China cresce 6,4% e mantém estímulos

No começo de um ano politicamente delicado, os dirigentes chineses estão promovendo a expansão econômica e deixando de lado as reformas necessárias para evitar que a dívida trave a economia.
A expansão de 6,4% na economia da China durante o primeiro trimestre, divulgada ontem, acompanhou o ritmo do último trimestre de 2018, apesar da expectativa geral do mercado – e de um bom número de indícios – de que o crescimento se desaceleraria.
O crescimento se manteve próximo aos mínimos das últimas três décadas enquanto a China digere o acúmulo da dívida e o excesso de capacidade dos anos de boom de uma década atrás. Mas economistas disseram que a recuperação no trimestre de atividades como a produção industrial indica que Pequim está liberando recursos para reduzir o ritmo da desaceleração.
As autoridades chinesas começaram 2019 com cortes de impostos, promessas de empréstimos para pequena empresas e ordens para que governos municipais financiem obras de infraestrutura, medidas adotadas como resposta à rápida desaceleração econômica do ano passado, que assustou muitos empresários. O ritmo do Produto Interno Bruto (PIB) chinês do trimestre supera o desempenho do ano passado na maioria das grandes economias mundiais, exceto Índia e Irlanda.
“As expectativas e a confiança do mercado estão se fortalecendo”, disse ontem Mao Shengyong, porta-voz da Agência Nacional de Estatísticas.
Os últimos dados mostram que, em vez de frear setores como construção civil ou produção de aço, que foram responsáveis por empurrar a dívida para 300% da economia, a China está de novo contando com alguns desses setores para alimentar uma recuperação.
“Eles podem estimular o crescimento neste ano, mas à custa do aumento da relação dívida/PIB, já que investimentos mais ineficientes sobrecarregam o reequilíbrio incipiente da economia que observamos no último dois anos”, disse Diana Choyleva, economista-chefe da Enodo Economics, em Londres.
Durante o trimestre, as fábricas chinesas produziram aço e alumínio a um ritmo raramente visto no começo de um ano, quando o feriado do Ano Novo Lunar normalmente reduz tais atividades. Dinheiro novo também foi destinado para a construção civil e compra de apartamentos. As vendas no varejo de produtos como eletrodomésticos cresceram, assim como a receita de restaurantes. O há muito pressionado mercado de ações da China até teve uma reversão.
“Agora mesmo, tanto a oferta como a demanda vão de vento em popa”, disse Wang Guoqing, analista do Lange Steel Information Research Center. Wang disse que a produção de aço e alumínio foi a maior já registrada para um primeiro trimestre. Ela contou que as autoridades reduziram os controles antipoluição, o que permitiu que a produção de aço saltasse 10% no trimestre.
O dinamismo da economia poderá limitar a agressividade dos comentários do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que tem dito que a economia da China está tão fraca que dá a Pequim um grande incentivo para concluir um acordo comercial naquela que logo pode ser a rodada final – e a mais política – das negociações entre os países, em Washington.
O crescimento econômico sustentado chinês pode tornar mais fácil para o presidente Xi Jinping convencer dezenas de líderes estrangeiros que visitarão Pequim neste mês de que a China tem os meios e recursos necessários para levar adiante seu programa mundial de infraestrutura, a Iniciativa do Cinturão e da Rota (BRI, na sigla em inglês), também conhecida como a Nova Rota da Seda. A expansão econômica também é um bom presságio para o movimentado calendário de celebrações políticas da China, incluindo os 70 anos de governo do Partido Comunista.
Apesar do relaxamento de crédito no primeiro trimestre, a China não está inundando seu sistema financeiro e obteve seu maior impacto com medidas destinadas a reverter a queda de confiança do ano passado, segundo alguns economistas. “Isto deu ao governo uma oportunidade de adotar várias medidas pouco dispendiosas para levantar os ânimos”, avaliou Andy Rothman, estrategista da Matthews Asia, em uma nota de pesquisa intitulada “O estímulo mais barato do mundo”.
Entre outras medidas, o governo estuda estimular a venda de automóveis, smartphones e eletrodomésticos, de acordo com projetos de regulamentação examinados pelo “Wall Street Journal”.
Pelo projeto da Comissão de Desenvolvimento Nacional e Reforma, os governos locais seriam chamados a acabar com as restrições à compra de automóveis, e o governo ofereceria incentivos fiscais para seus compradores, assim como subsídios para os compradores de smartphones e eletrodomésticos.
Enquanto isso, os meios de comunicação oficiais relataram nesta quarta-feira que o Conselho de Estado da China está implementando uma sérei de medidas para diminuir a proporção dos depósitos que os bancos menores precisam manter como reservas, num esforço para reduzir os custos da concessão de crédito para as empresas menores.
Nem todos os indicadores melhoraram no primeiro trimestre. Embora um ganho de 8,5% na produção industrial tenha levantado o dado do PIB, o crescimento do investimento privado ficou para trás, com 5,6%, num possível sinal de cautela das empresas. A produção de energia elétrica caiu, em comparação com o último trimestre do ano passado. O crescimento das importações de apenas 0,3% sugere uma demanda fraca na China. A venda de automóveis caiu de novo, 4,4%, mas menos que a queda de 8,5% de dezembro. As empreiteiras fizeram menos ofertas por terrenos: o volume de transações caiu mais de 30% em março, comparado com um ano antes.
Para economistas, provavelmente os gastos do governo no primeiro trimestre foram concentrados, ou seja, os recursos de amanhã estavam sendo gastos ontem. Embora uma redução no imposto de valor agregado (IVA) fosse encorajadora para os empresários, ela significa menos receita para o governo num momento em que as autoridades estão destinando dinheiro novo para obras públicas, como ferrovias.
Li Chen, representante de venda da Fuzhou Qingcheng Irrigation Equipment, afirmou que o corte no IVA, que entrou em vigor neste mês, pode permitir que ela economize dinheiro suficiente para expandir suas operações de venda de maquinário agrícola para lugares distantes, como a Rússia e a América do Sul. “Esperamos que este impulso possa ser mantido”, disse.

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