Béla Bartók

Luiz Guilherme Melo, Rafaela Valentini e Renan Leite (alunos da ESPM/SP)

Entre fins do século XIX e meados do século XX, a Hungria viveu um período histórico de muitas mudanças. Segundo o historiador Eric Hobsbawm, trata-se do “fim de uma era”, a dos Impérios, e o início de uma nova era, a dos Extremos. A Hungria, um dos corações do Império de Austro-Húngaro, tinha como característica principal a de ser uma sociedade hierarquizada, nos moldes do Antigo Regime.

A Monarquia tentou se modernizar e ter papel relevante na balança de poder Europeu. Porém, os valores do Iluminismo e da Revolução Industrial não tiveram espaço para prosperar e o fator determinante para o declínio do Império Austro-Húngaro foi o nacionalismo: havia, por um lado, o projeto de construir um Estado-nação soberano e independente, ao mesmo tempo em que se almejava uma identidade com a Europa Ocidental.

A Primeira Guerra Mundial marcou o fim do Império e a emergência da independência húngara. Assim, suas fronteiras atuais foram estabelecidas pela primeira vez pelo Tratado de Trianon (1920), quando o país perdeu 71% de seu território, 58% da sua população e 32% dos húngaros étnicos.

Na Segunda Guerra Mundial, a Hungria aderiu às Potências do Eixo e sofreu danos significativos: ficou sob a égide de influência da União Soviética, o que contribuiu para o estabelecimento de uma ditadura comunista por quatro décadas (1947-1989).

O compositor Béla Bartók (1881 – 1945) viveu esse contexto histórico de grandes transformações, período de tensão entre as forças de mudança e de resistência, isto é, um momento rico para a arte e para a cultura, porém, um momento carente de uma identidade sonora que traduzisse, de fato, a cultura do seu país. Assim, em 1905, iniciou sua busca pela expressão musical da nação húngara.

Antes, no entanto, é possível notar em sua obra influências do Romantismo: as transições bruscas de tons, construídas por acordes de sétima diminuta, e o uso de intervalos dissonantes maior do que seus predecessores.

Em 1903, Bartók compôs o poema sinfônico Kossuth, seguido, em 1904, por Rapsódia para Piano e Orquestra, peça à qual foi atribuído o terceiro “Opus 1” de sua obra, marcando assim a tomada de um novo rumo musical. Sob a influência de artistas como Richard Strauss e Claude Debussy, suas composições adquiriram novo traços: melodias menos claras ao ouvinte, mais dissonâncias, avanços nas harmonias, e começou a aflorar sua paixão por temas e melodias populares. Tal paixão o levou a se aventurar pelo interior de países como Romênia, Sérvia, Turquia e até ao norte da África, em busca de elementos para um discurso musical que expressassem a musicalidade de seu próprio país, a Hungria.

São desse período as Danças Populares Romenas, um conjunto de peças curtas construídas inteiramente sobre melodias simples, vindas do folclore musical da região.

As peças do compositor se tornaram mais curtas, com influências acentuadas da tradição musical oriental. Nota-se o uso de escalas pentatônicas, a ambição pelo uso de instrumentos não-temperados e Bartók desenvolve, então, o estilo com o qual terminaria sua carreira: uma síntese entre Ocidente e Oriente, com foco em peças grandiosas.

Nota-se claramente o amadurecimento do discurso musical de Béla Bartók que, como ele mesmo afirmou em relação à Cantata Profana, de 1930, “assumiu maior personalidade e expressão”.

Ao nos aprofundarmos na obra de Béla Bartók, temos a impressão de que suas composições são heterogêneas, consequência da pluralidade de um ser participando da revolução musical que possibilitou à música ser tal como a conhecemos hoje. Partindo de uma sonoridade típica do Romantismo tardio, ele foi capaz de se desconstruir e reconstruir harmônica e melodicamente, tangenciando o impressionismo e retomando a empreitada de compositores como Verdi, Chopin e Tchaikovsky, que começaram a borrar as linhas que sempre haviam sido traçadas entre o popular e o erudito.

Aos sentidos do ouvinte, a obra de Bartók apresenta peças que variam desde músicas que transmitem uma sensação “relaxante”, que relembram aspectos orientais, como é o caso de Evening in the village, até peças como Out of doors, que transmitem uma sensação mais “angustiante” e pesada. As dissonâncias que, em geral, suas obras apresentam, podem trazer algum desconforto no primeiro momento, mas ao serem ouvidas por uma segunda vez, podem ser apreciadas por sua riqueza de complexidade e detalhes.

Comentários estão desabilitados para essa publicação