Ásia retoma seu lugar como centro do mundo

Economistas, cientistas políticos e especialistas em países emergentes vêm há décadas especulando sobre a chegada da Era Asiática, o ponto de inflexão quando o continente se tornará o centro do mundo.
A Ásia já é lar de mais da metade da população do mundo. Das 30 maiores cidades do planeta, 21 estão na Ásia, segundo a Organização das Nações
Unidas (ONU). Em 2019, a Ásia também se tornará lar de metade da classe média mundial – grupo definido por uma renda per capita diária entre US$ 10
e US$ 100, pela paridade do poder de compra (PPP, na sigla em inglês) de 2005.
Desde 2007, os asiáticos vêm comprando mais carros e caminhões anualmente do que os habitantes de qualquer outra região. Por volta de 2030, estarão comprando mais veículos por ano do que os de todas as outras regiões do mundo somadas, de acordo com a LMC Automotive.
Líderes na região começam a falar mais abertamente sobre a mudança. “Agora, o continente se encontra no centro da atividade econômica mundial”, disse o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, no encontro anual passado do Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (AIIB, na sigla em inglês). “[A Ásia] se tornou o principal motor de crescimento do mundo. Na verdade, agora estamos vivendo o que muitos denominaram o Século Asiático”, disse.
Então, quando a Era Asiática realmente vai começar?
O “Financial Times” analisou os dados disponíveis e concluiu que as economias asiáticas, segundo a definição da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (Unctad), serão maiores do que o resto do mundo somado em 2020 – pela primeira vez desde o século XIX. Os números mostram que o século asiático começa no próximo ano.
Em termos de comparação, a Ásia representava cerca de 35% da produção mundial no ano 2000.
Para fazer as contas, o “FT” examinou dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre o Produto Interno Bruto (PIB) incluindo ajustes para as diferenças de preço entre os países. Esse método, que avalia as economias pela PPP, é amplamente considerado o mais relevante, já que leva em conta o que as pessoas podem comprar nos países em desenvolvimento, onde os preços são normalmente mais baixos.
Mesmo pelo método dos valores de mercado, a Ásia já representa 38% da produção mundial, de uma fatia de 26% no início do século.
O que explica o eclipse da economia do resto do mundo pela asiática? A ascensão da China e da Índia explica boa parte
dessa tendência. A China atualmente é uma economia maior que os EUA em PPP. Representa 19% da produção mundial prevista para este ano, mais do que o dobro dos 7% registrados em 2000. A Índia agora é a terceira maior economia do mundo. Seu PIB é duas vezes maior que o da Alemanha ou do Japão, que em 2000 tinham economias maiores do que a indiana, pela PPP.
A entrada iminente na Era Asiática também se explica pelo crescimento dos países menores e médios. A Indonésia caminha para ser a sétima maior economia do mundo, pela PPP, em 2020 e vai superar a Rússia como sexta maior, em 2023.
O Vietnã, uma das economias asiáticas de maior expansão, superou 17 países na classificação de economias pela PPP desde 2000, incluindo a Bélgica e a Suíça. As Filipinas agora são uma economia maior do que a Holanda, enquanto Bangladesh superou 13 outras economias nos últimos 20 anos.
A recente ascensão da Ásia, que começou com o avanço do Japão no pós-guerra, representa um retorno ao padrão histórico. A Ásia dominou a economia mundial durante a maior parte da história humana até o século XIX.
“Em torno ao fim do século XVII, a Europa olhava com admiração e inveja para uma região do globo que concentrava […] mais de dois terços do PIB do mundo e três quartos da população”, disse Andrea Colli, professor de história econômica na universidade de Bocconi, na Itália.
No século XVIII, a participação da Índia na economia mundial era tão grande quanto a da Europa, segundo o escritor e político indiano Shashi Tharoor.
Nos três séculos seguintes, o papel da Ásia no mundo foi encolhendo, à medida que as economias ocidentais decolavam, impulsionadas pelo que os acadêmicos chamam de Revolução Científica,
seguida pelo Iluminismo e pela Revolução Industrial.
“O que se estamos vendo agora é a grande reversão”, diz Joel Mokyr, professor da Northwestern University. “Entre 1500 e 1750, a Europa mudou dramaticamente; o resto do mundo, não.”
Por volta dos anos 1950, a Ásia representava menos de 20% da produção do mundo, apesar de ter mais da metade da população.
“No século XIX, a Ásia transformou-se do centro produtivo do mundo em uma clássica economia subdesenvolvida, exportando commodities agrícolas”, disse Bob Allen, professor de história econômica da Universidade de Nova York em Abu Dhabi.
Nas últimas décadas, entretanto, essa tendência mudou.
A ascensão impressionante do Japão e da Coreia do Sul, os primeiros países na Ásia a se equiparar ao Ocidente, ficou parecendo nanica perto do forte desenvolvimento da China depois da introdução das reformas voltadas ao mercado pelo líder chinês Deng Xiaoping no fim dos anos 1970.
Em apenas duas gerações, uma “combinação bem-sucedida de integração com a economia mundial via comércio e investimentos externos diretos; de alto índice de poupança; de grandes investimentos em capital humano e físico; e de políticas macroeconômicas sólidas” contribuiu para o salto econômico da
Ásia, segundo o mais recente panorama regional do FMI organizado por Koshy Mathai.
“O período de dois séculos do Ocidente como potência mundial está no fim”, argumenta Kishore Mahbubani em seu livro mais recente “A Queda do Ocidente?”.
Nos últimos 50 anos, centenas de milhões de pessoas na Ásia foram tiradas da pobreza e muitos países asiáticos passaram a ter o status de economias avançadas ou de renda média, segundo as definições do Banco Mundial. Pela PPP, ainda é cerca de 35% do americano e 44% do europeu. O PIB per capita da Índia é cerca de 20% do europeu, de acordo com dados do FMI.
Desde 2000, contudo, a diferença nos PIBs per capita da China e da Índia em relação aos dos EUA e Europa diminuiu muito. Ao longo desse período, a China se tornou quase cinco vezes mais rica que a África subsaariana, em produção média per capita, sendo que em meados dos anos 90, as duas regiões estava em níveis parecidos.

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