de guerras de preços acirradas.
Entre as mais atingidas estão as montadoras estrangeiras. A Hyundai da Coreia do Sul vendeu uma fábrica em 2021 e fechou outra no ano seguinte. Em janeiro deste ano, a Hyundai vendeu sua terceira fábrica chinesa para uma companhia local por mais de US$ 227 milhões. Enquanto isso, ela está crescendo na Índia.
Mesmo assim, para as empresas com os produtos certos, a China ainda é grande demais para ignorar. Nos automóveis, é o maior mercado mundial em vendas unitárias.
Se a demanda interna aumentar, a China voltará a se tornar uma prioridade de investimento para as multinacionais, segundo afirma Allan Gabor, presidente da Câmara de Comércio dos EUA em Xangai. “Trata-se da economia. O lado da demanda é o maior fator. As empresas estão na China por se tratar da China”, diz ele.