Por César Veronese
Professor CPV
O noticiário local, nacional e internacional das últimas duas semanas foi um banquete para a mídia. Do ciclista cujo braço foi decepado na Paulista, passando pelas controversas declarações do pastor Marcos Feliciano, até chegar aos funerais de Hugo Chávez e à eleição do primeiro papa latino-americano, tudo foi – e continua a ser – repetido à exaustão.
No dia seguinte ao atropelamento de David Santos Souza, todos ouvimos, na imprensa ou por meio de pessoas próximas, dezenas de relatos da tragédia, cada um reproduzido praticamente com as mesmas palavras. Indignados e defensores do pastor também não variavam os argumentos. Esquerdistas e direitistas venezuelanos foram fotografados sob o crivo da emoção, e os rostos na Praça de São Pedro pareciam aguardar o surgimento de um astro pop.
O noticiário televisivo apoia-se na emoção. À expressão dos rostos segue-se sempre a pergunta infalível: o que você está sentindo? O que você sente ao ver alguém que acaba de ter um braço decepado? O que você sente ao ver um deputado que nega direitos a minorias ser eleito para a presidência de uma Comissão de Direitos Humanos e Minorias? O que você sente ao ver seu líder ou opositor político morto? O que você, sendo um católico, sente ao ouvir o Habemus Papam?
A pergunta, a princípio simples e inofensiva, é, na verdade, extremamente autoritária e manipuladora. Porque ao se perguntar sobre as emoções que um determinado acontecimento desperta, desvia-se a atenção dos motivos verdadeiros que o fundamentam e despreza-se a capacidade crítica e analítica do entrevistado ou do espectador. O espaço público da discussão é substituído pela esfera privada e o emocional sobrepõe-se ao racional.
Não seria mais lícito indagar sobre as competências urbanísticas de uma Prefeitura que, sabendo da violência do trânsito paulistano, cria ciclovias com cones de poliuretano? Por que não se discute o fato de vários partidos terem declinado da Comissão dos Direitos Humanos e Minorias por preferirem outras comissões? Por que não se dispensa mais tempo nos noticiários à análise das realidades enfrentadas pela Venezuela e pelo Vaticano e menos ao choro e à comemoração?
Ao contrário, embriagados pela emoção, ficamos sabendo o nome da empresa que doou um braço mecânico para o rapaz atropelado, o cachê cobrado pelo pastor para a realização de um culto, quanto os camelôs de Caracas e de Roma estão lucrando com a venda de souvenirs. A dor, o trauma, a ética, a morte e a fé são, assim, reduzidas a mercadorias intercambiáveis pelo mínimo e máximo denominador comum, o dinheiro.
Até que acabarão por nos cansar. Ou melhor, quase nos cansar. A mídia, mais célere, se encarregará antes de substituir esses assuntos “batidos” por outros mais frescos. Produto velho não vende. É preciso anunciar, aqui e agora, o novo. E o mundo fica com a cara de um de shopping center ou da Disneylândia. Temos que consumir tudo – violência, política, morte e fé – com extrema rapidez, como se fosse um sorvete sob o sol antes do próximo looping da montanha russa.