Julia Boarati, Leticia Ferreira, Maria Luiza Ogata e Matheus Marcondes alunos do Curso de Jornalismo da ESPM-SP .
Nos últimos dias os trending topics das redes sociais deixaram, pela primeira vez em meses, de ser assuntos ligados à crise do novo coronavírus para se voltarem para a Black Lives Matter (Vidas Negras Importam). O movimento anti racista que começou em 2013 com o assassinato do jovem negro Travyon Martin ganhou força novamente depois que vídeos que mostram o assassinato de George Floyd, suspeito de ter usado um cartão falso ao gastar 20 dólares em um supermercado.
Os protestos por justiça acabaram incendiando revoltas que podem ser vistas além da luta contra o racismo: Palavras como “A revolução está chegando” foram pichadas nas principais lojas da Rodeo Drive, uma das ruas mais luxuosas dos Estados Unidos. Centenas de pessoas se recusaram a deixar de bloquear a quinta avenida em frente a Trump Tower, símbolo nova-iorquino do capitalismo. Isso pode ser lido como um protesto contra a desigualdade norte-americana.
A Covid-19 também evidenciou a diferença que existe entre brancos e negros no país. Em 10 de abril, os casos da doença passavam a marca dos 500.000 casos e pouco mais de 22.000 pessoas haviam morrido. Em Milwaukee, uma cidade do centro-oeste americano, 81% dos mortos eram negros, um número alto se considerarmos que apenas 26% dos habitantes pertencem a essa minoria racial. Números parecidos podem ser encontrados nos estados de Illinois, Michigan e Louisiana.
Um levantamento do Journal of Virus Eradication mostrou a variação internacional dos preços de diferentes medicamentos atualmente usados para combater a Covid-19. A cloroquina, embora desaprovada pela OMS como tratamento dos casos da doença (estudos indicam que a droga pode elevar o risco de insuficiência cardíaca e até mesmo de morte), é a principal forma de tratamento indicada pelo presidente Donald Trump, que chegou a afirmar a estar tomando como um preventivo. Baseando-se em um tratamento de 14 dias o estudo concluiu que o custo de produção da Cloroquina é de US$0,30, enquanto o medicamento pode ser comprado por US$93 nos Estados Unidos. A nível de comparação o segundo país onde a cloroquina é mais cara é o Reino Unido, onde o medicamento pode ser encontrado por cerca de US$8.
Andreas Sabby, dinamarquês de 20 anos que mora em Los Angeles com sua família opina sobre o sistema de saúde pública do país em que mora: “Eu realmente acho estranho e errado a falta de saúde pública americana. Acho que todos devem ter acesso a saúde, na minha opinião isso é o básico de empatia para uma sociedade harmônica”.
Só nos primeiros 31 dias de 2020 a indústria farmacêutica – que já soma absurdos como o aumento de 5000% no preço do Daraprim, medicamento usado contra a HIV/AIDS, em 2015 – havia aumentado o preço de 639 medicamentos em uma média de 6%. 20 sofreram um aumento de quase 30%. Marplan, usado para tratar depressão, teve seu preço aumentado em 14.9%: 30 comprimidos podem ser comprados por US$156, enquanto o Parnate, a versão brasileira do mesmo remédio, é vendido por cerca de US$8.
Os preços exorbitantes não se restringem aos medicamentos: de acordo com a ONG Public Citizen, uma angioplastia custa cerca de US$32.200 nos EUA. O mesmo procedimento pode ser feito por US$6.400 na Holanda, US$7.400 na Suíça e gratuitamente no Brasil, através do Sistema Único de Saúde (SUS).
Mas o que será que os norte-americanos pensam sobre o sistema de saúde do país? “Eu sinto que ninguém se importa com quem passa necessidade aqui. Na minha escola, nós temos aula de política, e eles apoiam totalmente o acesso pago ao sistema de saúde. Eu sinto que aqui, as pessoas não ligam muito para o próximo; eles realmente não se importam. Eles são frios para falar sobre as pessoas necessitadas e usam elas muito como estatística. Falta empatia e solidariedade”, conta Andreas.
Os Estados Unidos nunca tiveram um bom sistema de saúde pública, e nem se mobilizaram para a transformação deste cenário. Isso pode estar ligado ao fato de que os estadunidenses que são obrigados a pagar preços exorbitantes em seus medicamentos, mas não tem condição de pagar por eles, não tenham voz para exigir alguma mudança. Ou pode também estar ligado ao fato de que a maioria da população privilegiada norte-americana, não se importa com o fato que existem pessoas passando por dificuldades.
Os norte-americanos vivem presos ao conformismo, a busca pelo consenso tornou-se mais importante do que o interesse individual, fato que intensifica e evidencia todos os tipos de desigualdade que existem no país. Para Platão, “o preço que os homens de bem pagam pela indiferença aos assuntos políticos é ser governado pelos maus”. Segundo o filósofo ateniense, o idiota era o cidadão que se dedicava exclusivamente a questões particulares e negligenciava a vida política, sendo o responsável pelo ambiente degradante em que vivia.