Por Cesar Veronese, Professor do CPV Vestibulares
As passeatas arrefeceram e, infelizmente, algumas estão sendo canalizadas para o mero vandalismo, esvaziando-se do seu sentido político. Esperemos e lutemos para que o espírito reivindicatório não se evapore. Entre as inúmeras, possíveis e impossíveis reivindicações, a educação é um dos destaques. E não faltam jornalistas e cidadãos lembrando o papel decisivo do facebook na articulação dos manifestantes.
Facebook? Ora, só alguém que estivesse hibernando nos últimos anos poderia justificar essa afirmação. Não é de hoje que professores saem às ruas exigindo salários mais dignos. Professores das redes públicas municipal e estadual há anos estão protestando. E quem não se lembra da polícia de São Paulo batendo neles por ordem do governador?
Quando ouvimos diagnósticos sobre os desafios para o futuro imediato do Brasil, educação é a resposta de dez em cada dez especialistas e não especialistas entrevistados. É preciso mais escolas, mais universidades públicas, mais bibliotecas, professores com maior qualificação e, claro, salários proporcionais às qualificações exigidas.
Por outro lado, de nada adianta um sistema eficiente se o aluno não desempenha o seu papel. Entre os manifestantes que foram às ruas, as estatísticas apontam um percentual de aproximadamente 60% de jovens, a maioria estudantes. As cidades brasileiras, das quais São Paulo é um exemplo contundente, possuem um número muito inferior de bibliotecas, instituições de ensino público e espaços culturais em proporção ao número de jovens nelas residentes.
É curioso, no entanto, que muitos desses espaços permanecem, não raro, às moscas. Tomemos alguns exemplos concretos. O Centro Cultural São Paulo oferece uma programação fantástica de música, teatro e cinema. Sua sala de cinema (totalmente reformada, com projeção impecável) apresenta mostras de filmes raríssimos (como a que aconteceu recentemente sobre os documentários feitos para a TV francesa, nos anos 60, por Erich Rohmer) e de qualidade excepcional. O ingresso custa 1,00 (isso mesmo, um real!). Mas é raro encontrar jovens assistindo a essas sessões.
As quase 20 unidades do Sesc espalhadas pela capital disponibilizam mensalmente centenas de espetáculos gratuitos e de indiscutível valor para a formação de um jovem. Boa parte dessa programação é gratuita ou de preços módicos (não ultrapassando, em geral, o valor de 10,00 reais). Há pouco esteve em cartaz, por exemplo, na unidade Ipiranga, o espetáculo AUSÊNCIA, concebido pela companhia DOS À DEUX, dos brasileiros André Curti e Arthur Ribeiro, radicada em Paris, e com atuação de Luís Melo.
A DOS À DEUX é reconhecida mundialmente, já se apresentou em mais de 100 países e conquistou alguns dos mais cobiçados prêmios do teatro internacional. Há alguns anos, num debate após o espetáculo SAUDADES EM TERRAS D’ÁGUA, os atores levantaram a seguinte questão: “apresentamo-nos em todos os continentes, até mesmo em países de culturas tão diferentes da brasileira, como o Kwait e o Qatar, e em todos os lugares temos um público jovem significativo. Curiosamente, no Brasil é raro algum jovem em nossa plateia”.
As reivindicações por uma educação melhor são mais do que legítimas. Mas é importante lembrar que pouco adianta pedir melhorias se não se aproveita aquilo que já é oferecido. Em outras palavras: o discurso se realiza de fato quando é acompanhado de ação.
Em tempo: nos dias 24 e 25.08 acontecerão, no Sesc Pinheiros, duas apresentações da cantora Virgínia Rodrigues. Descoberta por Caetano Veloso nos anos 90 (até então ela cantava num coro de igreja na Bahia), Virgínia é uma das vozes mais extraordinárias da música brasileira. Seus discos só são encontrados no exterior e suas apresentações são raríssimas. Os ingressos custam 16,00 (a meia entrada). Música de qualidade ao alcance de todos. E, por falar em reivindicações, reivindiquemos espaço para os grandes artistas, já que as anomalias sonoras fabricadas pela indústria cultural de massa solapam cada vez mais todos os espaços!