Parada para voto

Cesar Veronese, Professor do CPV Vestibulares

Comentamos neste espaço, há poucos dias, sobre o esvaziamento do significado dos feriados, reduzidos, em geral, ao denominador comum de negócios turísticos. A antecipação da Parada Gay de São Paulo, puxando a data verdadeira do Orgulho Gay, 28 de junho, para o primeiro de maio, bateu todos os recordes. Calendário da Copa, necessidade de um feriado prolongado para atrair mais turistas (e negócios para as agências de viagens), o tiro, no final das contas, saiu pela culatra. Organizadores e participantes admitiram um público muito menor que nos anos anteriores.

Para a polícia militar havia 100 mil pessoas na Paulista; já os organizadores do evento insistem em 2, 3 e até 4 milhões, número mentiroso segundo os evangélicos da Marcha para Jesus, há anos inconformados com o fato de a Prefeitura, na restrição de eventos na Paulista, ter deixado o espaço para a Parada, enquanto a Marcha foi para a zona Norte. Motivo, não admitido publicamente, mas que pode ser lido nas entrelinhas da decisão da Prefeitura: gay gasta dinheiro mesmo, e os participantes da Marcha vão para a rua com sanduíche e tubaína na sacola!

A Parada é, na verdade, um evento econômico (só movimenta menos grana que o Salão do Automóvel) e político. Político em sentido polivalente. Por um lado, é uma plataforma para os políticos abocanharem os votos de um público que, se há 18 anos, quando se deu a Primeira Parada, era de menos de 200 pessoas, hoje chega à casa dos milhões. E todos os candidatos, independente da legenda, sempre souberam tirar proveito do evento.

Oportunismos e moralismos à parte, a Parada coloca em pauta, por outra via, discussões políticas de primeira plana. Este ano, por exemplo, a reivindicação foi em torno da criminalização da homofobia, a ser inserida no novo Código Penal, cuja discussão se dá neste momento no Congresso Nacional. Quando olhamos para a História e encontramos os massacres dos índios em todo o continente americano durante séculos, o dos armênios em 1915, os dos judeus, ciganos, comunistas e homossexuais na Segunda Guerra, o papel subalterno a que a mulher foi relegada durante milênios, a chaga da escravidão, e quando hoje nos deparamos com o misto de ignorância, arrogância e desumanidade que caracterizam as atitudes dos skinheads e dos movimentos ultranacionalistas espalhados pela Europa, então temos que admitir que a Parada Gay é mais do que necessária. Como o Dia Internacional da Mulher e o Dia da Consciência Negra.

As datas não são para lembrar as chamadas minorias (que quase nunca são minorias), mas para alertar “o macho adulto branco sempre no poder” que o mundo não é só dele e que, na teia infinita e imprevisível das relações humanas, um racista branco ou um skinhead, numa emergência médica, por exemplo, podem ser salvos por um negro ou um gay. Ou será que eles recusariam o atendimento?

Para ler outros textos do Professor Veronese, acesse blog CPV (link Dicas Culturais do Verô).

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