Trump fala em adotar novas tarifas contra produtos chineses e pede punição à China por uma suposta reação pouco transparente de Pequim à epidemia, que teria prejudicado o resto do mundo
Pouco mais de cem dias após a assinatura da “fase um” do acordo comercial entre EUA e China, a tensão entre Washington e Pequim voltou a subir, com o presidente Donald Trump expressando a necessidade de cobrar uma reparação dos chineses por causa da pandemia de covid-19. Isso afetou os mercados mundiais ontem.
Nos últimos dias, Trump – que enfrenta uma campanha pela reeleição mais difícil, já que o coronavírus matou dezenas de milhares de americanos e arrasou a economia do país – tem reforçado suas críticas a Pequim e ameaçado impor novas tarifas sobre produtos da China. Além disso, seu governo estuda adotar medidas de retaliação contra a China por causa da pandemia, segundo autoridades.
Declarações de Trump na noite de domingo, em entrevista à TV Fox News, despertaram a preocupação de uma volta das hostilidades econômicas com a China. Ele vê as tarifas como uma “punição” de último recurso pela resposta do governo chinês à pandemia e ameaça retirar os EUA do acordo comercial se as promessas de compras de produtos americanos não forem cumpridas pelos chineses.
Matt Pottinger, assessor assistente de segurança nacional da Casa Branca, afirmou ontem que as recentes declarações de Trump não são um desejo de vingança e que fazem parte de sua linha política desde a campanha de 2016.
“Os EUA não estão estudando medidas punitivas aqui”, disse Pottinger durante um simpósio virtual realizado pelo Miller Center of Public Affairs, da Universidade da Virgínia, quando questionado sobre a ideia de punir a China por causa da epidemia de coronavírus. “O que o presidente Trump está fazendo é dando continuidade à política que ele tem implementado, que é ter um relacionamento recíproco e justo com a China.”
Na semana passada, relatório de inteligência do Departamento de Segurança Interna dos EUA indicou que os líderes chineses “ocultaram intencionalmente a gravidade” da covid-19 no início de janeiro, para o país poder estocar material médico e hospitalar.
Também no domingo, o secretário de Estado americano, Mike Pompeo, afirmou que os EUA teriam evidências de que o novo coronavírus teria sido criado num laboratório de Wuhan, cidade chinesa onde surgiu o vírus.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) disse ontem que não recebeu nenhuma evidência ou dados do governo dos EUA para apoiar as afirmações de Trump e de Pompeo. “De nossa perspectiva, isso segue sendo uma especulação”, disse o diretor-executivo da OMS, Michael Ryan. Ele reiterou que as evidências, como o sequenciamento genético do vírus, apontam para uma origem natural.
O governo chinês nega as afirmações dos EUA de que suas instalações de pesquisa são culpadas pela pandemia e diz que a resposta do governo ao surto foi abrangente e salvou vidas em todo o mundo. Essa mensagem foi repetida ontem pela mídia estatal chinesa. A agência de notícias oficial Xinhua acusou Pompeo de falar “bobagens” e “mentiras”, enquanto um apresentador da TV Central da China chamou o secretário de Estado americano “maligno” e disse que ele estava “cuspindo veneno”.
No Congresso americano, republicanos já apresentaram três projetos de lei para “responsabilizar a China” pela pandemia.
Os governos da Austrália e Reino Unido, aliados dos EUA, também defendem uma investigação sobre a maneira como a China lidou com a pandemia.